As utopias concretas de Marcuse em quadrinhos

Em uma mistura de biografia e teoria ilustrada, HQ da Editora Veneta desvela o “homem multidimensional” que foi o filósofo alemão. A cada quadro nos aproximamos do surgimento de sua teoria disruptiva e complexa. Sorteamos um exemplar

Foto por Keystone/Getty Images
.

O dia 19 de julho marca o aniversário de um dos pensadores responsáveis por impactar significativamente os campos da teoria crítica e marxista: o filósofo Herbert Marcuse.

Escritor de obras paradigmáticas como Eros e Civilização (1955), O Homem Unidimensional: Estudos da Ideologia da Sociedade Industrial Avançada (1964), Contra-revolução e revolta (1973), entre outras e tantas que fica até difícil selecionar.

Cada escrito seu é um estudo aprofundado, rigoroso – mas nada ortodoxo –, que utiliza ferramentas de análise afiadas e precisas e que ainda contém potências revolucionárias como poucas obras críticas e marxistas conseguem fazer. Um exemplo é o impacto de O Homem Unidimensional na consolidação da teoria crítica nos EUA, influenciando estudantes e, consequentemente, movimentos contra a guerra do Vietnã, pelos direitos civis e pela igualdade de gênero.

Herbert Marcuse em um comício na Opernplatz de Frankfurt pela libertação de Angela Davis, em 1972. Foto: Abisag Tüllmann. Fonte: bpk-Bildagentur

Desde seu nascimento em 1898 até sua morte em 1979, Marcuse testemunhou guerras e revoluções, viu líderes caírem e jovens revolucionários crescerem.

O cartunista Nick Thorkelson prestou uma grande homenagem à vida e obra do pensador na novela gráfica Marcuse em quadrinhos, lançada no Brasil pela Editora Veneta. A edição conta ainda com prefácio da filósofa Angela Davis, que chegou a ser orientada por Marcuse.

Outras Palavras e Editora Veneta irão sortear um exemplar de Marcuse em quadrinhos, de Nick Thorkelson, entre quem apoia nosso jornalismo de profundidade e de perspectiva pós-capitalista. O sorteio estará aberto para inscrições até a segunda-feira do dia 5/8, às 14h. Os membros da rede Outros Quinhentos receberão o formulário de participação via e-mail no boletim enviado para quem contribui. Cadastre-se em nosso Apoia.se para ter acesso!

Uma mistura de biografia e teoria ilustrada, a narrativa caminha pela história do pensador ao passo que recorta momentos do presente para explicar e exemplificar as teorias do filósofo.

Cada obra do autor é apresentada de maneira entrelaçada aos eventos de sua vida. Além de ilustrar seu amadurecimento em diversos âmbitos, obviamente com especial atenção para o intelectual. Traçando um personagem multidimensional, contraditório, vivo e por isso mesmo, cheio de defeitos.

Divulgação

É no desenrolar de sua vida e amadurecimento, atravessados por acontecimentos políticos e sociais, que seu pensamento é delineado. Curiosidades sobre figuras e momentos históricos que marcaram a vida do autor também são naturalmente inseridos na HQ, tornando-a ampla e informativa.

Aliás, imprimir as ideias e elaborações conceituais de Marcuse em uma obra em quadrinhos é um grande desafio, qual essa comic cumpre de maneira divertida, desenvolta, concisa e cativante. Momentos de relato pessoal de Thorkelson também são revelados entre os quadros da história, expressando sua admiração pela trajetória do filósofo alemão.

UM HOMEM E SUA TRAJETÓRIA MULTIDIMENSIONAL

Filho de uma família judia de classe média, Marcuse nasceu em Berlim, Alemanha. Em 1916, no início da Primeira Guerra Mundial, ele serviu no exército alemão, responsável pela limpeza dos estábulos devido à sua visão. Pouco depois, teve contato com ideias socialistas que clamavam pelo fim da guerra, filiando-se ao Partido Social-Democrata da Alemanha (SPD) e tornando-se delegado do conselho de soldados.

Em 1920, por discordar das posições do SPD, deixou o partido e juntou-se à Liga Espartaquista, também conhecida como Liga Spartacus, inicialmente composta pela ala esquerda da social-democracia alemã (Rosa Luxemburgo, Karl Liebknecht, Clara Zetkin e Franz Mehring, entre outros). No mesmo ano, transferiu-se da Universidade de Humboldt, em Berlim, para a Universidade de Freiburg, na Alemanha, para estudar literatura alemã, além de se aprofundar em disciplinas de filosofia e economia política. Em 1922, defendeu sua tese O Romance de Arte alemão, inspirada nas obras pré-marxistas de Lukács e em Hegel. 

Em 1928, retornou a Freiburg, onde estudou com Edmund Husserl e trabalhou como assistente de Martin Heidegger. Em 1932, teve dois grandes feitos: foi um dos primeiros escritores a fazer uma resenha crítica dos Manuscritos Economico-filosóficos de Marx e publicou seu primeiro livro, Ontologia de Hegel e teoria da historicidade, claramente influenciado pelas ideias heideggerianas. No mesmo ano, rompeu com Heidegger, que se filiaria ao Partido Nazista em 1933.

