Como a Saúde Coletiva pode encarar os desafios da digitalização

Debate sobre saúde digital ganha força nos últimos dias do XVII Congresso da Alames. Médicos e pesquisadores discutem pontos essenciais sobre o tema

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A saúde digital é um tema que começa a ser abordado com mais proeminência pelos pesquisadores da Saúde Coletiva. É hora de analisá-la em profundidade para superar o “pé atrás” a respeito de suas possibilidades, defendeu o presidente do Centro Brasileiro de Estudos de Saúde (Cebes), Carlos Fidelis, ao pedir a palavra durante uma das mesas do XVIII Congresso Latino-Americano de Medicina Social e Saúde Coletiva.

Se o assunto acabou escanteado pelo campo nos últimos anos, a escolha dos nomes que compunham a mesa Saúde Digital, ética e tecnologia: dilemas e desafios, na quarta (7), mostram que esse tempo parece ter sido superado. Participaram o recém-laureado pelo prêmio Jabuti, o epidemiologista Naomar de Almeida Filho, o médico e doutor em bioética Luiz Vianna Sobrinho e a pesquisadora da Fiocruz Angélica Baptista Silva, e o debate foi coordenado pelo geneticista argentino Víctor Penchaszadeh.

Naomar iniciou sua fala pontuando a importância de ampliar o debate da digitalização da saúde entre aqueles que defendem o SUS: “o setor privado já faz esse esforço há muito tempo. De certa forma, o campo da Saúde Coletiva está acordando nesse momento, e precisamos estar muito atentos”. Para ele, há um largo potencial para que se possa fazer uma apropriação dos avanços tecnológicos na saúde, desde que se faça a partir de uma perspectiva crítica. A própria epidemiologia, área em que atua, é uma ciência de dados com décadas de existência, e tem muito ganho ao se apropriar dos megadados – versão aportuguesada do termo “big data”, ensina ele. 

Luiz Vianna fez uma intervenção em sentido confluente, voltando seu foco às possibilidades de que médicos e outros profissionais de saúde sejam substituídos por aparelhos médicos incrementados com inteligência artificial e machine learning. Ele apontou algumas pesquisas que mostram que a IA muitas vezes toma decisões mais precisas que os profissionais de saúde, para tratamentos de pacientes. 

Vianna alerta para o seguinte: profissões que dependem de habilidade manual – como as cirurgias – poderão ser extintas. Mas, segundo ele explica, é preciso assegurar que o cuidado na ponta não seja automatizado. Ele defende “uma reterritorialização crítica da saúde digital, com tecnologias inseridas em contextos locais, respeitando culturas, conhecimentos e relações comunitárias”. O médico reforça sua luta por uma necessária Reforma Sanitária Digital.

Angélica abordou outro ponto crucial para o debate: a alfabetização digital da população – e dos trabalhadores da saúde. Na prática, a maior parte dos brasileiros já perderam autonomia sobre seus dados e não têm compreensão dos processos digitais. É crucial ensinar sobre o consentimento livre e esclarecido, especialmente no uso de plataformas como o Meu SUS Digital – muitos usuários não sabem onde estão ou como seus dados são utilizados. Com o aumento de atendimentos por telessaúde, a questão do consentimento torna-se ainda mais relevante, exigindo clareza e transparência para evitar violações éticas e garantir a confiança no sistema.

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