Em busca das ausências negras na cidade

Campinas-SP completa 250 anos — e uma série de intervenções artísticas ocupará o Centro. Objetivo: “ativar memórias negras” na paisagem urbana, apagadas pela história oficial. E, de forma crítica, desvelar opressões e resistências do cotidiano

Foto: material de divulgação ocupação Escritas Ocultadas
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No mês em que Campinas completa 250 anos, uma série de performances abordará as ausências negras na cidade — a terceira maior do estado de São Paulo. A ocupação Escritas Ocultadas – a paisagem que não passa, realizada pela artista Andrea Mendes, acontece entre os dias 16 e 25 de junho em diversos espaços públicos. Visa, portanto, refletir sobre memórias negras, mostrando como a arte pode ser ativadora de memórias conflituosas e incômodas.

“O foco da pesquisa da artista é a arte como ativadora de memórias conflituosas e incômodas”, aponta Sônia Fardin, curadora do projeto. “Conflitos ocultados e/ou pretensamente pacificados por ações oficiais de memória são o objeto da ação artivista escolhida para marcar os 250 anos de Campinas. Ao caminharmos pela região central de Campinas em nossas ações cotidianas, percorremos uma paisagem feita de camadas de memórias: as celebradas em nomes, monumentos e fatos periodicamente festejados em datas oficiais; e as soterradas, daqueles que foram apagados e ocultados pelas formas dominantes de contar a História”.

A primeira edição do projeto Escritas Ocultadas foi realizada em 2022 e teve como foco o acervo do Museu da Cidade, explorando documentos restritos aos códigos e lógicas do campo museal. Neste ano, para as comemorações do aniversário de Campinas, a artista e curadora decidiram ampliar a ocupação, agora em diálogo crítico com espaços públicos no centro da cidade.

De acordo com elas, esta segunda edição visa ativar memórias na paisagem urbana, destacando as contradições presentes em espaços de grande circulação pública, estimulando um debate crítico sobre o passado que, mesmo ocultado, está inscrito no cotidiano – e manifesta-se com tanto com gestos de opressão quanto de resistência.

“Entre essas camadas de memórias, conforma-se uma paisagem que, hoje como ontem, é resultado de apagamento e exclusão, mas também de luta e perseverança”, analisa Sônia Fardin. “Memórias vivas, pois não há memória morta ou des-memória. Todas são atos de disputa e projetos de futuro, umas sob a forma de opressão e ocultamento, outras de resistência e questionamento. Ao habitarmos essa paisagem que não passa, conscientes ou não, nos tornamos parte dela. Somos os olhos que lhes oferecem sentido. Olhar é ato político, poético e ético, pode ser libertário ou seu oposto”.

Ainda de acordo com ela, as intervenções e performances contribuirão para a “busca, sob os signos da arte, indagar com que olhos desejamos ver, rever e refazer a paisagem desta cidade?”.

Colaboram com as performances o(a/e)s artistas convidado(a/e)s Bruno dos Santos, Maraisa Raquel, Alessandro Oliveira, Thayara Magalhães, Joyce Nascimento, Ewerton Rodrigues, Poli Santos, Helen Aguiar, Thais Selva, Cecília Stelini, Ana Bia, Graciele Savio e Marina Costa.

Programação

As performances do Escritas Ocultadas acontecem entre os dias 16 a 25 de julho em ruas e espaços públicos do centro histórico de Campinas, de acordo com o cronograma:

16/07 (terça) às 10h – “O legado da Princesa”
Performers: Andrea Mendes, Bruno dos Santos, Maraisa Raquel, Alessandro Oliveira.

Local: Rua 13 de Maio

17/07 (quarta) às 10h – “Embaixo do Chão”
Performers: Andrea Mendes e Alessandro Oliveira.

Local: Praça Guilherme de Almeida, Francisco Glicério, S/N (em frente ao Palácio da Justiça)

18/07 (quinta) às 10h – “Tem Preto no Museu”
Performers: Andrea Mendes, Thayara Magalhães, Joyce Nascimento, Ewerton Rodrigues, Poli Santos, Helen Aguiar, Thais Selva.

Local: Em frente ao Museu de Arte Contemporânea de Campinas

23/07 (terça) às 10h – “Cortejo da Perseverança”
Performers: Andrea Mendes e aberto para todas as pessoas.

Local: Início Rua Antônio Cesarino com a Moraes Sales até a Praça do Centro de Convivência

24/07 (quarta) às 10h – “CorAção”
Performers: Andrea Mendes e Cecília Stelini.

Local: Largo de Santa Cruz – Cambuí

25/07 (quinta) às 10h – “Dança da Alegria”
Performers: Andrea Mendes, Ana Bia, Graciele Savio e Marina Costa.

Local: Largo São Benedito (antigo Largo da Alegria)

Sobre a artista:

Andrea Mendes é uma artista preta, retirante nordestina do sertão baiano, nasceu em Itaberaba (BA), em 1979; tem Campinas como sua segunda morada. Graduada em Artes Visuais pela PUC Campinas (SP), mestre em Relações Étnico-Raciais pelo PPRER/CEFET – Rio de Janeiro (RJ). Transita entre a arte e o ativismo, entre o permanecer e o deslocar, entre dor e cura, trazendo para o seu trabalho um olhar crítico sobre temas que a atravessam cotidianamente; expondo as fissuras sistema social brasileiro que ainda se mantém escorado nas muletas coloniais. Seu artivismo envolve relações de experiência corporal com o espaço que ocupa, gerando tensões poéticas. Suas investigações transitam pelos meandros do individual/coletivo/subjetivo. Entre as linguagens de interesse da artista se destacam a performance, a instalação e pinturas em grandes formatos.

As principais linguagens de interesse são a performance, instalação, audiovisual e desenho expandindo.

Desde o ano de 2014 vem se apresentando em espaços públicos, galerias e museus. Participando de residências artísticas nacionais e internacionais. Entre elas: “Residência Artística Comunitária” em Lincoln, Argentina; 2021, Residência Artística “Cena Preta intercambio Brasil/Inglaterra”; Residência Dos Brasis SESC 2023. Com mais de uma década atuando na arte contemporânea, a artista tem um longo currículo, sendo a primeira mulher negra a ter uma exposição individual no Museu de Arte Contemporânea de Campinas – MAC CAMPINAS, que aconteceu em 2022 e primeira obra de pessoa negra inserida no Museu Histórico da Cidade de Campinas – Museu da Cidade. A artista também é idealizadora do coletivo de artistas Pretas InCorporações fundado em 2018 com objetivo de trazer visibilidade a artistas mulheres negras e levar diversidade para os espaços de arte.

Sobre a curadora:

Sônia Fardin, historiadora e curadora de acervos visuais, é mestre em História e doutora em Artes Visuais, ambas formações pela Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP). Moradora de Campinas, foi coordenadora do Museu da Imagem e do Som de Campinas, diretora do Departamento de Memória, Patrimônio e Turismo da Prefeitura Municipal de Campinas, colaboradora do Acervo Thomaz Perina e curadora do acervo fotográfico do Museu da Imagem e do Som de Campinas. Ativista de movimentos sociais de memória, comunicação e direitos humanos, Sônia atua como pesquisadora do Acervo João Zinclar, colaboradora da Casa de Cultura Tainã, integrante da Rede de Memória e Museologia Social de São Paulo, do Coletivo Socializando Saberes e do Centro Cultural Esperança Vermelha. Ela é também curadora do Projeto Sobre Sub Solo de autoria da artista Andrea Mendes.

Ficha técnica

Artista: Andrea Mendes
Curadoria: Sônia Fardin
Artistas Convidades: Bruno dos Santos, Maraisa Raquel, Alessandro Oliveira, Thayara Magalhães, Joyce Nascimento, Ewerton Rodrigues, Poli Santos, Helen Aguiar, Thais Selva, Cecília Stelini, Ana Bia, Graciele Savio e Marina Costa
Produção e Mídias Sociais: Thiago Moreira e Letícia Rosa
Assessoria de Imprensa: Malu Borin
Fotografia: Fabiana Ribeiro
Filmagem: Carlos Tavares
Designer Gráfico: Thiago Moreira

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