Expansão de clínicas privadas de baixo nível cresceu 200%
• A lenta degradação da saúde privada • Técnicos da ANS contra os “planinhos” • Vacina da gripe o ano todo • Saúde na adolescência e juventude • Violência sexual contra meninos • EUA: o estrago após cortes a programas humanitários •
Publicado 07/03/2025 às 16:15 - Atualizado 07/03/2025 às 16:48
Uma pesquisa do Instituto de Estudos em Políticas de Saúde (IEPS) informa que as clínicas de saúde de recorte popular tiveram crescimento quatro vezes superior a outros estabelecimentos de saúde entre os anos de 2010 e 2022. No entanto, segundo especialistas ouvidos pela Folha, inclusive do setor privado, tal avanço não esteve necessariamente acompanhado de um atendimento qualificado. Além disso, tais clínicas na prática já realizam aquilo que a ANS tenta legalizar através do chamado “sandbox regulatório”, ao inserir no mercado planos de saúde não ambulatoriais.
No caso das “clínicas populares”, trata-se de atendimento particular, sem uma conexão com seguros de saúde. Já na modalidade que a ANS tenta incluir no mercado de saúde, haveria uma sistematização por parte de seguradoras, que poderiam vender planos de saúde restritos a consultas e exames, mas sem direito à internação ou procedimentos médicos. Planos “Melhoral e copo d’água”, nas palavras da pesquisadora Ligia Bahia. A ideia não tem respaldo de nenhuma entidade representativa do campo da saúde e uma das críticas centrais é que colocaria uma pressão por fila dupla no SUS, uma vez que pacientes já com algum diagnóstico e encaminhamento para especialistas não teriam motivo para iniciar sua jornada de acompanhamento desde a porta de entrada da atenção básica.
Na ANS, racha interno a respeito dos “planinhos”
Poucos dias após o anúncio de testes desse tipo de seguro pela ANS, que cobre consultas e exames, mas exclui internações e terapias, a proposta continuou gerando forte rejeição. Além de entidades como OAB, UFRJ, USP, Idec e MPF, que alertam para os riscos aos usuários e ao sistema público de saúde, e a possível ilegalidade do produto, técnicos da própria ANS – que raramente se manifestam – também se posicionaram contra, conta uma matéria do Valor. Mas seus motivos são mais materiais: temem que as próprias operadoras passem a priorizar esse modelo mais barato, inviabilizando os planos completos e precarizando ainda mais a saúde privada.
A ANS defende o plano como uma alternativa acessível, mas a falta de consenso e as críticas de especialistas e da sociedade civil expõem os riscos de uma medida que pode fragilizar ainda mais a saúde suplementar. O debate seguirá no Senado, com audiência convocada pelo senador Nelsinho Trad (PSD).
Vacina de influenza disponível o ano todo
A tendência já se anunciava ao longo dos últimos anos: a vacinação contra a gripe deixou de ser um esforço de imunização de inverno e se tornou uma campanha permanente. Tal noção é corroborada pela decisão do Ministério da Saúde de manter a vacina contra a influenza disponível ao longo de todo o ano, independentemente da estação. Em anos recentes, os períodos de campanha chegaram a ser estendidos por secretarias municipais ou estaduais, de acordo com surtos específicos.
Questões climáticas, a exemplo da maior poluição atmosférica e secas constantes, são fatores responsáveis pelo aumento de doenças respiratórias e tornam a vacinação de grupos de risco – crianças até 5 anos e adultos acima de 60 – mais necessária. Professores, trabalhadores dos transportes, gestantes, portadores de doenças crônicas e profissionais de saúde são outros grupos prioritários. Além disso, o ministério ampliou a janela de tempo recomendável para aplicação de vacina contra o rotavírus (de proteção gastrointestinal) para crianças, que podem ser imunizadas até os 2 anos de idade.
Pesquisa mapeia necessidades em saúde de jovens
Em parceria com secretarias estaduais de juventude e saúde dos estados da Bahia, Ceará e Rio Grande do Norte, a Fiocruz realizou o estudo Prospecção de Linha de Cuidado para a Saúde na Adolescência e Juventude para o Sistema Único de Saúde (LCA&J). O trabalho é um preâmbulo para a Política Nacional de Atenção Integral à Saúde de Adolescentes e Jovens, em fase de elaboração pelo governo, e visa compreender quais podem ser os focos de atenção a esse público.
Entre outras conclusões, o estudo defende a subdivisão por faixas etárias, sociais e econômicas. Recentemente, o Ministério da Saúde publicou levantamento no qual demonstra aumento de mais de 1.500% dos atendimentos em saúde mental no SUS entre 2014 e 2024 para pessoas de 10 a 19, chegando até a 4.000% em faixas etárias mais específicas.
Violência sexual contra meninos cresce 6,8% ao ano no Brasil
Dados publicados em matéria da revista Pesquisa Fapesp revelam que a violência sexual contra meninos e adolescentes do sexo masculino aumentou 6,8% ao ano entre 2013 e 2022. Os números vêm de análise da Universidade Federal do Piauí (UFPI) com base no Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan). Foram registrados 39.967 casos no período, com maior incidência entre crianças de 5 a 9 anos (41,3%). A região Sudeste concentrou 44,2% das notificações, com crescimento anual de 9,5%.
A violência ocorre principalmente em casa (62,4%), e o agressor é um conhecido da família em 35,3% dos casos. A subnotificação é alta, influenciada por barreiras culturais que dificultam a denúncia. Especialistas alertam para a necessidade de melhorar o acolhimento no sistema de saúde e promover educação sobre direitos e sexualidade para prevenir e combater o problema.

Cortes dos EUA a projetos humanitários: o tamanho do impacto
Após a posse de Donald Trump, o governo estadunidense encerrou abruptamente o financiamento de cerca de 5,8 mil projetos humanitários em todo o mundo. Catherine Kyobutungi, do Centro Africano de Pesquisa em População e Saúde, resumiu o impacto em entrevista ao NY Times: “As pessoas vão morrer, mas nunca saberemos, porque até os programas que contam os mortos foram cortados”.
Entre os cortes, comunicados por e-mails enviados pelo Departamento de Estado, estão os seguintes: Pólio: US$ 131 milhões para imunização infantil pelo UNICEF. Malária: US$ 90 milhões para mosquiteiros e tratamentos que protegeriam 53 milhões de pessoas. HIV: Medicamentos para 350 mil pessoas, incluindo crianças e gestantes, na África. Tuberculose: Corte de 10% do orçamento de medicamentos da OMS, afetando 3 milhões de pacientes. Desnutrição: Tratamento interrompido para 60 mil crianças na Nigéria e 5,6 milhões de crianças e mulheres em risco. Água: Fim do único acesso a água para 250 mil pessoas em campos de deslocados no Congo. Violência: Fechamento de 87 abrigos para mulheres vítimas de violência na África do Sul.
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