Os custos da produção de veículos elétricos à saúde brasileira
Carros elétricos são vendidos como produtos sustentáveis, que podem contribuir para frear a crise climática. Acontece que a mineração de lítio, essencial para a produção dos automóveis, geram riscos ao meio ambiente e à saúde, sobretudo dos países de baixa renda
Publicado 10/09/2025 às 14:35 - Atualizado 11/09/2025 às 10:22
Os carros elétricos são vendidos como uma alternativa de mobilidade sustentável, já que produzem muito menos gases poluentes quando comparados a carros híbridos ou a combustão. A narrativa pareceu surtir efeito em meio aos consumidores: considerando apenas o primeiro trimestre de 2025, a venda global de carros elétricos cresceu 35%, superando a participação de 20% no mercado mundial. Contudo, uma face desta suposta grande solução para frear a crise climática – como alguns tentam emplacar – permanece oculta: a mineração, em especial do lítio, e seus impactos ambientais-climáticos.
A mineração deste mineral crítico, na mesma medida em que é essencial para a produção das baterias dos carros elétricos, causa impactos socioeconômicos e ambientais – como esgotamento dos recursos hídricos; perda de biodiversidade; ameaças à saúde humana, aos meios de subsistência não relacionados à mineração e à integridade cultural dos povos indígenas. Ou seja, na verdade aprofundam a crise climática. A abundância do lítio em territórios latino-americanos, inclusive no Brasil, tornou locais como o Vale do Jequitinhonha (MG) – apelidado até de “Vale do Lítio” – foco de empresas multinacionais do setor automobilístico. Elas trazem consigo danos não somente ao meio ambiente, como também à saúde da população brasileira.
Não é à toa que dados oficiais indicam que a intensificação da mineração de lítio no bioma mineiro coincide com a piora da saúde pública em cidades como Itinga e Araçuaí. Nesses municípios, houve um aumento significativo na taxa de mortalidade e nos casos de doenças respiratórias graves. Relatos dos próprios moradores do Vale confirmam a notável piora na qualidade do ar e na paisagem do bioma, que sofre severo desmatamento a partir de processos neoextrativistas como a exploração mineral.
Essa mudança implica outros efeitos que podem não ser tão aparentes assim: o rebaixamento e a contaminação dos lençois freáticos, que impactam diretamente na disponibilidade de recursos hídricos para a população local; a inflação de preços no setor imobiliários com a chegada de pessoas de fora, fazendo com que famílias indígenas e quilombolas, moradores da área, não consigam mais pagar aluguel; a perda de terras por parte dessas comunidades tradicionais; e até mesmo a queda de barragens, da qual já se sabe as consequências sobretudo sanitárias.
Há, ainda, um agravante: um estudo realizado pela Fundação Rosa Luxemburgo, em parceria com um programa de pós-graduação em Ciências Sociais da Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ), explica que, enquanto a venda de carros elétricos concentra-se em países do Norte Global, os impactos – sociais, econômicos, ambientais e sanitários – da mineração recaem desproporcionalmente sobre países de baixa renda. Neste cenário, cabe a reflexão: desenvolvimento de quem e em detrimento de quê?
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