Um poeta fluvial entre aço e concreto

Consultas Autônomas é uma viagem pelo sonho, alucinação e mundo simbólico, regado a jazz e companhias dos rebeldes da arte. Com prefácio do poeta beat Claudio Willer, o livro será lançado nesta sexta (2/8). Sortearemos um exemplar

Foto: Pixabay/ND
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Lançamento da segunda edição de Consultas Autônomas (Cobalto Livro), de Guilherme Ziggy. 02/08, sexta-feira, às 19h30. Com leitura de poemas + sessão de autógrafos. Endereço: Loplop Livros – Av. Prof. Alfonso Bovero, 1119, Perdizes-SP.

Guilherme Ziggy tem coração-peixe com tilápias no inconsciente e sempre ouve “a rajada e o grito oceânico/ das minhas contradições […]”. E quem o vê com fogo na mão, ascendendo um cigarro no lamaçal inebriante do Centro de São Paulo, nem desconfia que ele é um “poeta fluvial”.

Não sou quem sentencia isso, mas uma voz de peso: Claudio Willer – o célebre poeta da geração beat paulistana (e também ensaísta e tradutor), morto ano passado, aos 82 anos. Ziggy “confunde propositalmente poesia e vida”, analisa Willer, no prefácio de Consultas Autônomas, “viagens simultaneamente pelo sonho, alucinação e mundo simbólico; e pelo mundo físico-geográfico”. Aqui vai uma prova desta hipótese, quando ele deságua:

Escrevi um longo relato confessional e
todos os dias
Todo o santo dia sento no divã e
Revejo novamente o filme
onde finalmente estive vulnerável

Após três anos fora de catálogo, Ziggy lança, nesta sexta (2/8), a segunda edição de Consultas Autônomas, livro que foi adaptado, em 2023, para o teatro com a peça homônima, dirigida por Bernardo Mendes (Se Eu Fosse Você 2, Tim Maia) e protagonizada por Adriana Veraldi. “Em uma livraria, uma poeta busca seguir as bifurcações do desejo, e elaborar as dores e o desencontro”, dizia a sinopse da peça, e “traz toda uma roda de análise cujas forças partem da obsessão”.

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Falemos, então, desta força – e dos afluentes do livro. Tem uma sacada cômica no meio literário, de T. S. Eliot, que diz que os poetas novatos copiam; e os veteranos, roubam, sem culpa alguma – afinal, têm a segurança de que a matéria-prima afanada será descascada, cozida e temperada, rendendo uma iguaria. Ziggy sabe disso, acredito. Escolhe, portanto, roubar ingredientes para dar uma festa – regada a patê de tomate de sua Itapeva, boa cachaça e jazz fritando na vitrola. E convida Lou Reed, Aleister Crowley, Luis Buñuel, Alejandro Jodorowsky, André Breton, Charlie Paker, Gregory Corso, Augusto dos Anjos e muitos outros, com nome na lista ou não. Estão lá para comerem e serem comidos, beberem e serem bebidos, “para novas potências e/ sentimentalismo predatórios:/ canibalismo tupinambá/ nu abraçados no/ escuro”.

Mas acredito que há um convidado de honra: o “viajante notável”, como o chamou Georges Duhamel. Que, segundo Antonio Cândido, deixa o leitor suspenso “entre a impressão de que entende e não entende, capta e não capta”. Um francês que chega a pé para a festa, só com o copo para a cerveja na mão: Arthur Rimbaud. Vemos no autor de Uma Temporada no Inferno uma possível aspiração de Ziggy em abraçar o fragmento, o incompleto e a autorreflexão contidos em Consulta Autônoma, que “simula uma narrativa, como se contasse uma história em tom confessional”, como disse Willer. “Vou fazer feito Rimbaud/abandonar parentes no campo/desbravar o coração da tua cidade”, escreve Ziggy. “Rimbaud sabia/ não há eternidade porra nenhuma,/ o que há, é fogo no cu”.

Com a liberdade rimbaudiana tornada verbo intransitivo, Ziggy talvez dê uma de Robert Johnson na encruzilhada do desejo. Ao ler Consultas Autônomas, parece que o poeta fluvial busca somar-se a legião de escritores que beija o Diabo de língua e se chamusca. E acha gostoso.

Guilherme Ziggy (Itapeva-SP, 1994) é poeta, jornalista e tradutor. Atualmente, é diretor editorial do jornal Fase Oral e faz parte da equipe da editora Veneta. Foi também cofundador da Jacobin Brasil. Como tradutor, assina Fantasmas da minha vida: escritos sobre depressão, assombrologia e futuros perdidos (2021) e Antifa: o manual antifascista (2019). Mora em São Paulo

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