Indústria da saúde tira soberania do discurso para realidade
Debate realizado no Seminário SUS 35 anos mostra caminhos para efetivar uma ideia de nação livre e próspera.
Publicado 22/09/2025 às 13:07 - Atualizado 22/09/2025 às 18:08

A Sessão Especial que debateu a economia e indústria da saúde no Seminário SUS 35 anos, promovido pelo Outra Saúde nos dias 18 e 19 de setembro, encaixa-se perfeitamente ao contexto político do momento.
José Gomes Temporão, ex-ministro da Saúde e consultor do BNDES para Indústria da Saúde, Rosane Cuber, presidente de Bio-Manguinhos/Fiocruz, e Eduardo Rodrigues, economista e pesquisador da saúde privada, debateram diante de um lotado auditório na Escola de Sociologia e Política (FESPSP).
Em linhas gerais, suas falas dialogam de forma concreta com o discurso que encheu ruas do Brasil neste domingo: soberania nacional. No caso, na produção de insumos e medicamentos voltados à população brasileira e ao SUS.
“O Complexo Econômico Industrial da Saúde (CEIS) tem relação direta com o cuidado e o direito à saúde no sentido mais amplo. A pandemia jogou luz no tema, pois muitos países ficaram de joelhos por conta de restrições de um modelo de desenvolvimento. Isso é agravado pelos ataques de Trump ao Brasil”, explicou Temporão.
Sua exposição fez um histórico de avanços e retrocessos no setor saúde em termos econômicos e políticos, desde a criação de órgãos reguladores às disputas macroeconômicas que ora promoveram a indústria nacional, ora a sabotaram.
E se soberania exige materialidade, a presidente do complexo fabril de Bio-Manguinhos trouxe exemplos que mostram as condições de um salto de qualidade diante do Brasil neste exato momento. “Temos todo um pacote de componentes estratégicos entregues, a exemplo de 700 milhões de doses de vacinas, kits, testes, biofármacos e agora produtos para doenças raras”, afirmou Rosane Cuber.
Em sua exposição, a diretora destacou a orientação de Nísia Trindade, que criou políticas de incentivo à produção local e parcerias com empresas estrangeiras que incluem a transferência de tecnologia. “Temos projetos estratégicos de combate ao câncer através de desenvolvimento de células CAR-T e terapias inéditas para doenças raras. Esses tratamentos serão 90% mais baratos do que nos EUA e Europa. Temos 15 PDP [Parcerias para o Desenvolvimento Produtivo] e 12 projetos de desenvolvimento e inovação nacional”.
Além disso, destacou aquela que talvez seja a maior façanha do campo científico brasileiro: a patente de RNA mensageiro, recém-registrada pela Fiocruz. A tecnologia é a última novidade para desenvolvimento de tratamentos para diversas doenças graves.
Por fim, destacou a ampliação do parque produtivo do complexo farmacológico de Manguinhos, com novas plantas fabris no Rio de Janeiro e Ceará, que poderão colocar o Brasil em papel de liderança definitiva no Sul Global.
Já em sua exposição, Eduardo Magalhães trouxe o “outro lado” – isto é, os atores privados que concorrem com o SUS na oferta de serviços e produtos. Na prática, significam uma orientação de gastos privados que ainda predomina no país e é fonte de imensos gastos nas famílias brasileiras. Sua pesquisa analisa o setor corporativo brasileiro, no qual as megaempresas de saúde, em franco processo de concentração de capital, são definidas como “sete irmãs” [saiba mais em artigos publicados por Outra Saúde aqui e aqui].
“São 200 empresas que comandam a economia corporativa brasileira e 63,5% do PIB nacional. São três grandes setores dentro de 21 que elenco no meu estudo. As grandes empresas de saúde só ficam atrás do setor elétrico recém-privatizado e do setor bancário financeiro”, apontou, em exposição que causou bastante surpresa no auditório.
O Seminário SUS 35 anos foi uma realização do Outra Saúde em parceria com o Instituto Walter Leser (IWL/FESPSP), Fundacentro (MTE) e Programa de Pós-Graduação em Saúde Coletiva da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de SP.
Outras Palavras é feito por muitas mãos. Se você valoriza nossa produção, seja nosso apoiador e fortaleça o jornalismo crítico: apoia.se/outraspalavras