MPF contra “planinhos de saúde”
• Ministério Público vê falta de estudo para planos de saúde baratos • Cirurgia para lábio leporino no SUS • Falta de antibióticos amplia resistência • Garimpeiros são “população-ponte” de HIV • Vírus se espalha nos 50+ • Sem apoio à redução de danos •
Publicado 08/05/2025 às 12:42
O Ministério Público Federal enviou nota à Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) na qual reprova o sandbox regulatório que validaria a entrada no mercado dos chamados planos populares de saúde. Na avaliação do órgão do judiciário, realizada por sua Comissão de Saúde da Câmara do Consumidor e da Ordem Econômica, a agência não apresentou dados críveis a respeito da tese de que tal modalidade serviria para desafogar e desonerar o SUS.
Na visão do MPF, tampouco houve uma elaboração satisfatória de regras desses planos, a exemplo de reajustes e exames a serem cobertos, e seus impactos dentro do próprio mercado privado de saúde em relação a outros concorrentes. Por sua vez, a ANS, que aprovou a medida por fora dos ritos técnicos em momento de mudança de sua diretoria, não se pronunciou.
Em fevereiro, o Outra Saúde entrevistou a pesquisadora Marina Magalhães, que foi categórica em afirmar que tais modalidades de planos seriam um engodo tanto para usuários como para o SUS.
SUS passa a oferecer cirurgia de lábio leporino
O presidente Lula sancionou a lei que obriga a oferta de cirurgia reconstrutiva de lábio leporino ou fenda palatina no SUS. O texto, publicado no Diário Oficial da União nesta quarta-feira (7), prevê também o tratamento pós-cirúrgico, abrangendo serviços de fonoaudiologia, psicologia, ortodontia e outros necessários para a recuperação integral do paciente. A nova lei também ampara o recém-nascido que, diagnosticado no pré-natal ou após o nascimento, será encaminhado ao centro especializado para início do acompanhamento clínico.
Caso o paciente necessite de reeducação oral, deverá ser disponibilizado gratuitamente fonoaudiólogo para auxiliá-lo nos exercícios de sucção e de mastigação e no desenvolvimento da fala. Além disso, ele poderá ser assistido, sem custos, por um ortodontista, a quem caberá decidir sobre implante dentário e adoção de aparelhos ortodônticos no tratamento.
Resistência a antibióticos está ligada à falta de acesso a tratamento
Uma análise publicada no The Lancet mostrou que as chamadas superbactérias – microrganismos que deixam de ser suscetíveis aos medicamentos existentes – foram responsáveis diretamente pela morte de 1,27 milhões de pessoas em 2019. Indiretamente, a chamada resistência antimicrobiana (RAM) foi associada a 4,95 milhões de vidas perdidas. A previsão é de agravamento do problema nas próximas décadas: de acordo com os pesquisadores, entre 2025 e 2050, mais de 39 milhões de pessoas no mundo podem morrer devido à RAM.
Neste contexto, um dos focos no debate tem sido o uso indevido e excessivo de antibióticos, prática considerada uma das causas para o surgimento das superbactérias. No entanto, a autora sênior do estudo, Jennifer Cohn, afirma que, na realidade, muitas pessoas em países de baixa e média renda não chegam a ter acesso aos antibióticos de que precisam. Analisando países de média e baixa renda como Egito, Bangladesh, México e Brasil, o trabalho mostra que, embora o uso inadequado de medicamentos alimente o problema, os que sofrem com as infecções morrem devido à falta de acesso ao tratamento adequado.
Estudo sugere maior presença de ISTs em garimpeiros
Não se sabe ainda qual é a prevalência da infecção por HIV nas chamadas populações-ponte – aquelas que têm contato com grupos mais vulneráveis e podem levar as ISTs para a população geral. Esse é o caso dos garimpeiros, uma população normalmente apartadas dos serviços de saúde e que pode ter mais contato com trabalhadoras do sexo do que a população em geral. Pesquisadores ligados à FM-USP, ao Instituto Adolfo Lutz e à FCM da Santa Casa de São Paulo realizaram pesquisa, apoiada pela FAPESP, no sudoeste do Pará para investigar a prevalência das ISTs e seus principais determinantes entre homens e mulheres que vivem em áreas de garimpo.
Além de realizar testagens para ISTs – como HIV, sífilis, hepatites B e C e malária – no município de Itaituba (PA), a pesquisa contou também com com uma fase formativa – em que foi realizada, antes das testagens, uma etnografia, através de entrevistas e observação. Graças a isso, de acordo com os pesquisadores, foi possível incluir outras mulheres como participantes da pesquisa – não somente as trabalhadoras do sexo – e outras informações importantes como saúde mental e consumo de álcool e substâncias psicoativas, por exemplo. Os dados ainda não foram consolidados, mas as análises preliminares sugerem uma prevalência maior de ISTs entre os garimpeiros em comparação com a população geral.
HIV: campanhas negligenciam público acima de 50 anos
Um artigo publicado na revista Lancet trouxe luz sobre uma dinâmica pouco percebida a respeito das infecções do vírus HIV: a alta entre pessoas acima de 50 anos. Via de regra, as campanhas preventivas miram o público jovem, perfil quase exclusivo dos adoecimentos nas primeiras décadas da epidemia.
No entanto, nos últimos anos as maiores taxas de crescimento da doença estão em um público mais velho. Os motivos são vários, desde a não prevenção sexual diante da ausência de risco de gravidez como também a sensação de segurança gerada pelo controle da doença, condição conquistada por políticas públicas.
A pesquisa se debruçou em dados globais, em especial no continente africano, mas o Brasil também é um foco importante deste tema de saúde pública, com aumento de 416% de casos entre pessoas acima dos 50 anos de idade entre 2012 e 2022. Para especialistas ouvidos pelo Globo, é hora de redirecionar as ações preventivas e reforçar o combate a estigmas, que muitas vezes afastam as pessoas de prevenção e posterior tratamento.
Especialistas lamentam abandono de política de redução de danos
A volta de Lula à presidência da República reacendeu esperança em diversos nichos da sociedade que viveram os retrocessos causados pela abordagem reacionária nas políticas públicas. A questão das drogas certamente é um dos pontos mais sensíveis, uma vez que o governo Bolsonaro e sua aliança com os setores religiosos ávidos por verbas públicas enfraqueceu anos de luta por uma abordagem mais humanitária em relação a usuários. Comunidades terapêuticas voltaram a ter força e canalizar verbas que poderiam ser direcionadas ao SUS e SUAS em seus centros, ainda que os resultados práticos não apareçam.
No entanto, o balanço do atual governo, como relata matéria da Folha, é de uma atuação inócua, que releva iniciativas de redução de danos, como acesso a espaços públicos de convívio e orientação profissional. Preservaram-se os interesses dos conservadores, cujos métodos carecem de base técnica e científica e operam fora do sistema público de saúde, com fortes indícios de exploração do trabalho, enquanto a abordagem baseada na reforma psiquiátrica não recebeu o prestígio esperado.
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