O que ainda falta para acabar com o racismo no SUS?

Pouco mais de 6% dos municípios brasileiros implementam Política Nacional de Saúde Integral da População Negra. Oficina promovida por Ministério da Saúde e Fiocruz debate, com a mídia independente, o papel da comunicação para transformar esse cenário

Comunicadores e comunicadoras populares participam de oficina que debate o tema – Franklin Paz/MS
.

Por Nara Lacerda, no Brasil de Fato

Embora o Brasil tenha instituído a Política Nacional de Saúde Integral da População Negra (PNSIPN) há mais de 15 anos, esse grupo ainda é o que mais adoece, o que mais sofre de doenças crônicas, o que mais vive em insegurança alimentar e o que menos tem acesso à alimentação de qualidade, saúde integral e saúde pública.

Uma parte importante desse atraso está nos obstáculos já comuns à implementação das políticas públicas no Brasil e a comunicação – ou falta dela – exerce um peso essencial no cenário.

A PNSIPN, por exemplo, só está presente em 6,6% dos municípios brasileiros. Entre os mais de 5 mil territórios municipais no país, apenas 371 a colocam em prática. Um inquérito preliminar indica ainda que em boa parte dos estados e municípios a política é desconhecida por mais da metade das pessoas entrevistadas, que demonstraram “indiferença” em relação à temática.

O assunto está em debate na Oficina Nacional de Comunicação para o Fortalecimento da Saúde da População Negra, realizada em Brasília pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e o Ministério da Saúde (MS), que segue até esta quinta-feira (23).

Uma das conclusões do primeiro dia de discussões já é conhecida de quem estuda o tema: enfrentar o problema exige mais do que a criação de políticas no papel. Na hora de aplicar as ações, é essencial levar em conta aspectos sociais, territoriais, econômicos, raciais e de gênero, entre outros.

A solução também passa pela garantia de formação antirracista para profissionais da área da saúde, da porta de entrada na atenção básica às instâncias de poder e decisão. “Se um homem preto chega sujo de sangue em uma unidade de saúde hoje, imediatamente vão chamar a polícia”, exemplificou o pesquisador da Fiocruz, Andrey Lemos, um dos expositores da oficina.

A pesquisadora da Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca da Fiocruz, Marly Cruz, também falou no evento e destacou o desafio de priorizar o debate sobre as desigualdades étnico raciais.

“Estamos na contramão, em um movimento contra hegemônico. Em geral, as políticas de saúde têm um recorte com referência na doença, mas essa política não. Isso faz muita diferença, porque, nas entrelinhas, estamos falando que queremos romper com o racismo. Isso não é pouca coisa”, defende.
 
A oficina integra o Projeto de Fortalecimento da Política de Saúde Integral da População Negra e também o compromisso oficial do governo federal para combate ao racismo. As diretrizes foram estabelecidas na Conferência Nacional Livre de Saúde da População Negra e na 17ª Conferência Nacional de Saúde.

* A repórter participa do evento a convite da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz)

Edição: Nicolau Soares

Leia Também: