Pernambuco: a infame privatização das águas
Obsessão da governadora em favorecer capital privado contraria tendência internacional. Para fazer valer sua vontade, ela serve-se de tática baixa: sucateamento do serviço público, e veto ao debate sobre o futuro do abastecimento
Publicado 05/11/2024 às 19:20 - Atualizado 05/11/2024 às 19:21
Depois de adiar a decisão acerca dos estudos do BNDES sobre a participação do capital privado na Companhia Pernambucana de Saneamento (Compesa), o governo de Pernambuco retomou a privatização da empresa. Desde março deste ano as propostas já são conhecidas: a de concessão total, a de concessão parcial, e a de conceder ao capital privado somente os serviços de coleta e tratamento de esgoto.
Inicialmente a governadora Raquel Lyra (PSDB) anunciou que o modelo a ser adotado seria tornado público no último mês de abril corrente, mas calou-se diante das eleições municipais de outubro, já que defender concessões de serviços essenciais ao capital privado é indigesto junto à opinião pública.
Como quem foge da cruz, o governo estadual tem evitado falar diretamente em privatização. Prefere o termo “concessão”, que nada mais é do que uma forma de privatização. Membros do governo tentam iludir, mentir, esconder que de fato a intenção é de transferir ativos da empresa pública para a iniciativa privada, alienando os bens da empresa.
Ao longo dos anos os pernambucanos da capital, agreste e sertão sofrem as consequências do descaso dos governantes em relação ao abastecimento de água. Com acenos à população, o governo age como vendedor de ilusões, prometendo que o acesso à água será universalizado, juntamente com o esgotamento sanitário até 2033. Assim o fez o governo de Jarbas Vasconcelos (PMDB) em relação a antiga Companhia Energética de Pernambuco (Celpe), prometendo com a privatização a modicidade tarifária, a melhoria na qualidade dos serviços prestados com investimentos em tecnologia, em inovação, e uma eficiente gestão empresarial.
Todos sabem no que deu. Além das tarifas estratosféricas, a privatização da energia teve como consequência a degradação e precarização das condições de trabalho dos eletricitários, o que resultou em péssimo atendimento e baixa qualidade dos serviços prestados. Com a privatização, houve demissões de pessoal – o que desmantelou a capacidade operativa de manutenção e atendimento das demandas dos usuários. Sem dúvida é o que acontecerá com a privatização da Compesa.
Segundo levantamento do banco de dados Public Futures, coordenado pelo Instituto Transnacional (TNI), na Holanda, e pela Universidade de Glasgow, na Escócia, cresce em todo o mundo o número de casos que vão na direção oposta, com a retomada do serviço público de água por prestadores públicos após períodos de concessão privada.
O que se verifica mundialmente é que o processo de privatização de serviços de água e energia, essenciais a população, só tem beneficiado aos investidores privados, cujo compromisso é somente com o lucro, o que contraria os interesses dos consumidores. A ausência do Estado no setor impede o acesso generalizado da população à água potável e ao saneamento básico, mantendo-os com níveis muito baixos de atendimento, além de perpetuar a grande discrepância entre as áreas urbanas e rurais.
No Brasil, a direita e extrema direita de uma maneira geral, representadas pelo governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos) e o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), estão entre as correntes políticas que defendem a venda do patrimônio público, aliando-se ao interesse de grandes corporações interessadas em expandir seus lucros. Em Pernambuco, a governadora é uma entusiasta da privatização assim como seu partido, considerado o “pai das privatizações do setor elétrico” no país.
A Compesa tem sofrido nos últimos anos com a estratégia deliberada de “sucatear para privatizar”. Sucatear serviços essenciais reduz o bem-estar da sociedade e exclui uma parte considerável da população, que passa a não ter acesso a direitos básicos. É cruel, mas aplicada com bastante frequência. Os entreguistas do patrimônio público acabam provocando junto à população uma grande animosidade contra a empresa pública e seus funcionários. Acreditam assim, que jogando a população contra a empresa, favorecem a aceitação de que a solução privada.
Os exemplos no mundo são muitos, mostrando que a privatização da água e da energia tem acarretado tarifas abusivas, atendimento precário, priorização do pagamento de dividendos aos seus acionistas em detrimento da realização dos investimentos prometidos e, contrariamente aos interesses da população, fornecendo remuneração escandalosa aos dirigentes das empresas. Estes são alguns dos problemas que tem levado várias cidades e países à reestatização destes serviços.
Espero que, devido ao exemplo da privatização da Celpe e suas consequências nefastas à população, não caiamos no “canto da sereia” da governadora de que a solução para o abastecimento da água e a universalização do saneamento em Pernambuco passem pela privatização da empresa.
Diga NÃO à privatização da COMPESA A água é um direito e não uma mercadoria.