Propriedade intelectual: barreira ao acesso a medicamentos

No Abrascão, a crítica ao sistema de propriedade intelectual que impede o direito à saúde – e a urgência de mudanças nos órgãos regulatórios

Créditos: EBC
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Como enfrentar os desmandos das corporações transnacionais que, lucrando exorbitantemente com medicamentos patenteados, infringem o direito à saúde de milhões de pessoas? Nesta terça-feira (2), a mesa “Oposição a patentes farmacêuticas no Brasil: estratégia política e técnica para o acesso a medicamentos” levou este debate ao 14º Abrascão.

A oposição a patentes farmacêuticas é um processo em que uma pessoa física ou jurídica contesta no Instituto Nacional de Propriedade Intelectual (INPI) o registro de uma patente solicitada por outra pessoa ou empresa. Em todo o mundo, é comum que as grandes corporações farmacêuticas façam pedidos de patente “frívolos” ou “imerecidos”, buscando ampliar os lucros com seus produtos – por isso, diversas organizações recorrem regularmente a esse procedimento. 

Ainda que a ferramenta seja importante, Marcela Vieira, assessora da área de medicamentos da Médicos Sem Fronteiras (MSF), destaca que ela não basta. Os órgãos públicos dos países também precisam fortalecer suas diretrizes de exame, para que patentes fracas ou indevidas sejam rejeitadas, sem necessidade de oposição. Em sua visão, as atuais diretrizes são “muito amplas” e “não protegem o interesse público”, resultando em monopólios indevidos e medicamentos mais caros.

Mesmo assim, é preciso fortalecer o instrumento da oposição a patentes, avalia Vieira. A advogada apresentou um banco de dados colaborativo internacional onde é possível disponibilizar documentos e informações sobre casos específicos, reforçando a fundamentação de futuras ações.

Nos anos 1990, sob pressão das potências ocidentais, as leis de propriedade intelectual da maior parte dos países do mundo foram harmonizadas, supostamente para recompensar de forma adequada as descobertas científicas. No entanto, alerta a ex-diretora executiva de Farmanguinhos Eloan Pinheiro, as verdadeiras consequências desse processo foram a “consolidação do poder econômico das empresas transnacionais” e o “domínio do conhecimento científico e tecnológico” pelas nações desenvolvidas.

Há caminhos para enfrentar essa hegemonia. Eloan explica que, “desafiando regras de propriedade intelectual do Ocidente”, países como China e Índia recorreram à engenharia reversa e hoje contam com significativa autonomia no setor farmacêutico e robusta produção nacional. São grandes fabricantes de Insumos Farmacêuticos Ativos (IFAs), enquanto a indústria brasileira de IFAs ruiu desde a década de 90.

Na visão da química, o Brasil precisa trilhar um caminho similar – retomando sua própria experiência de engenharia reversa de antirretrovirais, que baixou os preços dos medicamento de HIV/aids – para superar sua condição de dependência.

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