O plano contra a dengue para o próximo verão

• Governo lança plano contra dengue em 2025 • Vacinação contra pólio e sarampo ainda aquém do necessário • Menos cesáreas nos hospitais privados? • Os riscos na gravidez de crianças • Duas cientistas condenadas por combater desinformação •

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O governo Lula decidiu lançar mais cedo o plano de ação contra arboviroses, que tem foco na prevenção da dengue e outras doenças transmitidas por mosquito no próximo verão. Ontem, 18/9, o presidente e a ministra da Saúde Nísia Trindade fizeram anúncios das principais medidas que serão tomadas nos próximos meses. Os recursos destinados para a prevenção no Ministério da Saúde são de 1,5 bilhão. Entre as estratégias a serem realizadas, está o método Wolbachia – o mosquito produzido em laboratório para não transmitir doenças –, que tem se mostrado bastante efetivo nas cidades onde foi implementado. 

Embora as vacinas contra dengue ainda não possam ser a estratégia principal, o ministério está fazendo o possível para que a imunização seja feita da maneira mais racional, com as poucas doses que há. Nísia afirmou que o Instituto Butantan planeja entregar um milhão de doses de sua nova vacina, que deve ser enviada para aprovação da Anvisa no próximo mês. A pasta também fez a compra de mais 9 milhões de doses da Qdenga, imunizante da farmacêutica japonesa Takeda. Outras estratégias listadas pela ministra são portarias emergenciais com planos de ação, testes rápidos, métodos de tecnologia e pesquisa e desenvolvimento, inclusive com integração de dados.

Durante o anúncio, o presidente Lula também lembrou do papel da população para conter a proliferação do Aedes aegypti, cuidando para não deixar água acumulada nos quintais. Nísia pontuou ainda que a dengue também está relacionada a condições de saneamento, envolvendo limpeza urbana e condições de moradia. 

Segundo a ministra, os números até agora não mostram um aumento fora do padrão nos casos de dengue, como foi no último verão. Mas ainda assim, o ministério estará atento. Segundo ela, “Os estudos de cenário apontam uma probabilidade de maior número de casos nas regiões Sul e Sudeste. No Sul, a introdução da dengue é mais recente, então você tem uma população mais suscetível. No caso do Sudeste, sobretudo a circulação do sorotipo 3, que é um fator de preocupação”.

O perigo da volta do sarampo e da pólio

Durante a 26ª Jornada Nacional de Imunizações, que acontece em Recife, foram revelados dados preocupantes sobre o sarampo e a poliomielite no Brasil. Para o sarampo, 86% dos municípios brasileiros estão em risco alto ou muito alto de reintrodução da doença, apesar dos esforços para recuperar o status de país livre do vírus, perdido em 2019. A baixa cobertura vacinal, especialmente em estados como Rio de Janeiro e Amapá, agrava a situação. Paralelamente, 68% das cidades brasileiras também estão em risco elevado para poliomielite, doença erradicada desde 1994. A cobertura vacinal contra a pólio, que deveria ser de 95%, foi de apenas 84,63% em 2023. Especialistas da OPAS recomendam medidas urgentes para aumentar a vacinação e melhorar a vigilância, com foco em áreas de maior risco e ações integradas para prevenir ambas as doenças. A situação exige coordenação entre governos e instituições de saúde para evitar a reintrodução de doenças graves e proteger a população infantil.

SP vê redução de cesáreas na rede privada – mas longe do suficiente

Um estudo da USP apontou que o Programa Parto Adequado (PPA), da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), que regulamenta a saúde privada no Brasil, reduziu as taxas de cesáreas em hospitais privados de São Paulo entre 2015 e 2019. Nos hospitais que adotaram o programa, a redução foi de 13,7%, enquanto nos demais foi de 3,4%. Apesar da diminuição, a taxa de cesáreas nos hospitais participantes ainda ficou em 72% em 2019, acima da meta estimada de 45%. Já a OMS estipula que apenas 15% dos partos devem ser cirúrgicos – taxas acima de 20%, segundo a agência, apontam indicações não médicas do procedimento. 

O Brasil é o segundo país com maior taxa de cesáreas, atingindo 60% dos nascimentos – 80% na rede privada. O estudo, publicado nos Cadernos de Saúde Pública, revelou que mulheres mais velhas, brancas e com união estável apresentaram maior probabilidade de optar pela cesárea, enquanto gestantes com maior escolaridade tinham 4% menos chance de escolher o parto cirúrgico. A cesárea, indicada apenas em casos específicos, pode acarretar complicações. A pesquisa mostra que o PPA foi eficaz na promoção do parto normal, incentivando práticas baseadas em evidências científicas para melhorar a assistência obstétrica.

Meninas e adolescentes mortas por complicações na gravidez

Uma reportagem do Intercept Brasil alerta que entre 2018 e 2023, 407 meninas e adolescentes de 10 a 19 anos morreram no Brasil devido a complicações relacionadas à gravidez, segundo o DataSUS. Dentre elas, 17 tinham entre 10 e 14 anos, vítimas de estupro de vulnerável – que deveriam ter acesso ao aborto legal, mas enfrentam barreiras, especialmente em áreas com baixo IDH. Estudos revelam que, em 2024, apenas 1,8% dos municípios oferecem o serviço de aborto legal. A obstetra Liduína Rocha, defende: “O ideal é descentralizar o serviço, que os hospitais e maternidades sejam treinados para fazer o procedimento e que qualquer unidade fosse capaz de acolher uma menina ou mulher com direito ao aborto”. Além disso, ela acredita que é necessário garantir a educação sexual nas escolas. Outros especialistas que falaram à matéria ressaltam ainda que manter uma gestação nessa faixa etária é mais perigoso do que interrompê-la.

A justiça contra a ciência?

As cientistas Ana Bonassa e Laura Marise, do portal Nunca Vi 1 Cientista, foram condenadas após desmentirem uma postagem que alegava que o diabetes era causado por vermes. Em junho de 2023, elas expuseram um perfil que propagava essa desinformação e vendia protocolos de desparasitação como suposta cura. No vídeo, explicavam que o diabetes é uma doença metabólica, causada por fatores genéticos e ambientais, e não por parasitas. A juíza Larissa Boni Valieris, da 1ª Vara do Juizado Especial Cível, determinou, em setembro de 2024, que as cientistas pagassem R$ 1.000 por danos morais ao disseminador de mentiras, por supostamente terem ferido sua imagem. As cientistas ainda podem recorrer da decisão. 
Um artigo no blog Sou Ciência, que vale a pena ser lido, levantou-se em defesa de Ana e Laura. Segue um trecho: “É triste, é vergonhoso olhar para o mundo das redes sociais e perceber que o contrato social tem dificuldade em chegar lá. É por lá que circulam os conteúdos mais nocivos à saúde, conteúdos que desinformam, que geram hesitação vacinal, que provocam o abandono de terapias com eficácia comprovada em busca de tratamentos alternativos sem comprovação científica.”

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