Palestina, até 1948: exercício contra o esquecimento

Livro recolhe fotografias da vida cotidiana e mostra sociedade dinâmica e diversa, antes da expulsão de seus habitantes para criação de Israel

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Funcionários do departamento da alfândega em Haifa. Shafika Sa’ad, no centro, com blusa de bolinhas, e as duas mulheres à esq. na primeira fila são judias. 1940-1942

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Um livro recolhe fotografias da vida cotidiana e mostra sociedade dinâmica e diversa, antes da expulsão de seus habitantes para criação de Israel. Imagens desmentem ideia de um “território vazio”

Por Olga Rodriguez | Tradução: Inês Castilho

Um livro que reivindica a memória palestina, como afirma seu próprio título: “Contra o esquecimento. Uma memória fotográfica da Palestina antes da Nakba, 1889-1948” (1)

O projeto, coordenado por Teresa Aranguren, Sandra Barrilaro, Johnny Mansour e Bichara Khader, com prólogo do arabista Pedro Matínez Montávez, mostra uma realidade negada com demasiada frequência: a existência da Palestina não como abstração, mas como uma sociedade, cultura e território que foi ocupado e usurpado por colonos.

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Soldados britânicos revistam moradores de Yafa em busca de armas durante as revoltas de 1936 contra o mandato britânico e o movimento sionista

Nas palavras da jornalista Teresa Aranguren, boa conhecedora da região, “negar a existência do povo da Palestina foi premissa fundamental do movimento sionista, que pretendeu não apenas ocultar sua existência, mas até mesmo a lembrança de que havia existido”. Porém o que existe deixa rastro, e este livro recompila parte dessa memória que constata a existência, antes da ocupação, de centenas de milhares de palestinos que foram expulsos de suas terras em 1948.

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Grupo de patrulheiros, fotografía pertencente à família Saqqa, da cidade palestina de Belem.

As fotografias mostram o povo palestino, sua vida cotidiana, assim como aldeias que foram destruídas pelos ocupantes e cujos nomes já não figuram no mapa. “Este livro recolhe fotografias que são pegadas daquela existência que se quis apagar. Não é um exercício de nostalgia, mas de afirmação”, observa Aranguren.

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Retrato de Alexia Khoudry, que integra o álbum familiar dos Midawar, tirado en 1930

As fotos incluem desde as greves palestinas contra o mandato britânico e o sionismo até cenas familiares de costumes da época, passando pelas integrantes do Primeiro Congresso das Mulheres Árabes da Palestina,  que se mobilizaram contra a Declaração de Balfour (1917), a qual contemplava a criação de um Lar Nacional Judaico na Palestina.

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Grupo de amigos durante excursão ao lago Tiberiades, tirada entre 1940 e 1942

O acesso a uma parte das fotos foi facilitado pelo professor e historiador palestino Johnny Mansour, procedente da cidade de Haifa, o qual explica no livro que os habitantes palestinos de Haifa “foram obrigados a expatriar-se em 1948 sem contemplação e com procedimentos muito selvagens, de tal forma que de seus 75 mil habitantes palestinos não ficaram mais que 3 mil”.

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Poda de oliveiras na Palestina, foto tirada entre 1934 e 1939

Outras imagens foram recompiladas por Teresa Aranguren e Sandra Barrilaro, que viajaram aos territórios palestinos ocupados e recolheram fotos de familiares de seus amigos e conhecidos em diversas cidades e povoados. Outras ainda pertencem ao arquivo fotográfico do hotel American Colony de Jerusalém, conhecido como Coleção Matson, com mais de 22 mil negativos e placas de vidro.

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Primeiro time de futebol de Belém, em 1932, do álbum da familia Saqqa

As fotos incluem retratos de celebridades, acontecimentos sociais e políticos, festas populares, fábricas, profissões. O livro recolhe também trechos da carta enviada ao primeiro ministro britânico Winston Churchill pela delegação árabe que viajou a Londres para opor-se à declaração de Balfour em 1921, que afirmava:

“O grave e crescente mal-estar entre a população palestina provém de sua convicção absoluta de que a atual política do governo britânico se propõe a expulsá-la de seu país com o objetivo de convertê-lo em um Estado nacional para os imigrantes judeus… A Declaração Balfour foi feita sem consultar-nos e não podemos aceitar que decida nosso destino…”.

A ocupação da Palestina e a expulsão de sua gente já era uma crônica anunciada nos anos vinte. Duas décadas depois, a Segunda Guerra Mundial e o Holocausto contribuíram para torná-la realidade. Suas consequências seguem sendo sofridas e ampliadas em pleno século XXI.

(1) Ediciones del Oriente y del Mediterráneo.

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2 comentários para "Palestina, até 1948: exercício contra o esquecimento"

  1. Depois dizem que o águia de aia foi o grande incentivador da criação do estado de Israel, o Brasil tem culpa na violência que lá se estabeleceu

  2. liane chipollino aseff disse:

    Grande publicação! Por favor,como faço para comprar um exemplar no Brasil?

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