COP30: Tudo o que está em jogo em Belém
Conferência herda as debilidades da agenda climática global: não há medidas concretas para superar a energia fóssil, proteger as florestas ou financiar a transição. Será possível superar estas lacunas na Amazônia? Um guia para compreender o que veremos nos próximos dias
Publicado 12/11/2025 às 20:20

A chamada “agenda de negociação” das conferências sobre mudança climática é a que produz os acordos que são adotados por todos os países e têm valor de lei internacional. Esses acordos, no entanto, dependem do consenso das mais de 190 nações que fazem parte da Convenção do Clima e do Acordo de Paris, cujo objetivo é conter o aumento da temperatura do planeta e, assim, evitar a extinção da vida.
Este ano, alcançar consensos entre os governos tornou-se muito mais difícil devido ao contexto global. Ao fazer do negacionismo da mudança climática uma política oficial e usar explicitamente o poder econômico e militar dos Estados Unidos para ameaçar outros países, Donald Trump agravou a deterioração já em curso das relações internacionais. Nos últimos anos, o mundo tem sido incapaz, por exemplo, de deter a invasão russa da Ucrânia e o massacre dos palestinos por parte de Israel.
Para completar o problema, a agenda de negociação da COP30, a primeira conferência sobre o clima que será realizada na Amazônia, está cheia de lacunas. Como acontece todos os anos desde a primeira COP, em 1995, os temas desta agenda são herdados das conferências anteriores. A de 2025 é pouco ambiciosa porque, em teoria, quase todos os temas que tinham que ser negociados a partir do Acordo de Paris – o tratado internacional sobre as mudanças climáticas assinado na COP21 em 2015 – já foram considerados. No entanto, as negociações anteriores não estabeleceram caminhos claros para implementar medidas fundamentais para frear a mudança climática, como a eliminação dos combustíveis fósseis.
Os movimentos socioambientais vêm pressionando a direção brasileira da COP30 para que proponha acordos mais ambiciosos. Agora esta pressão recebeu um impulso graças a uma decisão histórica adotada em 23 de julho pela Corte Internacional de Justiça (CIJ), o principal tribunal da Organização das Nações Unidas (ONU). Com base em tratados internacionais referentes ao clima, à biodiversidade e aos direitos humanos, a CIJ concluiu que é uma obrigação legal de todos os países agir contra a mudança climática e que devem cooperar entre si para fazê-lo.
Por mais que caiba a cada país determinar seu próprio objetivo de redução de emissões de gases de efeito estufa, o tribunal da ONU afirmou que este objetivo não pode ficar a seu arbítrio e deve representar «uma contribuição adequada» para manter o aumento da temperatura do planeta em 1,5°C, como determina o objetivo «primário» do Acordo de Paris. Além disso, a Corte considerou que se poderá responsabilizar legalmente os países que não cumprirem suas obrigações. A decisão é um «parecer consultivo», o que significa que seu cumprimento por parte dos governos não é obrigatório. No entanto, tem um peso político e jurídico e pode dar lugar a processos em tribunais nacionais e internacionais.
A decisão da Corte da ONU reforça a demanda por objetivos mais concretos e ambiciosos para as negociações na COP de Belém. Em 19 de agosto, o presidente da conferência, André Corrêa do Lago, anunciou um calendário de consultas até novembro com os governos e organizações observadoras, com o objetivo de formular propostas que preenchessem as lacunas da agenda de negociação. “A humanidade não pode se permitir mais atrasos derivados de possíveis falhas de confiança e cooperação, já que a COP30 marca precisamente a metade da década que a melhor ciência disponível considera crítica para nossos esforços de limitar o aumento da temperatura a 1,5°C”, disse ele em uma carta pública. A seguir, abordamos o estado atual dos principais pontos desta agenda e o que estabelece o parecer sobre alguns deles[1].
A luta por um cronograma para a eliminação dos combustíveis fósseis
Não há nenhum ponto específico, na agenda das conferências sobre o clima, que trate da eliminação progressiva dos combustíveis fósseis. O compromisso com a «transição para se afastar dos combustíveis fósseis» entrou pela primeira vez nas negociações climáticas como parte do acordo sobre o Balanço Global, nome do documento aprovado na COP28, em 2023, que enumera os passos necessários para que se cumpra o Acordo de Paris. Como muitos dos documentos sobre o clima, o Balanço Global também deixa pontos vagos sobre esta questão. Não especifica, por exemplo, se se fala do uso ou da produção de petróleo, gás e carvão. Afirma, no entanto, que “nesta década crítica” é preciso acelerar a eliminação.
Na COP28 também foi aprovada a criação do Diálogo dos Emirados Árabes Unidos para discutir a implementação dos resultados do Balanço Global. No entanto, as negociações do Diálogo não avançaram na COP29, reunida em 2024 no Azerbaijão. Essas dificuldades também se apresentaram na reunião de meio de ano da Convenção sobre o Clima, que foi celebrada na cidade alemã de Bonn e deu o pontapé inicial às negociações que finalizarão – ou não – na COP do final de 2025. Os negociadores reunidos em Bonn enviaram para a reunião de Belém dois rascunhos distintos sobre a implementação do Balanço Global, mas nenhum deles menciona especificamente os combustíveis fósseis.
A maioria dos países rejeita a criação de um mecanismo para monitorar a implementação do Balanço Global e afirma que cada país teria que tratá-lo individualmente, dentro dos objetivos nacionais de redução de emissões de gases de efeito estufa. As organizações socioambientais sustentam que o tema dos combustíveis fósseis é fundamental e é preciso abordá-lo à parte, já que sua queima gera mais de 75% das emissões. Trata-se do «elefante na sala», como diz Claudio Angelo, coordenador de política internacional do Observatório do Clima.
Desde a COP28, a sociedade civil e alguns governos defendem que se estabeleça um cronograma para a eliminação gradual dos combustíveis fósseis, com os países ricos à frente. O Brasil incluiu o cronograma proposto no documento em que apresentou, em novembro de 2024, o objetivo de redução de emissões de gases de efeito estufa até 2035[2]. Em junho, uma carta assinada por mais de 250 cientistas pediu ao presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva que liderasse uma iniciativa nesse sentido.
Um estudo da organização Oil Change International mostrou que quatro países ricos – EUA, Canadá, Noruega e Austrália – são responsáveis por 70% da expansão da produção de petróleo e gás prevista até 2035. Os EUA de Donald Trump, sozinhos, são responsáveis pela maioria desses planos de ampliação. Na lista dos 20 países que lideram os projetos para aumentar a produção, o Brasil está em nono lugar, à frente da Arábia Saudita. O governo de Lula da Silva pretende abrir uma nova frente de prospecção de petróleo na Bacia da Foz do Amazonas, uma região de alta sensibilidade ambiental.
A pressão dos movimentos socioambientais para que o Brasil proponha uma negociação à parte, para a eliminação de combustíveis fósseis na COP30, foi reforçada pelo parecer consultivo da CIJ. O parecer estabelece que os países que não adotarem medidas apropriadas para reduzir a produção, o consumo, a concessão de novas licenças de exploração e os subsídios aos combustíveis fósseis poderiam ser acusados de cometer «um ato internacionalmente ilícito.
Um plano de ação para todas as florestas
Assim como com os combustíveis fósseis, não há nenhum ponto na agenda de negociações das conferências sobre o clima que trate especificamente das florestas. O tema também é abordado no Balanço Global, que destaca a importância de conservar, proteger e restaurar a natureza e os ecossistemas e inclui a meta de desmatamento zero em 2030. O Balanço Global fala da necessidade de apoio e financiamento para alcançar este objetivo, mas não prevê a elaboração de um plano para torná-lo realidade. Há uma menção ao pagamento pela redução de emissões, consequência do combate ao desmatamento, como acontece, por exemplo, nas doações que recebe o Fundo Amazônia.
A liderança brasileira da conferência pretende priorizar o financiamento das florestas em pé e a restauração florestal na chamada «agenda de ação» da COP30. Esta agenda aborda compromissos entre grupos de países, empresas e organizações. No entanto, estes compromissos não têm força de lei internacional. O governo espera lançar em Belém o Fundo Florestas Tropicais para Sempre, conhecido como TFFF (por sua sigla em inglês), um mecanismo de mercado para remunerar os países florestais pelos chamados «serviços ecossistêmicos» que estes biomas proveem, por exemplo, na preservação da biodiversidade e na regulação das chuvas. Este fundo, no entanto, não é um instrumento que faça parte das negociações sobre o clima. Também deve ser aprovada em Belém uma resolução que estabeleça uma sinergia formal entre as três convenções – a do clima, a de biodiversidade e a de combate à desertificação – que saíram da Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento que foi realizada no Rio de Janeiro em 1992.
Como no caso dos combustíveis fósseis, as organizações socioambientais defendem que o Brasil proponha uma decisão da COP sobre as florestas. O Greenpeace lançou uma proposta de plano de ação para o fim do desmatamento em todo o mundo. «Ainda não temos uma abordagem estruturante para o tema das florestas dentro da Convenção do Clima», diz Camila Jardim, do Greenpeace Brasil. «O Brasil é um exemplo de país florestal que tem uma atuação contundente no combate ao desmatamento e poderia liderar este plano», sugere. O parecer do tribunal da ONU recorda que frear a mudança climática implica tanto reduzir as emissões quanto fortalecer os «sumidouros» de carbono, como as florestas, outros biomas terrestres e os oceanos. Os sumidouros eliminam o gás que causa o efeito estufa da atmosfera.
A transição justa ainda não tem destino
O programa de trabalho sobre uma transição justa foi estabelecido na COP27, reunida no Egito, para dar curso ao objetivo do Acordo de Paris de alcançar «uma transição justa da força laboral e a criação de trabalho decente e empregos de qualidade». Nas discussões, ampliou-se este conceito e ele agora abrange, além dos trabalhadores formais e informais, a participação e os direitos de outros grupos da sociedade – como os indígenas, os imigrantes e os jovens – na construção de um modelo socioeconômico que seja compatível com a preservação da vida e não aprofunde as desigualdades.
Não houve acordo para aprovar um texto sobre transição justa na COP28 e na COP29, mas, na reunião de junho passado em Bonn, este foi um dos pontos de negociação que mais avançaram. O rascunho que foi enviado a Belém inclui, pela primeira vez, as pessoas afrodescendentes entre os grupos que se consideram prioritários em uma transição justa. Por sugestão da Colômbia, este é também o único documento dos que saíram de Bonn que menciona a eliminação gradual dos combustíveis fósseis, em um parágrafo que trata sobre a ampliação do acesso à energia limpa. No entanto, em último momento, os países árabes sugeriram uma redação alternativa, sem esta menção: o texto final será negociado em Belém.
Além disso, a grande pergunta é se será ou não estabelecido um mecanismo para supervisionar e apoiar a implementação do acordo de transição justa ou se ele ficará meramente como uma declaração de intenções.
«A transição justa é uma das temáticas mais novas na Convenção do Clima, mas é extremamente relevante», diz Mariana Belmont, do Geledés-Instituto da Mulher Negra, do Brasil. E acrescenta:
Traz uma perspectiva social que faltava nos debates sobre a mitigação e a adaptação climática. Este movimento tem que avançar para que os processos desta transição não aumentem as desigualdades. Acompanharemos de perto os próximos passos para assegurar a permanência dos afrodescendentes e a criação de uma estrutura que nos mostre um caminho que contemple os direitos humanos na agenda climática.
A decisão da CIJ estabelece uma vinculação clara entre a obrigação de conter a emergência climática e os direitos humanos, ao afirmar que os efeitos da mudança climática podem afetar significativamente a capacidade de usufruir destes direitos, entre os quais se incluem o direito à vida, à saúde, o acesso à comida e à moradia, além dos direitos das mulheres, das crianças e dos povos indígenas.
O que fazer com a “lacuna de ambição”?
Segundo o Acordo de Paris, este ano todos os signatários têm que entregar seu novo objetivo de redução de emissões, a Contribuição Nacionalmente Determinada (NDC, por sua sigla em inglês), com objetivos até 2035. Até o fechamento deste artigo, em 28 de julho, apenas 27 o haviam feito[3]; entre os que ainda devem entregá-lo estão a China e a União Europeia. Antes da COP30, a Convenção da Mudança Climática divulgará um documento sobre as novas NDCs, que dirá se os compromissos do conjunto de países são suficientes para cumprir o Acordo de Paris. Previu-se que a resposta será negativa e que haverá uma «lacuna de ambição», ou seja, que os países terão que ir além do prometido para conter o aumento da temperatura média do planeta idealmente abaixo de 1,5°C com relação ao período pré-industrial, ou pelo menos abaixo de 2°C.
Não há nenhum ponto formal da agenda de negociação em Belém que aborde esta possível «lacuna de ambição». No entanto, dá-se como certo que o tema será discutido na cúpula de chefes de Estado e de governo que precederá a COP30, ou na própria conferência. A questão é se isto acarretará alguma declaração ou documento acordado por todos os países. «Se a avaliação das NDCs mostrar um panorama em 2035 que não pareça bom, teremos que agir coletivamente para mudá-lo. São tempos extraordinários que requerem muito mais unidade. Temos que recuperar nosso senso de urgência em todos os níveis e não podemos nos deixar paralisar pelo contexto internacional», diz o diplomata Túlio Andrade, chefe de Estratégia e Alinhamento da COP30.
O dinheiro para a adaptação não está garantido
Uma decisão da COP26 em Glasgow, Escócia, criou um Programa de Trabalho sobre o Objetivo Global de Adaptação (OGA), previsto no Acordo de Paris. A ideia é estabelecer indicadores que possam medir o progresso dos países nas medidas de adaptação à mudança climática. Este é o ponto das negociações nas conferências sobre o clima que mais tem a ver com a vida cotidiana das pessoas.
A definição de 100 indicadores, com a ajuda de especialistas, tem que ser completada este ano e aprovada em Belém. No entanto, as negociações quase se paralisaram na reunião da Convenção sobre o Clima em Bonn, em junho, devido à resistência das nações ricas a que os indicadores incluíssem meios de implementação, ou seja, os recursos monetários e tecnológicos para que os países adotem medidas de adaptação. Os denominados «países em desenvolvimento» argumentam que este financiamento deve ser público, já que a adaptação depende em grande medida de obras de infraestrutura que não são rentáveis e, portanto, não atraem o setor privado.
Ao final, mantiveram-se os meios de implementação no texto que será analisado em Belém. «A inclusão de indicadores de meios de implementação é sem dúvida um bom sinal», diz Thaynah Gutierrez, da Rede pela Adaptação Antirracista, do Brasil. «Mas este bom sinal veio com muita incerteza, já que a COP30 ainda tem que assegurar o financiamento para implementar os indicadores e os objetivos acordados», explica. Para ela, outro desafio será incluir as populações afrodescendentes como grupo prioritário na agenda de adaptação. Chegou-se a incluir esta menção, mas acabaram eliminando-a do documento negociado em Bonn. «A Presidência da COP30 tem sido enfática na menção aos afrodescendentes em todas as salas de negociação, mas ainda falta diálogo com os países nos bastidores».
O parecer da CIJ também destaca a obrigatoriedade legal de adotar medidas de adaptação como um «complemento às obrigações de mitigação [redução de emissões] para prevenir e reduzir as consequências nocivas da mudança climática».
A rota Baku-Belém e o nó do financiamento
Em teoria, a negociação sobre o financiamento no marco das conferências sobre o clima foi concluída na COP29. Em Baku, estabeleceu-se um novo objetivo de financiamento a cargo dos países ricos de 300 bilhões de dólares por ano, quantia que seria alcançada somente em 2035. Considerou-se que este montante é insuficiente perante as necessidades, que são estimadas em pelo menos 1,3 trilhão de dólares por ano. Além disso, houve descontentamento com o texto do acordo porque dá importância excessiva à «mobilização» de investimentos privados. Por isso o tema voltou a surgir este ano, quando países como a Índia e a Bolívia pressionaram para que se reabrisse o diálogo sobre o financiamento. A questão pode chegar a travar as negociações em Belém e ainda não se sabe qual abordagem será proposta pela liderança brasileira da COP30.
Segundo a Convenção sobre o Clima de 1992, a obrigação de financiamento é atribuída aos «poluidores históricos», os 24 países que naquele momento faziam parte da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE), entre os quais estavam os EUA – que Trump retirou do Acordo de Paris –, nações europeias como França e Alemanha, e Canadá, Austrália, Nova Zelândia e Japão. Esta obrigação ficou consagrada no princípio das «responsabilidades comuns, porém diferenciadas». O parecer da CIJ reafirmou este princípio, mas introduziu uma nuance nesta discussão. O documento afirma que a condição de um país como «desenvolvido» ou «em desenvolvimento» não deve ser considerada «estática», mas sim que depende «de uma avaliação das circunstâncias atuais do país em questão». Isto significa que os países que atualmente têm emissões muito altas ou possuem abundantes recursos financeiros – como Arábia Saudita, China ou Rússia – poderiam ser considerados entre os que têm a obrigação de financiar os demais.
Por ora, o que há de concreto é que o acordo da COP29 encarregou o Brasil e o Azerbaijão de elaborarem uma «rota Baku-Belém» que aponte meios para que o montante de financiamento climático chegue a 1,3 trilhão de dólares por ano. Na reunião de meio de ano da Convenção sobre o Clima, em Bonn, a secretária de Assuntos Internacionais do Ministério da Fazenda, Tatiana Rosito, apresentou algumas das medidas que serão propostas. A maioria delas fica fora do âmbito de decisão das conferências sobre o clima, como a reforma dos bancos multilaterais de desenvolvimento – instituições como o Banco Mundial e o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) – e o aumento dos empréstimos «concessionais», ou seja, com condições especiais de pagamento para os países com menos recursos. Hoje, os países ricos estão reduzindo inclusive a chamada «ajuda ao desenvolvimento», que não está necessariamente vinculada à necessidade de conter a emergência climática.
As organizações socioambientais pedem que a rota dê mais ênfase ao financiamento público da ação climática e a medidas como o perdão da dívida externa aos países mais pobres para que possam investir na transição ecológica. Outro ponto considerado essencial pela sociedade civil é a inclusão do princípio de «fazer com que os poluidores paguem», com o estabelecimento de impostos extraordinários aos setores que mais emitem, como a indústria petrolífera. Este dinheiro seria usado para ajudar os países em seus esforços para reduzir as emissões e adaptar-se aos efeitos da mudança climática.
Uma interrogação que paira sobre a «rota» é se ela será ou não incorporada de alguma maneira às decisões formais da COP30. «A ‘rota’ Baku-Belém não é um ponto de negociação, mas sim um relatório que resulta das negociações entre as duas presidências e que será apresentado aos países», explica Tatiana Oliveira, do Fundo Mundial para a Natureza (WWF, por sua sigla em inglês). «Não sabemos se a citarão, se a adotarão, se terá um impulso no documento final. Sem isso, faltam dentes, como dizemos no direito internacional», explica. Em outras palavras, poderia acabar simplesmente como mais um relatório, sem poder real para influenciar a realidade.
Os afrodescendentes e o plano sobre gênero
Em 2014, na COP20 de Lima, Peru, estabeleceu-se um programa de trabalho sobre gênero e clima que criou um plano de ação para garantir que as questões de gênero fossem levadas em conta nas políticas climáticas. Este plano venceu em 2024 e o programa de trabalho elabora um novo para substituí-lo. O rascunho que saiu de Bonn e será debatido em Belém menciona pela primeira vez as mulheres e meninas afrodescendentes como um dos grupos que é preciso priorizar nas políticas climáticas.
Esta inclusão foi o resultado de uma estratégia de intervenção nas negociações climáticas das organizações antirracistas brasileiras e de defesa da população negra. A demanda contou com o apoio dos negociadores do Brasil. Leticia Leobet, do Geledés-Instituto da Mulher Negra, recorda que a menção aos afrodescendentes já havia sido feita na reunião de Bonn no ano passado, mas a retiraram quando a negociação do novo plano de ação chegou à COP29, em Baku. «Este ano o cenário é diferente, mais otimista. O Brasil propôs a inclusão das pessoas afrodescendentes e a COP é realizada no Brasil. Esperamos que os negociadores brasileiros levem a cabo as conversações necessárias para respaldar a proposta», diz Leobet, recordando que 56% da população do país é afrodescendente.
As ruas tentam evitar a paralisia dos governos
Na primeira COP do clima realizada em um país democrático em quatro anos – as anteriores foram no Egito, Dubai e Azerbaijão –, espera-se uma grande pressão nas ruas dos movimentos sociais e organizações da sociedade civil, assim como na Cúpula dos Povos e no espaço da conferência, para pressionar os negociadores. No âmbito dos governos predomina ainda uma forte paralisia, que impediu até agora a união de blocos geopolíticos contra o assédio de Trump, inclusive nos temas vinculados ao clima e ao meio ambiente.
Além da crise do multilateralismo, o custo das hospedagens em Belém, a capital do estado amazônico do Pará onde ocorre a COP30, acrescentou tensão à preparação do encontro. Os grupos de países africanos, países-ilha e latino-americanos chegaram a pedir sua transferência para outra cidade, algo que o governo brasileiro descartou. Criou-se uma força-tarefa para ajudar as delegações a encontrar onde ficar, numa tentativa de evitar o risco de ausências que poderiam pôr em dúvida a legitimidade da conferência.
Nota: uma versão anterior deste artigo foi publicada na revista “Sumaúma”, em 7/8/2025, com o título «A agenda de negociação da COP30 ponto por ponto: pequenos avanços e omissões flagrantes».
[1]Nos apoiamos para isso em alguns relatos prévios, disponíveis em https://sumauma.com/tag/conferencia-do-clima/.
[2]Oil Change International: «Planet Wreckers: Top Global North Countries Responsible for Nearly 70% of Projected New Oil and Gas Expansion to 2035», 16/6/2025, disponível em oilchange.org.
[3]Ver o «NDC Tracker», no Climate Watch: www.climatewatchdata.org/ndc-tracker.
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