Rosa Branca (Ou: Carta aos estudantes de Munique)
Homenagem a um pequeno grupo de jovens que, em 1943, desafiou o nazismo. Imprimiram cartas. Espalharam, em sigilo, pétalas pelos ares. A lâmina desceu – a lâmina sempre desce. Mas uma flor cortada não está morta: sempre é possível fazer algo!
Publicado 05/12/2025 às 16:00 - Atualizado 05/12/2025 às 16:01

Autor desconhecido / Domínio público / Europe Remembers
- Sempre é possível desafiar o impossível
Alemanha, inverno de 1943. Jovens estudantes, poucos, é certo. Hans Scholl, estudante de medicina recém chegado da Frente Oriental, Sophie, sua irmã mais jovem, Alexander Schmorell, Christoph Probst, poucos…
Liselotte Furst-Ramdohr, a amiga e simpatizante (uma das poucas a sobreviver). Outros, poucos…
Quarenta ao máximo, da maioria não se conhece o nome. Sabe-se que havia.
Há sempre quem desafia o medo nos mais pequenos gestos. Pode ser escondendo panfletos entre vassouras, preparando estênceis para ganharem vida nos muros. Sempre é possível desafiar o impossível.
Outros, menos ainda, podem ousar um pouco mais, depositar uma carta-protesto em uma caixa de correio, sem remetente, anonimamente. Palavras datilografadas em folhas brancas, mimeografadas na clandestinidade, viajando de mão em mão, encaminhadas pelo correio ou espalhadas nos corredores de escolas, deixadas em bancos de bonde ou praça.
Sempre há o que fazer.
Outros, menos ainda, podem ousar um pouco além. Pegar os estêncis e imprimir nos muros:
– Queremos paz, não guerra!
– 300 mil soldados morreram em Stalingrado!
– Abaixo Hitler!
Poucos muros, é certo. Poucos jovens a desafiar o Sistema, igualmente certo. Ainda assim, rosas podem brotar pelas caixas de correio, nos bancos das praças, nos muros.
- Quando o céu pesa como chumbo
Sempre é possível vencer o medo.
Mesmo em marcha sob passo militar, o céu pesando como chumbo. Mesmo quando tudo pode ser treva. Mesmo quando todos podem seguir por um só caminho. Ainda assim, pode nascer uma rosa entre coturnos. Uma flor a rasgar o metal. Uma pétala a alterar o passo.
Eles não tinham armas, apenas palavras escritas em porões,
lidas na penumbra. Palavras mais afiadas que baionetas. Folhas de papel perfurantes. Mais que a lâmina da guilhotina.
- Jovens estudantes
Jovens estudantes de Munique escreviam sabendo que seriam lidos por poucos, ouvidos por menos ainda. Sabendo que seriam punidos por muitos.
Ainda assim, escreveram.
Ainda assim, distribuíram.
Atreveram-se.
Desafiaram o terror.
Plantaram uma flor.
Uma flor
pálida e feroz,
delicada e indomável,
uma Rosa Branca a desafiar Hitler.
Um homem só?
Não, toda uma multidão em personificação. Um Sistema de opressão sustentado por gente cúmplice em ordem unida, do mais baixo ao mais alto escalão.
Um céu pesando como chumbo.
Ainda assim, desafiaram, fizeram algo, agiram.
Semearam contra o terror e plantaram uma flor.
- Rosas limpas de ódio
Rosas limpas de ódio, flagrância da palavra justa, rastro de lucidez entre espinhos. Jardim de coragem entre dedos trêmulos donde brotaram palavras que haviam perdido significado sob a voz violenta do nazismo.
A justiça, a honra, a liberdade, deixaram de ser linhas de um livro rasgado e ganharam força e verdade.
As palavras nas Cartas escritas pelos Estudantes de Munique:
-Nada é mais indigno que obedecer em silêncio.
Eles desafiaram o silêncio sob a mais bruta opressão. Redigiram Cartas a ecoarem sob portas fechadas entre corações que resistiam e mentes que não se vendiam.
Naquele tempo sombrio, sob aquele poder opressor, plantar rosas da verdade seria sentença de morte. Eles sabiam; e ainda assim plantaram.
- Um punhado de jovens
Mesmo quando todos marchavam em passo marcado, ainda assim houve um punhado de jovens que não se fez indiferente. Gente que plantou a palavra que floresce. Sempre é possível ter coragem.
Hans e Sophie, irmãos de sangue e sonho, fizeram da folha de papel
sua arma mais pura. Jovens de religião luterana, fecharam os olhos para rezar
e abriram os olhos para lutar.
Com a Rosa Branca, estudantes de Munique sob o manto do nazismo plantaram com papel, com palavra, com silêncio, com a dignidade de quem sabe que resistir é a forma mais elevada de existir.
- A derradeira Carta
Foi a sexta e última carta, lançada como chuva de pétalas de rosa. Panfletos a regar mentes estudantis quando o medo era a língua oficial e o preço da verdade, a própria vida.
– O nome da Alemanha permanecerá para sempre desonrado se a juventude alemã não se levantar finalmente, vingar e expiar, destruir seus algozes.
Do pátio da universidade, rosas esvoaçaram:
– Nada é mais indigno que obedecer sem alma, que dobrar o joelho à brutalidade.
Dois irmãos apenas, Hans e Sophie, desafiaram todo o Sistema.
Um zelador da universidade viu os jovens a espalharem rosas e pétalas, poderia ter permanecido em silêncio; mas não, denunciou, apontou.
Com sua banalidade fez o mal,
olhos, ouvidos e mãos
a serviço da opressão,
como tantos milhões o são.
Misturados à multidão ainda na universidade, identificados pela Gestapo foram levados à prisão.
- Tribunal sem Justiça
Regimes de opressão abusam de todos os poderes que usurpam. Podem simplesmente desaparecer com as pessoas, torturar, esmurrar, humilhar, eletrocutar, afogar, enforcar, matar…
Comportam-se como donos da vida e da morte. Não só sob o nazismo, mas em todos regimes de opressão, sejam ditaduras ou autocracias dos poucos ou dos muitos. O regime nazista poderia simplesmente matar, mas era preciso demonstrar. Dar o exemplo, atemorizar com a justiça imunda.
Os irmãos, jardineiros de rosas brancas. Outro companheiro, Christoph, pai de duas crianças, também autor da Carta, foram levados ao tribunal sem justiça.
O infame juiz, martelo em punho, rugia contra os jovens acorrentados e indefesos. No tribunal, apenas os fardados. Ainda assim, os jovens estudantes de Munique desafiaram e amedrontaram os agentes da injustiça.
– Vocês não nos derrotam!
Disse Sophie. Tão menina, olhos firmes, voz altiva.
Ao fim, a sentença: morte por guilhotina.
Em poucos dias a lâmina desceu; a lâmina sempre desce.
Mas a palavra havia sido lançada.
- Chuva de Rosas
Os papéis atravessaram fronteiras, ultrapassaram pelotões.
Nas mãos de quem?
Não se sabe.
Talvez um diplomata estrangeiro, talvez uma professora…
Alguém, não importa quem.
Sempre é possível desafiar o impossível.
Verão de 1943.
Uma chuva de pétalas brancas cobre as cidades da Alemanha. Milhares, talvez mais de milhão de cópias da derradeira Carta. Esvoaçando, lançadas por aviões das tropas aliadas, chegando aonde os estudantes de Munique jamais sonharam alcançar.
– O nome da Alemanha será manchado para sempre, a menos que a juventude tenha coragem de lutar.” – estava escrito nas pétalas da Rosa Branca.
- A palavra justa voou
Mesmo com os jovens decapitados, os amigos perseguidos, o movimento desmontado, a Carta apreendida. Mesmo assim a palavra justa voou mais forte que o silêncio armado.
O fio da lâmina da guilhotina não pôde cortar a verdade, apenas a entregou ao vento. E o vento levou.
– Cada um tem o dever moral de resistir! – estava escrito nas pétalas da Rosa Branca.
- A rosa floriu
Os jovens do movimento Rosa Branca resistiram no último suspiro, no último golpe, nas últimas palavras. Uma rosa cortada não é uma rosa morta, é broto para outra rosa. Cortar uma rosa não impede que ela floresça outra vez.
– Leiam!
– Pensem!
– Resistam!
A chuva de pétalas da Rosa Branca ensinou: sempre é possível fazer algo para vencer o impossível.
A rosa floriu
no frio de Munique,
na dor de Stalingrado,
na vergonha dos que sentiram o peso
da mentira suja de sangue.
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