O que estudo sobre ultraprocessados diz da alimentação dos brasileiros?

Conduzido por pesquisadores da Faculdade de Saúde Pública da USP, pesquisa realizou uma estimativa da participação de alimentos ultraprocessados na alimentação brasileira. Dados revelados permitem avançar com outros indicadores sobre a diversidade e a qualidade nutricional no país

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Uma pesquisa da Faculdade de Saúde Pública (FSP) da USP, publicada em artigo na Revista de Saúde Pública, realizou uma estimativa da participação de alimentos ultraprocessados nos 5.570 municípios brasileiros. Tendo como base os dados do Censo Demográfico de 2010 e a Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF) de 2017-2018, os resultados indicam que a média de consumo foi maior em pessoas do meio urbano em comparação à área rural.

A presença de ultraprocessados também é maior nas capitais em relação aos demais municípios. Utilizando um modelo estatístico, a novidade é que o estudo alcançou cidades sobre as quais não havia informações disponíveis, gerando um mapa detalhado do consumo de ultraprocessados no Brasil.

As discrepâncias não param por aí: há também uma grande diferença na porcentagem de calorias provenientes de ultraprocessados entre os estados brasileiros. O município de Aroeira do Itaim (PI), por exemplo, conta com 6% da participação desse tipo de alimento na alimentação de seus habitantes; já Florianópolis (SC), ultrapassa os 30%. Em geral, as médias mais altas foram observadas no Distrito Federal e nos estados do Sul e Sudeste, enquanto a região Norte e Nordeste apresentaram as mais baixas.

O estudo também mostrou que, em comparação aos homens, as mulheres consomem mais esses alimentos de baixo teor nutricional. A ingestão diminui com o aumento da idade e aumenta conforme nível de escolaridade e renda. O autor da pesquisa, Leandro Cacau, lembra como, apesar de se tratar de análise qualitativa, é necessário entender o porquê dessas diferenças: “Nossos principais objetivos eram que esses resultados fossem úteis para a tomada de decisão especialmente para pensar políticas públicas e realizar ações mais locais. Queremos que os municípios possam utilizar esses resultados para desenvolver estratégias específicas”, disse ele.

O Brasil, que tem contado com experiências locais de promoção de hábitos alimentares saudáveis (1, 2) e que, com o novo governo, saiu novamente do Mapa da Fome, possui ainda um enorme desafio: o acesso a uma alimentação saudável. É certo que o trabalho destaca evidências de que domicílios de baixa renda e das regiões rurais brasileiras apresentam alto consumo de alimentos in natura ou minimamente processados. 

Entretanto, outro estudo, conduzido pelo Núcleo de Pesquisas Epidemiológicas em Nutrição e Saúde (Nupens) da USP, do qual Leandro faz parte, define que esse consumo é marcado por alimentos básicos, enquanto outros alimentos saudáveis – como frutas e verduras – são inferiores ao desejado. Ou seja, como bem alerta Leandro, um baixo consumo de ultraprocessados não implica, necessariamente, uma boa qualidade da alimentação.

Maria Laura Louzada, também integrante no Nupens e co-autora do artigo, bem lembra que, embora a pesquisa ajude a entender onde estão os maiores desafios acerca do consumo excessivo de ultraprocessados – que está ligado ao aumento de doenças crônicas –, é preciso avançar com os indicadores sobre a diversidade e qualidade nutricional da alimentação dos brasileiros.

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