Nísia: Contra pandemias, “economia deve andar junto das políticas sociais”

Em lançamento de relatório da Unaids, socióloga e ex-ministra da Saúde destaca papel da desigualdade no “cenário dramático” da pandemia no Brasil. O documento, construído com sua participação, propõe fim da austeridade fiscal e suspensão de patentes farmacêuticas durante emergências sanitárias

Foto: Agência Brasil
.

Na segunda-feira (3), o lançamento do relatório “Quebrar o ciclo desigualdade-pandemia – construir verdadeira segurança sanitária numa era global”, realizado em Joanesburgo, apresentou ideias para que a resposta às próximas emergências de saúde não repita os erros do enfrentamento à pandemia da covid-19, marcado pelo apartheid sanitário.

Para enfrentar as futuras pandemias, o relatório (divulgado por este boletim na segunda-feira e disponível aqui) propõe medidas como o fim da austeridade fiscal, a renegociação da dívida dos países do Sul Global e a “suspensão automática das patentes de tecnologias” e produtos que auxiliem a resposta dos sistemas de saúde.

A crítica do documento é clara. “A austeridade tende a agravar a desigualdade, reduzir o acesso à saúde, educação e seguridade social, atingir desproporcionalmente as populações vulneráveis e precarizar os sistemas de saúde”. Teria causado a disseminação da tuberculose no Leste Europeu após a queda do socialismo e dificultado o combate à aids e ao ebola na África. Por isso, ela precisa ser posta de lado para garantir a ação firme e equânime contra o avanço de futuros agentes patogênicos.

O documento lançado nesta segunda-feira é de autoria do Conselho Global sobre Desigualdades, Aids e Pandemias, ligado à UNAIDS, o programa das Nações Unidas para o HIV/aids. A socióloga e ex-ministra da Saúde do Brasil, Nísia Trindade, além de fazer parte do Conselho, fez uma fala à distância para o lançamento do relatório.

Em sua participação no evento, Nísia sublinhou o papel das desigualdades – de classe, gênero, raça, região, idade, entre outras – no “cenário dramático” vivido pelo Brasil durante a emergência sanitária do covid-19. Apesar de contar com apenas 2,7% da população global, 11% das mortes da pandemia ocorreram no país, lembrou.

“As pesquisas mostraram que as comunidades pobres, negras, indígenas e periféricas perderam renda e enfrentaram insegurança alimentar na pandemia. A emergência sanitária se sobrepôs a uma crise econômica, aumentando a pobreza”, explicou a socióloga. Por isso, além de tomar medidas para reforçar os sistemas de saúde, também é decisivo impulsionar programas de moradia e transferência de renda, ela defendeu.

Iniciativas multilaterais como a Aliança Global Contra a Fome e a Aliança Global para a Produção Local e Regional e Inovação de insumos de saúde, propostas pelo Brasil, podem ser chave para uma resposta conjunta às próximas pandemias, norteada pelo combate às desigualdades, avaliou Nísia.

Sem publicidade ou patrocínio, dependemos de você. Faça parte do nosso grupo de apoiadores e ajude a manter nossa voz livre e plural: apoia.se/outraspalavras

Leia Também: