A Reforma Sanitária Digital e a China

Iniciativa chinesa pode inspirar profundas transformações no Brasil. O caminho: governança de dados, aposta em novas tecnologias, protagonismo do Estado e forte regulação do setor privado. Seria hora de se falar numa Rota da Seda da Saúde?

Foto publicada pelo Portal Telemedicina
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Texto publicado originalmente revista China Hoje. Leia a primeira parte aqui, publicada por Outras Palavras.

Há menos de três semanas publicamos um artigo[1], no intuito de provocar aqueles que pensam o caminho político de uma proposta coletiva para o sistema de saúde no Brasil, esclarecendo mais a fundo o que denominamos Reforma Sanitária Digital: o retorno ao desejo revolucionário de transformações sociais profundas a partir de ação ampliada na saúde, incluindo a questão climática e ambiental, mas com integrado programa de combate à pobreza, meta do primeiro Objetivo de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da ONU, dos 17 ODS que fazem parte da Agenda 2030[2]. Além de um projeto sanitário, uma necessidade urgente de nos posicionar em outro nível de independência tecnológica no futuro próximo que se anuncia, da Era Digital.

Destacamos ali a necessidade de divulgação e reconhecimento pela mídia ocidental, na proporção devida, dos resultados históricos que a China conseguiu nas últimas décadas na erradicação da miséria, com desenvolvimento sustentável[3]. E ressaltamos ainda a importância, no planejamento e execução dessa política, da utilização de tecnologias de inteligência artificial (IA) que por si só já posicionaram este país como um dos líderes mundiais na área da saúde[4]. Ao analisar o montante do que foi realizado nas últimas décadas e perceber a revolução desses números[5], desperta-nos o desejo de reproduzir o mesmo feito em nosso país.

Assim pensamos a Reforma Sanitária Digital. A condução pelo governo federal de ações coordenadas, interministeriais, de grande abrangência em todo o território nacional, e com grande articulação política, em um programa sanitário que englobasse a eliminação da pobreza; mas alavancado pelo estratégico domínio das tecnologias de IA. Elencamos, então, o foco em três pontos que observamos na experiência chinesa:

  1. um sistema de governança baseada em dados, IA e Big Data, que organize e lidere essa transformação da saúde digital;
  2. o desenvolvimento de um ecossistema digital público e soberano com ampla e capilarizada participação da sociedade;
  3. e a concepção de uma forte governança estatal sobre o investimento privado em saúde.

Com essas características, poderíamos nos integrar à parceria com a Rota da Seda da Saúde, que se dispõe à cooperação entre governos, organizações internacionais e regionais, universidades, setor privado, sociedade civil, e público em geral, numa abordagem multissetorial, multinível com espírito de governança colaborativa[6]. Contribuiríamos com a experiência de mais de três décadas de concepção, planejamento e gestão do nosso Sistema Único de Saúde, com ampliado foco nas práticas de atenção primária.

Os problemas relacionados à geopolítica, no entanto, foram destacados naquele artigo, onde comentamos a deliberada indefinição sobre o posicionamento oficial do Brasil frente à Iniciativa Cinturão e Rota, mesmo após a exitosa visita do presidente Lula à China no início de seu mandato e a expansão dos Brics[7]. Porém, na mesma semana da publicação do texto, ocorreu a visita do vice-presidente Geraldo Alkimin a Pequim, para a VII Sessão Plenária da Comissão Sino-Brasileira de Alto Nível de Concertação (Cosban)[8], e este assunto voltou ao debate, de forma mais promissora.

Em ampla e recente publicação da Fundação Getúlio Vargas[9], constatamos que a parceria econômica entre os dois países vem demonstrando um crescimento inspirador nas últimas décadas, principalmente nas áreas de energia, infraestrutura e comércio de insumos e commodities – apesar dos contratempos políticos e diplomáticos após o Golpe de 2016. Porém, na área da saúde e no combate à pobreza ainda esperamos poder construir um novo capítulo dessa história; e a inserção definitiva na Rota da Seda da Saúde com um programa como o que almejamos, poderá ser o caminho para a Reforma Sanitária Digital.


Referências:

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Um comentario para "A Reforma Sanitária Digital e a China"

  1. Fernando Pereira Bretas disse:

    A imbricação com a China e suas iniciativas de conectar o sul global através de uma nova estratégia de relação econômica é estratégico para um país que queira manter sua soberania. Até pq é uma alternativa ao que já conhecemos que é o colonialismo e a superexploração praticadas pelo norte global, travestida de cooperação tecnocientífica e comercial.
    Entre uma alternativa para a qual nos convidam a construir e uma adesão aos velhos pactgos coloniais que resultam em desestabilização e miséria em nossas sociedades, a escolha, ao contrário do que pensa nossa mídia colonizada, não é tão difícil assim…..

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