Desigualdades na saúde também estão se ampliando
• OMS alerta para determinantes sociais de saúde • Redução de 21% de mortes entre os yanomami • Saúde de trabalhadores de apps • Enchente e aumento de leptospirose • Evasão escolar após catástrofes • Compostos químicos e doenças cardíacas •
Publicado 07/05/2025 às 14:11
Um relatório da OMS destaca que as causas da precarização da saúde mundo afora decorrem de fatores que vão além da área da saúde. Determinantes sociais como a falta de moradia de qualidade, educação e oportunidades de emprego podem reduzir a expectativa de vida em décadas, sobretudo em países de baixa renda, sendo mais responsáveis pela saúde pública do que fatores genéticos ou o próprio acesso à saúde.
Embora os dados ainda sejam escassos, há evidência suficiente de que as desigualdades acerca da saúde entre países de alta e baixa renda estão aumentando cada vez mais. Neste sentido, o relatório ressalta que essas desigualdades na saúde estão estritamente ligadas aos graus de desvantagem social e aos níveis de discriminação nos países. A OMS enfatiza, portanto, a importância de medidas para combater a desigualdade de renda, a discriminação estrutural, os conflitos e a crise climática.
Yanomamis têm melhora nos indicativos de saúde
O território Yanomami registrou redução de 21% nas mortes entre 2023 (428) e 2024 (337), segundo o Ministério da Saúde. Os óbitos por causas evitáveis caíram 26%, com quedas expressivas em mortes por infecções respiratórias (-47%), malária (-42%) e desnutrição (-20%).
O avanço reflete a ampliação da assistência: o número de profissionais de saúde na região saltou 158%, de 690 para 1.781. Sete polos-base foram reabertos, garantindo atendimento a 5.224 indígenas. Na vacinação, houve aumento de 65% nas doses aplicadas.
A desnutrição grave em crianças menores de 5 anos recuou de 24,2% para 19,2%, mas o secretário de Saúde Indígena Weibe Tapeba ressalta que a recuperação nutricional é lenta. Atualmente, apenas metade das crianças Yanomami está no peso ideal.
Saúde dos trabalhadores de aplicativo em pauta no Recife
Aconteceu, na tarde desta terça-feira (6), a Conferência Livre Estadual de Saúde do Trabalhador, iniciativa do Sindicato dos Trabalhadores por Aplicativo em Pernambuco (Seambape) em parceria com a vereadora do Recife Kari Santos (PT). O evento, que ocorreu no centro do Recife e cujo mote foi “Não é uma corrida, é a nossa vida: a saúde dos trabalhadores por aplicativo e os impactos atuais no SUS”, contou com a presença de trabalhadores e representantes do Ministério Público do Trabalho (MPT), do governo de Pernambuco e da Assembleia Legislativa de Pernambuco (Alepe).
Além da saúde, nas discussões que constituíram a Conferência Estadual foram abordados temas como o acesso a direitos previdenciários, a fiscalização sobre as plataformas digitais, os impactos causados pelos novos modelos de relação de trabalho e o debate em torno do reconhecimento de vínculos trabalhistas, bem como a importância de que a categoria também se envolva nos mecanismos de controle social do Sistema Único de Saúde (SUS). A etapa nacional da Conferência acontece em agosto, em Brasília.
Enchentes aumentam casos de leptospirose
Após as enchentes históricas de 2023, o Rio Grande do Sul registrou mais de mil casos de leptospirose em 2024 – o dobro da média anual de 500 casos, tradicionalmente concentrados em áreas rurais (onde é conhecida como “febre dos arrozais”). A bactéria, transmitida pela urina de roedores, encontrou condições ideais com as águas paradas e lama acumulada após o desastre.
Especialistas alertam que as mudanças climáticas estão transformando a doença em uma ameaça urbana. Estudos mostram que a cada 20 mm de chuva, as internações por leptospirose aumentam 15,6%. Em maio de 2024, o RS teve municípios com mais de 500 mm de precipitação nos primeiros 13 dias.
O risco persiste por meses: a bactéria sobrevive no solo úmido, e casos foram registrados até dezembro – inclusive alguns sem contato com as enchentes. “O barro parece ser o grande fator de perpetuação”, explica Alessandro Pasqualotto, da Sociedade Gaúcha de Infectologia, ao Estadão.
Com eventos extremos mais frequentes, especialistas defendem medidas integradas: saneamento básico, controle de roedores, estoques estratégicos de medicamentos e diagnóstico rápido. Doenças que antes eram rurais passaram a ser também urbanas – e em partes de periferias de grandes cidades brasileiras “temos pessoas vivendo do mesmo jeito que se vivia na Idade Média”, critica o patologista Paulo Saldiva. Enquanto vacinas humanas permanecem escassas, a prevenção depende de políticas públicas antecipatórias aos novos padrões climáticos.
A relação entre desastres climáticos e evasão escolar
Um estudo publicado na revista Proceedings of the National Academy of Sciences, revela que ciclones tropicais estão associados a uma redução significativa na probabilidade de crianças e adolescentes frequentarem a escola em países de baixa e média renda.
A pesquisa, que analisou dados de 13 países afetados pela crise climática, descobriu que, após a ocorrência de ciclones tropicais, as taxas de matrícula escolar caíram. Os efeitos são ainda mais graves em regiões com infraestrutura precária, onde escolas são destruídas ou convertidas em abrigos, e famílias enfrentam perda de renda devido a danos na agricultura e em outros setores. Embora o Brasil não seja diretamente afetado por ciclones tropicais com a mesma frequência, o estudo serve de alerta para os impactos indiretos dos eventos climáticos extremos na educação.
Relação entre compostos químicos e doenças do coração
Pesquisa publicada na eBioMedicine estima que os ftalatos – compostos químicos presentes em embalagens, cosméticos e produtos de vinil – podem ter contribuído para 350 mil mortes por doenças cardiovasculares em 2018, representando 13% dos óbitos na faixa de 55 a 64 anos. O estudo, liderado por pesquisadores da Universidade de Nova York, focou no DEHP, um tipo comum de ftalato usado em cortinas de chuveiro, pisos e embalagens alimentícias.
No entanto, especialistas ressaltam limitações. Primeiro porque se baseia em um modelo estatístico e em uma série de suposições e estimativas – é difícil determinar de fato quantas mortes podem ser resultado de produtos químicos. Além disso, o estudo usou modelagem estatística baseada em dados dos EUA. Fatores como dieta e nível socioeconômico podem influenciar tanto a exposição quanto os riscos cardíacos.
Apesar das incertezas, pesquisadores defendem a redução desses químicos na cadeia produtiva. Afinal, já se sabe que ftalatos prejudicam a saúde reprodutiva e metabólica. Precisamos de mais estudos longitudinais para entender seu impacto cardiovascular, afirmam cientistas ligados à pesquisa.
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