Sob o nazismo, Marcuse logo percebeu que não poderia seguir uma carreira acadêmica na Alemanha devido à sua origem judaica. Felizmente, juntou-se ao Instituto de Pesquisa Social de Frankfurt (Escola de Frankfurt), que se mudou para Genebra, na Suíça, devido às restrições nazistas. Lá, desenvolveu suas ideias sobre o estágio do capitalismo na época à luz da teoria crítica.

Em 1934, o Instituto de Frankfurt se mudou para os EUA, devido à intensificação da perseguição nazista na Europa e Marcuse acompanhou a mudança. Anos depois, devido a discordâncias políticas e intelectuais, foi desligado do Instituto. Em 1942, juntamente com outros intelectuais exilados, contribuiu com o serviço de inteligência dos EUA durante a Segunda Guerra Mundial, no Escritório de Informação de Guerra dos Estados Unidos (OWI), que posteriormente se tornou o Escritório de Serviços Estratégicos (OSS), precursor da atual Agência Central de Inteligência (CIA).

Marcuse contribuiu com esse serviço por mais tempo do que pretendia, devido ao câncer de ovário de sua esposa na época, Sophie Wertheim, cujo tratamento precisava ser custeado. Infelizmente, Sophie faleceu em 1951.

O filósofo nunca mais voltou a morar na Alemanha, tornando-se cidadão norte-americano e residindo nos Estados Unidos até o fim de sua vida. Após a Segunda Guerra Mundial, tornou-se professor universitário, sendo suas aulas fonte de conhecimento e inspiração para muitos jovens, incluindo a incendiária Angela Davis.

Marcuse e Angela Davis em 1970. Foto: Nancy Chase

Poucos fizeram uma análise tão concisa do contraditório sonho e pesadelo do American way of life. Apesar de ter se afastado da Escola de Frankfurt, nas palavras da socióloga nas palavras da socióloga Bruna Della Torre, Marcuse “foi o único a levar adiante o projeto da teoria crítica dos anos 1930 – mantendo unidas filosofia, teoria social e política radical. Para Marcuse, a teoria crítica tinha a obrigação de politizar-se, sob pena de tornar-se anódina. Isso significava, naquele momento, apoio inequívoco aos estudantes rebeldes e combate ao imperialismo americano, especialmente no Vietnã”. Ainda que tenha sido um importante interlocutor do marxismo e feito críticas contundentes ao longo da vida, vale ressaltar que passou a rejeitar conceitos chaves da teoria marxista.

divulgação

Devido a suas posições, Marcuse foi perseguido por Ronald Reagan e pela direita norte-americana, e até ameaçado pela Ku Klux Klan. No entanto, tornou-se um farol para a chamada Nova Esquerda norte-americana, sendo chamado por alguns de “herói da contracultura”.

Seu desejo por um mundo mais humano se refletia tanto em sua teoria quanto em suas ações. Marcuse é sempre lembrado por defender os estudantes diante da decisão de Adorno, que chamou a polícia para conter uma manifestação estudantil em 1969 no Instituto onde lecionava. Sua vida e obra continuam a ser fonte de inspiração para aqueles que lutam por um mundo cheio de ternura, criatividade e diversidade, mas que não tolera a desigualdade.


E não se esqueça! Quem apoia o jornalismo de Outras Palavras garante 20% de desconto em em todo os site da Editora Veneta. Faça parte da rede Outros Quinhentos em nosso Apoia.se e acesse as recompensas!

Em parceria com a Editora Veneta, Outras Palavras irá sortear um exemplar de Marcuse em quadrinhos, de Nick Thorkelson, entre quem apoia nosso jornalismo de profundidade e de perspectiva pós-capitalista. O sorteio estará aberto para inscrições até a segunda-feira do dia 5/8, às 14h. Os membros da rede Outros Quinhentos receberão o formulário de participação via e-mail no boletim enviado para quem contribui. Cadastre-se em nosso Apoia.se para ter acesso!

Outras Palavras disponibiliza sorteios, descontos e gratuidades para os leitores que contribuem todos os meses com a continuidade de seu projeto de jornalismo de profundidade e pós-capitalismo. Outros Quinhentos é a plataforma que reúne a redação e os leitores para o envio das contrapartidas, divulgadas todas as semanas. Participe!

NÃO SABE O QUE É O OUTROS QUINHENTOS?
• Desde 2013, Outras Palavras é o primeiro site brasileiro sustentado essencialmente por seus leitores. O nome do nosso programa de financiamento coletivo é Outros Quinhentos. Hoje, ele está sediado aqui: apoia.se/outraspalavras/
• O Outros Quinhentos funciona assim: disponibilizamos espaço em nosso site para parceiros que compartilham conosco aquilo que produzem – esses produtos e serviços são oferecidos, logo em seguida, para nossos apoiadores. São sorteios, descontos e gratuidades em livros, cursos, revistas, espetáculos culturais e cestas agroecológicas! Convidamos você a fazer parte dessa rede.
• Se interessou? Clica aqui!

Leia Também: