O crime organizado do tráfico de órgãos no Quênia

• No Quênia, o horror da mercantilização de órgãos • O desespero dos quenianos que se submetem ao tráfico • Nova estratégia da ultradireita para proibir aborto em casos de estupro • O risco dos desafios de redes sociais para crianças •

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Três veículos alemães (Der Spiegel, a rede ZDF e a Deutsche Welle) coletaram denúncias, analisaram documentos, conversaram com profissionais da área e rastrearam a atividade de vendedores e compradores de órgãos para identificar como uma rede internacional – que opera do Quênia à Alemanha – explora pessoas vulneráveis e desesperadas, de um lado, por dinheiro e, de outro, por um órgão que pode lhes salvar a vida. A reportagem, resultado de meses de investigação, conta com relatos importantes de vítimas do tráfico de órgãos, sobretudo no Quênia, onde a rede funciona como uma espécie de crime organizado. 

Segundo Willis Okumu, pesquisador do Instituto de Estudos de Segurança na África, há uma área cinzenta na legislação queniana que a rede internacional de tráfico explora. Não há de fato lei que impeça alguém de doar o rim por dinheiro, logo não se pode ser processado por isso. Na verdade, é permitida a doação de órgãos por parentesco e por “razões altruístas”, o que é usado para estabelecer uma cadeia de exploração no país. A compra e venda de órgãos acontece há anos no Hospital Mediheal, em Eldoret (Quênia), com receptores sobretudo de Israel e da Alemanha. A responsável por encontrar doadores e receptores internacionais é uma agência denominada “MedLead”, comandada pelo israelense Robert Shpolanski, que foi inclusive acusado em Tel Aviv por ter realizado “grande número de transplantes renais ilegais” em diversos países. 

Rede de tráfico explora vulnerabilidades para obter lucro

A situação dos doadores quenianos, desesperados para receber o dinheiro prometido, é ainda mais crítica. Eles são obrigados a assinar documentos declarando serem parentes dos receptores e consentindo com a remoção sem serem informados sobre os possíveis riscos não só à saúde física, mas também à mental – além das intensas dores, traumas psicológicos são recorrentes nos relatos de vítimas da rede de tráfico de órgãos no Quênia.

Em trabalho sobre o assunto publicado em janeiro de 2024  no Enact – projeto implementado pela Interpol –, Willis Okumu aponta que, mesmo com os altos custos à saúde física e mental, o preço no mercado ilegal do país diminuiu ao passo que a quantidade de jovens quenianos doando seus rins aumentou. Neste mesmo relatório, Okumu calcula que, no ano de 2023, só no município de Oyugis (Quênia), cem jovens venderam seus órgãos, muitos dos quais vêm de famílias em situação de vulnerabilidade socioeconômica.

Bancada conservadora volta atrás e quer punir somente médicos por aborto legal

Aquele que ficou conhecido como PL do Estuprador, projeto que equipararia o aborto acima de 22 semanas ao crime de homicídio, sofreu revés histórico em sua tramitação, em 2024. Em vitória dos movimentos feministas, o projeto tornou-se rapidamente impopular e terminou não sendo votado. Agora, membros da bancada conservadora antiaborto, avaliando que o fracasso deve-se à penalidade para a gestante, querem apostar em nova estratégia, que prevê punição somente para os profissionais envolvidos no procedimento.

O Outra Saúde, em 2024, recomendou um artigo, fruto de pesquisa realizada com alguns obstretas e residentes, que ajuda a compreender o ponto de vista da classe médica em relação ao aborto. Entrevistados, os médicos destacam como o moralismo acerca da pauta do aborto – latente no PL Antiaborto por Estupro – impede o avanço sua garantia enquanto direito. Além disso, pontuam que a questão da formação para a realização de procedimentos de interrupção de gravidez é uma falha. Se o que se quer evitar é o sofrimento de mulheres que buscam os serviços de saúde, é urgente repensar como a pauta tem sido tratada nos espaços públicos, bem como qualificar serviços de aborto legal no Brasil.

Comunidade médica alerta para riscos de saúde infantil na era digital

Diante das recentes mortes de duas crianças após participarem de um desafio em uma rede social, a Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) publicou nota alertando para os riscos à integridade física e emocional do público infantil por trás de desafios disseminados nas plataformas digitais. Segundo dados do Instituto DimiCuida, pelo menos 56 crianças e adolescentes morreram ou tiveram ferimentos graves entre 2014 e 2025 ao participarem de jogos ou desafios online.

Dentre as recomendações do Grupo de Trabalho Saúde na Era Digital da SBP, apresentadas em documento, estão a supervisão das atividades online e o estabelecimento de regras claras sobre segurança e privacidade  pelos pais e cuidadores. Além disso, a SBP reforça a importância da regulação das redes sociais e do PL que visa a proteção de crianças e adolescentes em ambientes digitais.

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