Trump, a saúde e a nova “Era dos Extremos”
Novo governo dos EUA fortalecerá o discurso de destruição de direitos sociais, inclusive no Brasil – um risco para o SUS. Por isso, 2025 é tão importante: momento de colher frutos de boas políticas públicas e reunir forças para construir uma sociedade justa e popular
Publicado 21/01/2025 às 06:00 - Atualizado 20/01/2025 às 20:11
Leia todos os textos da coluna de Túlio Franco
Donald Trump toma posse como o 47º Presidente dos Estados Unidos neste 20 de janeiro de 2025, e altera a geopolítica global. Considerado imprevisível na política, age com uma cabeça formada no ambiente de negócios dos EUA, sem uma cultura humanista que possa orientar minimamente sua ação. Apesar da suposta imprevisibilidade na política, é dado como certo que com ele retornam o negacionismo do clima e da ciência; o preconceito e discriminação contra mulheres, pobres, negros, a comunidade LGBTQIAPN+; no xadrez econômico global, a concorrência predatória; na geopolítica mundial, o constrangimento de governos e povos, as ocupações imperiais.
Na área da saúde há uma inicial preocupação, visto que Trump escolheu, para o cargo de secretário de Saúde e Serviços Humanos, Robert F Kennedy Jr. O novo secretário é um conhecido negacionista da ciência, ganhou notoriedade em declarações contrárias ao uso de vacinas na pandemia. Ele nega que o fará novamente, mas, para que as pessoas parem de usar as vacinas, sabemos bem, basta divulgar dúvidas sobre sua eficácia e segurança.
O fato é que a indicação de Kennedy nos colocará diante de incertezas quanto à sua capacidade na defesa da saúde, em uma época de grandes ameaças à vida. Em primeiro lugar, porque o mundo atravessa uma situação climática severa, ao atingir a temperatura crítica de 1,5 graus acima dos níveis pré-revolução industrial, gerando uma inusitada crise ambiental, que causa eventos climáticos extremos. A crise ambiental pode ser a causa da repetição de epidemias ou pandemias tanto pelo efeito “transbordamento”, quando um vírus passa de uma espécie silvestre para a humana, quanto outras situações igualmente ameaçadoras. E em segundo lugar, porque há no Brasil uma versão dos “trumpistas”, detentores de mandatos na estrutura política institucional do país, com influência na base da sociedade, e inescrupulosa competência comunicacional. Tendem a propor para o país, de forma mais agressiva, políticas regressivas nos direitos, fortalecidas pelo novo governo americano.
O SUS conta com alta expertise na gestão e microgestão das redes de saúde. Resiliente, em mais de três décadas, já superou as agressões contra a universalidade de acesso, o crônico subfinanciamento, o desfinanciamento dos governos oriundos do golpe de estado de 2016, a pandemia de covid-19 em condições adversas, e toda sorte de assédio do sistema privado financeirizado sobre o orçamento público da saúde, e o seu modelo assistencial. Mesmo tendo demonstrado seu gigantismo no acolhimento à necessidade de cuidados do povo brasileiro, e ser uma rocha na resistência democrática, republicana e popular, não se pode baixar a guarda. Haverá tentativas de fazer repercutir na política de saúde, interesses econômicos vinculados ao mercado, revigorados pela conjuntura internacional do momento.
O SUS está preparado para o que der e vier. No Brasil nós vencemos o debate com os negacionistas na pandemia. Houve tensões, mas o povo compareceu em massa para a vacinação contra covid-19, e o programa de imunização vai muito bem, obrigado. Há um movimento popular robusto, que, através do sistema Conselhos (Conselho Nacional, Conselhos Estaduais e Municipais, e as inúmeras Conferências de Saúde), e a Frente pela Vida, acompanham, discutem, opinam, e criam uma poderosa blindagem aos princípios e diretrizes do SUS. Por outro lado, ainda não desenvolvemos eficiência na comunicação, a ponto de derrotar as iniciativas inescrupulosas da extrema direita na produção e disseminação de fake news. A mídia carece de maior regulação, as mentiras criminosas nas redes sociais de maior repressão. Enfim, a boa e eficaz comunicação é fundamental, como ela não existe de per si, deve estar combinada com a política assertiva no encontro aos interesses e necessidades do SUS e da população.
Este “ano de 2025 é o ano da colheita”, dito e repetido pelo presidente da República, e vários do seu governo. Momento fundamental na construção da vitória das forças democráticas e populares para o próximo ano. Caminho que vem sendo pavimentado desde o início deste governo. Em 2026 é esperada uma disputa acirrada com as forças da extrema direita, como em 2022. Um trabalho sem tréguas para seguirmos no rumo progressista de construção de uma sociedade justa e radicalmente democrática e popular.
Com todas as licenças a Eric Hobsbawm (1917-2012), vivemos a “era dos extremos”, também neste século XXI, onde tudo ganhou uma forma extrema de expressão. A direita que adquiriu a cabeça e corpo da extrema-direita fascista, por exemplo. Ao enfrentá-los, devemos demonstrar nosso projeto político para a saúde e o país, com grande nitidez e objetividade. O contraponto necessário. Sejamos radicais, no sentido de ir à raiz das questões que desafiam nosso tempo, por exemplo, mostrando nossa posição firme contra a financeirização da vida, denunciar o lucro fácil dos bancos, a ganância desenfreada dos que acumulam riquezas sobre a dor, o sofrimento e morte de muitos. Vamos criar soluções para a saúde que fortaleçam o SUS, na essência dos princípios da Constituição de 1988, por exemplo. Isto é fundamental para o seguimento da luta pela sua construção como sistema Universal.
Retomamos ao ponto inicial de entrada na era da “união e reconstrução nacional”: a necessária ousadia, criatividade inovativa, e uma política de saúde que faça as pessoas se apaixonarem pelo SUS. É assim que propomos seguir.
Lutaremos com alegria!
Maricá, janeiro de 2025.