AI-5 — a peça — encena reunião que radicalizou ditadura há 50 anos. Descontos para Outros Quinhentos
Publicado 28/03/2018 às 22:24 - Atualizado 15/02/2019 às 16:50
Nova temporada de espetáculo baseia-se na ata da sessão que emitiu o famigerado Ato Institucional número 5, em 1968. Quem sustenta Outras Palavras, paga meia
Por André Takahashi
Motivados pela ideia de tornar mais conhecida a fatídica reunião que, há 50 anos, fez a ditadura militar entrar em seu período mais obscuro, o diretor Paulo Maeda e um elenco de 21 atores conceberam a peça “AI-5”. O nome da é o mesmo da medida baixada em 13 de dezembro de 1968, e que tirou as garantias constitucionais, instaurou a censura, a centralização quase absoluta de poder e a intensificação do estado de exceção. Vivendo hoje um segundo golpe, desta vez parlamentar e midiático, é essencial revisitarmos as perdas de direitos no passado para refletir, resistir e construir a superação dos atuais retrocessos.
O 1964 DE ONTEM É O 2016 DE HOJE?
O espetáculo tem como objetivo retratar a reunião do AI – 5, de 50 anos atrás, mas pondo em cheque o que acontece no pós-golpe de 2016 em sua fase de militarização, cenário que parecia inimaginável de se repetir há poucos anos atrás. Segundo Paulo Maeda a peça nasce da necessidade de falar sobre o que se está vivendo hoje no Brasil. Nesse sentido utiliza-se dos elementos cênicos para criar uma ponte entre o golpe militar de 64 e o golpe jurídico-midiático de 2016. Sangue, patos, panelas a revista Veja e outros elementos, demonstram esse diálogo da peça com o golpe de 2016. A peça é renovada constantemente com as notícias atuais, que se manifestam em pequenas intervenções e em detalhes cênicos, quase sempre nada discretos. Ou seja, cada apresentação é única, e retrata um reflexo da reunião do AI-5 com a conjuntura do período de exibição do espetáculo.
AI-5 tem apresentações às terças-feiras de abril (03,10, 17 e 24) às 20h30, e fica em cartaz apenas até o dia 24 de abril. A entrada é de R$30 por pessoa, mas se você colabora com Outros Quinhentos, paga apenas R$15 (a bilheteria não aceita nenhum cartão, somente dinheiro). Para obter o benefício, preencha o formulário abaixo, sempre até as 16h de cada terça-feira de abril. Endereço: Casarão do Belvedere (Sala Cecy e Carmen) – R. Pedroso, 283 (próximo ao metrô São Joaquim), Bixiga, São Paulo.
ESTÉTICA – DO DOCUMENTAL A RECONSTITUIÇÃO (trecho do release)
Uma mesa em trapézio que desce em diagonal, 21 cadeiras, 21 pastas, um microfone, 3 livros da Constituição, um relógio, um crucifixo…esse é o cenário da peça “AI-5”. O diretor continua sua pesquisa iniciada em “Pequeno-Burgueses, Rapsódia em Duas Partes” da Cia. Bruta de Arte a partir da obra de Jean Pierre Sarrazac “O Futuro do Drama”. Segundo o autor a dramaturgia contemporânea passa por um “transbordamento rapsódico” ela mostra seus principais traços por um “gosto pela miscelânea, pela pluralidade, pela heterogeneidade, pela inversão dos gêneros e das vozes, por uma coralidade” e que “não basta dizer coisas novas, é preciso, também, dizê-las de outras formas” – o estudo de Sarrazac se propõe principalmente na dramaturgia escrita mas o diretor potencializa essa teoria em forma de encenação.
O texto é a Ata do 43° Conselho de Segurança Nacional, que é pública e está disponível ao público. Ela foi liberada em 2009, mais de quarenta anos após a reunião que instaurou o Ato Institucional número 5 no país. Os artistas envolvidos leram a Ata do Conselho de Segurança Nacional do dia 13 de dezembro de 1968 – duas horas de leitura agonizantes. Sabiam que lá estavam palavras realmente ditas – não era uma ficção – e que aqueles homens mudaram os rumos da história do Brasil. Fazer uma cópia exata daquela reunião, trazer uma proximidade com os áudios que tivemos acesso não bastava – era necessário retomar a história. Quando isso é feito de maneira fictícia, ela se tornou farsesca.
Precisávamos de signos cênicos, precisávamos transformar a reunião não em peça museológica , mas pôr em cheque o que acontece no nosso presente. Não era intenção criar uma obra de metáfora universal, que correspondesse a qualquer ditadura. A peça nasce da necessidade de falar sobre o que estamos vivendo no Brasil hoje.
O primeiro signo encontrado foi o sangue. Ele é símbolo de todos os que foram assassinados no passado, mas também das mortes atuais – consequência de ações das figuras no poder, ao assinarem suas leis, seus atos, suas reformas. O sangue deveria escorrer dessa mesa e chegar aos pés do público…
Outros signos foram descobertos durante as temporadas: patos, panelas, a revista Veja, entre outros – elementos que fazem pontes diretas com nosso contexto e reforçam a ideia de que o espetáculo existe para dialogar com os nossos tempos. Temos material renovado diariamente pelas notícias que saem em tempo real pela mídia. Os donos do Poder com suas ações patéticas e terríveis nos dão possibilidades de criar essas pontes com intensidade.
FICHA TÉCNICA
Concepção e Direção: Paulo Maeda
Assistente de Direção: Thammy Alonso
Personagens e Elenco:
Artur da Costa e Silva – RicardoSocalschi
Pedro Aleixo – Paulo Goya
Augusto Rademaker – Fábio Viecelli
Lira Tavares – André Castellani
Magalhães Pinto – Rogério Fraulo
Delfim Netto – Francisco Damasceno
Mario Andreazza – Lucas Scandura
Ivo Arzua – André Pastore
Jarbas Passarinho – Thiago Meiron
Tavares Miranda – Thales Alves
Márcio de Souza e Mello – Gero Santana
Tarso Dutra – Caio Marinho
Costa Cavalcanti – Wilson Saraiva
Albuquerque Lima – Pedro Felício
Hélio Beltrão – Rafael Castro
Carlos Simas – Ramon Gustaff
Emílio Médici – Emerson Grotti
Orlando Geisel – Thiago Marques
Adalberto de Barros Nunes – Lucas Scandura
Adalberto Pereira dos Santos – Lucas Scandura
Carlos Huet Sampaio – Lucas Scandura
Rondon Pacheco – Roberto Mello
Jayme Portella de Mello – Áudio Original
Gama e Silva – Mario Spatizziani
Mocinha (ou a Testemunha Sufocada) – Thammy Alonso
Voz de Márcio Moreira Alves – Ronaldo
Serruya
Atores em Stand by – André Hendges,
Jonatã Puente, Rui Condeixa Xavier,
Heitor Gomes, Cristiano Alfer e
Marcelo Coutello.
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