OMS recomenda lenacapavir para prevenção do HIV. E agora?

Fármaco pode ajudar a erradicar a aids como problema de saúde pública. Para isso, será preciso enfrentar a Gilead, empresa dona de sua patente

Foto: Reprodução
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Na segunda-feira passada (14), a Organização Mundial da Saúde publicou diretrizes que recomendam o uso do lenacapavir para a prevenção do HIV. Com duas doses injetáveis ao ano, o medicamento tem eficácia praticamente total na prevenção ao vírus. Sua adoção vem num momento em que o progresso nos esforços contra a aids deu lugar à estagnação, e pode significar um ponto de virada.

O leitor deste boletim pôde acompanhar todos os passos das disputas em torno do lenapacavir, que Outra Saúde cobre desde meados do ano passado. A Gilead, empresa norte-americana que desenvolveu o fármaco e é dona de sua patente, cobra 44 mil dólares anuais por pessoa para seu uso nos EUA. No entanto, pesquisas já identificaram que o custo de fabricação do produto é de apenas 40 dólares. Um novo estudo, publicado na The Lancet em junho, antevê uma cifra ainda menor, de 25 dólares. No entanto, mantido o preço exorbitante, países com recursos limitados e altos índices de HIV podem ser inibidos de adquirir o medicamento, havendo recomendação da OMS ou não. Na prática, isso seria dar adeus à meta global de erradicar a aids como problema de saúde pública até 2030.

Há alternativa. No ano passado, um grupo de organizações que inclui a Associação Brasileira Interdisciplinar de AIDS (Abia) convocou os governos do Sul Global a “quebrar barreiras comerciais e de propriedade intelectual para enfrentar o poder da Gilead”. Na Argentina, por exemplo, a patente do medicamento não foi reconhecida

Buscando aparar arestas, a Gilead firmou acordos de licença voluntária para permitir a produção do lenacapavir por fabricantes de genéricos em alguns países específicos. Em um brief técnico lançado no último dia 3, a Médicos Sem Fronteiras (MSF) detalhou os limites dessa proposta – entre eles, a exclusão de países como o Brasil, que ainda conta com uma significativa população que convive com o HIV ou fazendo parte de grupos de risco. Na conclusão do documento, a MSF recomenda que “os governos de países excluídos devem usar medidas como a licença compulsória [a popular ‘quebra de patente’] para superar as limitações da licença voluntária da Gilead e facilitar a introdução de um genérico do lenacapavir”.

Os governos, incluindo o brasileiro, terão a altivez de assegurar o acesso ao lenacapavir e dar um passo decisivo para alcançar a meta da OMS de erradicar a aids até 2030 – confrontando a Big Pharma?

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