Comissão de ética em pesquisa apresenta renúncia coletiva
Lobby da industria farmacêutica fala mais alto e órgão perde força. Lei diminui transparência de pesquisa clínica
Publicado 15/10/2025 às 18:24
Uma carta assinada pelos 26 membros do Conselho Nacional de Ética em Pesquisa (Conep) com Seres Humanos oficializou o pedido de demissão coletiva diante do governo federal.
O gesto revela a insatisfação total com o Decreto 12.651, editado pelo governo ao lado do Ministério da Saúde, que absorve as disposições da lei 14.874/2024, responsável pela alteração das regras de pesquisa clínica em pessoas.
Para a atual Conep, assim como a opinião predominante nos meios científicos, a lei flexibiliza de forma antiética as regras de pesquisa para produtos farmacêuticos e biomédicos.
Conhecida como Lei da Pesquisa Clínica, mas popularizada como Lei das Cobaias, a lei foi aprovada no Congresso com lobby de atores do mercado. Agora, as empresas que realizam pesquisas não precisam mais garantir aos voluntários informações completas sobre os seus resultados e nem garantir acesso aos produtos novos, em caso de aprovação.
“Lutamos com as poucas armas que tínhamos, haja vista que a pecúnia nunca esteve do nosso lado. Se não conseguimos a unanimidade, temos a consciência que a perseguimos até o último momento, deixando as portas abertas ao contraditório na elaboração do consenso coletivo”, diz trecho do manifesto.
A Conep coordena os Comitês de Ética em Pesquisa (CEP) dos estados. Com a nova lei, não deixaria de existir, mas na prática perderia seu peso político no setor. Faria parte de um Conselho de Notáveis, subordinada diretamente ao poder Executivo, e cuja composição foge às atuais regras de composição de órgãos de controle social, como o Conselho Nacional de Saúde.
Para fontes ouvidas pelo Outra Saúde, as novas regras não fomentam a pesquisa ao desestimular a participação voluntária – e podem ser um tiro no pé do próprio mercado.
Apesar do lobby de um Congresso desgastado perante a opinião pública, os conselheiros demissionários consideram que não houve um alinhamento real do governo à sua posição de preservar a Conep.
“Mentiras foram construídas para destruir o Controle Social das pesquisas pelo CNS. Alegações de atrasos e demoras, boicotes administrativos e computacionais, além do desejo de que os ‘patrocinadores’ (indústrias) controlem a ética mais que os participantes, e o interesse em cobrar do SUS o fornecimento de medicações bem sucedidas caso os experimentos resultem positivos”, declarou Heleno Corrêa Filho, epidemiologista membro da Conep, ao Outra Saúde.
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