Inteligência Artificial para auxiliar no cuidado de idosos?
Tem-se discutido os benefícios da IA para, por exemplo, a otimização do acesso a procedimentos de saúde. Entretanto, frente a inúmeros desafios, o cuidado de idosos pode mesmo ser feito por IA?
Publicado 13/08/2025 às 16:19
Em audiência pública da Comissão de Defesa dos Direitos da Pessoa Idosa, realizada na última terça-feira (5), o uso da Inteligência Artificial como instrumento tecnológico que ajuda, de diversas maneiras, a zelar pela saúde dos idosos foi tema latente. Lígia Gualberto, que coordena ações sobre o tema no Ministério da Saúde, afirmou que a internet surgiu como uma oportunidade para ampliar o cuidado, e que a pandemia, por sua vez, acelerou a transformação digital entre as pessoas idosas, que passaram a usar mais os celulares e computadores. “Como potenciais benefícios, a inteligência artificial, bem como as tecnologias de um modo geral, têm como auxiliar a qualidade de vida e o bem-estar, além de otimizar o acesso a procedimentos e a ações específicas”, disse ela.
No entanto, Lígia alertou para barreiras que ainda precisam ser superadas. “É essencial que a gente possa garantir fontes seguras, informações fidedignas, informações corretas, baseadas em evidências científicas que respeitem a ciência”, afirmou. Para ela, a IA pode incentivar a socialização e a estimulação cognitiva, mas é importante também cuidar de alguns potenciais riscos, como a dependência da tecnologia, o isolamento social, os riscos de invasão de privacidade e barreiras tecnológicas.
No mesmo sentido, o pesquisador Marcelo Fornazin, em entrevista para o Outra Saúde, afirmou que a implementação de tecnologias digitais podem reduzir desigualdades e transformar a epidemiologia; mas, para isso, mudanças amplas precisam acontecer. A primeira delas diz respeito à já presente desigualdade na transformação digital no SUS. Enquanto grandes centros contam com infraestrutura robustas, regiões periféricas e rurais, assim como a região amazônica carecem de internet estável e equipamentos adequados – e esforços para resolução do problema precisam ir além do Ministério da Saúde. Somado a isso, outra questão é o fato de o Brasil seguir dependente de empresas estrangeiras para armazenar dados sensíveis. Para Marcelo, essa fragilidade expõe o país a riscos geopolíticos e limita a capacidade de criar soluções adaptadas à realidade do SUS.
Outro desafio mencionado por Fornazin é evitar que a digitalização sirva como pretexto para a privatização do SUS, já que sistemas desenvolvidos pelo setor privado, muitas vezes focados em modelos hospitalares ou individuais, podem ignorar a integralidade do SUS – como aconteceu quando o nosso sistema de saúde foi criado. Empresas que desenvolveram sistemas para planos de saúde e hospitais privados quando a proposta de SUS 100% público não vingou na Constituinte passaram a enxergar o SUS como um nicho comercial. A grande problemática é que as soluções oferecidas frequentemente por essas empresas ignoram particularidades cruciais de um sistema que, ainda assim, é público – como, por exemplo, o trabalho em equipe na atenção primária e a integração com a vigilância epidemiológica.
No contexto de grandes desafios como esses, aconteceu a mesa Saúde Digital, ética e tecnologia: dilemas e desafios, na última quarta-feira (7), parte da programação do XVIII Congresso Latino-Americano de Medicina Social e Saúde Coletiva. O debate, coordenado pelo geneticista argentino Víctor Penchaszadeh, contou com falas de Naomar de Almeida Filho, Luiz Vianna Sobrinho e Angélica Baptista Silva. A discussão, acompanhada pela redação do Outra Saúde, teve início com Naomar, que pontuou a importância de se ampliar o debate da digitalização da saúde entre os defensores do SUS; seguiu com Vianna Sobrinho alertando para a possível extinção de profissões de habilidade manual e a necessidade de, a partir disso, assegurar que o cuidado de ponta não seja automatizado; e foi finalizada com Angélica abordando outro ponto crucial, que é a alfabetização digital da população e dos trabalhadores da saúde.
Outras Palavras é feito por muitas mãos. Se você valoriza nossa produção, contribua com um PIX para [email protected] e fortaleça o jornalismo crítico.