Um mexicano fotografa China de concreto

Prédios de Sze parecem nascer como plantas, um atrás do outro. Estabelecem falta de saída, sugerindo isolamento espacial sem fim

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Por Luciana Cavalcanti, do blog Fotograficaminhamente

Sze Tsung Leong!!! Conheci este mexicano de 41 anos – sim, mexicano – numa das aulas deFotografia e História do professor Boris Kossoy, em meio a uma discussão sobre a temática da urbanização no Brasil no início do século XX. Fui apresentada à obra dele pela também fotógrafa e professora Anuschka Lemos – eis que me surge ao olhos o livro publicado por Sze em 2006 o “History Images“.

Avassalador!! Ele foi à China, sem falar a língua do país e documentou a falta de preocupação com o patrimônio histórico e natural e com a memória do espaço público, mostrando assim o crescente processo de destruição do lugares históricos daquelas cidades chinesas. Uma avalanche de paredões de concreto imensos – promovida pelas altas edificações – e uma ausência humana desoladora nas imagens. Sze chama todo este processo de “apagamento do passado“. Imagens inebriantes! A rapidez com que a China muda sua estrutura de planejamento urbano é o que mais impressiona Sze. E ainda – segundo ele – a história como forma urbana para aquele país é vista como “empecilho à modernização“.

Em entrevista à revista latina on line de arte e política Guernica – maravilhosa, por sinal – Sze traça suas coordenadas de trabalho e seus objetivos. Vale muito ler!! No livro publicado, há o prefácio do fotógrafo e professor norte-americano Stephen Shore, que concedeu uma palestra em setembro último aqui em São Paulo, no MIS organizada pelo SP PhotoFest. Vale ver o vídeo com o trabalho e falas de Stephen Shore – “American Beauty“.Este fotógrafo, também como Sze, discute a perspectiva e implicações da relação humana com os seus espaços.

Sabe-se que o tema da urbanização aliada à modernização é algo recorrente em vários estudos antropológicos, na história da arquitetura, na sociologia e na fotografia. Em relação à fotografia, leia-se o pertinente estudo de Helouise Costa e de Renato Rodrigues da Silva em seu livro “Fotografia Moderna no Brasil“, onde é inserida a seguinte citação de Wilson Coutinho – “Atget, um clássico da fotografia moderna“, Jornal do Brasil, 8 de abril de 1984.

A destruição da cidade incomodou os amantes de Paris como os homens do patrimônio. A lei oferecia francos a quem fotografasse algum aspecto da rua de Paris, seus monumentos e logradouros, alguns que seriam devorados pela reforma urbana de Napoleão III, fotos estas que eram compradas pela municipalidade. Outro comércio era a própria adoração de Paris, havendo um mercado de colecionadores que se dedicavam a possuir em 18×24 cm, tamanho das fotos da época, pedaços da velha cidade que estava prestes a desaparecer“.

Era a construção dos boulevards na Paris que odiou a construção da Torre Eiffel e da pirâmide do Museu do Louvre…

Num clima aparentemente frio, ausente, os prédios mostrados por Sze parecem nascer como plantas, um atrás do outro. Estabelecem uma falta de saída, adotando o isolamento espacial sem fim. O horizonte é o aperto, a quantidade de conjuntos habitacionais e a destruição do antigo, ou do nem tanto antigo assim, que nem teve tempo para se categorizar como tal. Um trabalho que suscita discussões contemporâneas sobre qual o lugar do homem e como ele ocupa este espaço neste planeta. E enfim… Tantas outras discussões.

E pensar que no período de transição de regimes de governo no Brasil no início do século XX, a modernização e a urbanização eram as palavras mais do que faladas e ouvidas na sociedade da época – vale lembrar que ainda o são até hoje e continuam possuindo a “adjetivação qualitativa de progresso” dada ao seu uso. As edificações construídas no período imperial envergonhavam o povo brasileiro. A ordem era, derrubar tudo e construir o que tivesse cara de República. Provavelmente, Sze Tsung Leong também iria ficar chocado se vivesse àquela época ou hoje em dia aqui nas grandes cidades do nosso país…

Luciana Cavalcanti é fotojornalista e graduada em Jornalismo pela UFPE, com especialização em Direitos Humanos pela UnB. Participa, juntamente com Fernando Martinho e Stefan Schmeling, do Coletivo Paralaxis.

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