O declínio do império (financeiro) americano

À medida em que cresce risco de calote imediato, desgasta-se condição dos EUA como grande centro financeiro do mundo

 

À medida em que cresce risco de calote imediato,  desgasta-se condição dos EUA como grande centro financeiro do mundo

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Por Antonio Martins

As crises ensinam. Até ontem à noite, os políticos norte-americanos continuavam incapazes de chegar a um acordo sobre a ampliação da dívida do país — única forma de evitar, a partir de 2 de agosto, um colapso múltiplo dos serviços públicos e, talvez, um calote contra os credores do país. Por suas consequências devastadoras, sobre toda a economia mundial, tal desfecho é, ainda, improvável. Mas um texto das jornalistas Julie Creswell e Louise Story, publicado semana passada no New York Times debate as consequências de longo prazo da crise destas semanas. A leitura sugere que o papel de que os Estados Unidos se beneficiaram desde o final da II Guerra — o de grande centro financeiro global — sofrerá grande desgaste.

Julie e Louise apuraram que surgiu pela primeira vez, no universo dos mega-investidores em papéis norte-americanos — Tesouros de dezenas de países, corporações transnacionais, grandes instituições financeiras — a noção de que também os Estados Unidos podem ficar sem condições de honrar sua dívida. Tanto pelo crescimento exponencial dos débitos, quanto, como sugere o episódio atual, por decisão ou mesmo paralisia política.

Tal compreensão pode rompe uma crença e um comportamento mantidos durante décadas. Como o dólar era a moeda aceita internacionalmente, pensou-se que seu emissor nunca se tornaria inadimplente. Comprar títulos do Tesouro norte-americano foi sempre considerado a opção mais segura, para investidores interessados em manter seus recursos protegidos. Por isso, os Estados Unidos foram, durante longos períodos, financiados pelo resto do mundo. Mantiveram comércio externo altamente deficitário porque, num certo sentido, bastava-lhes imprimir dinheiro. Como nenhuma outra moeda ameaçou, neste período, seu papel, os grandes investidores simplesmente não tinha outra opção, exceto continuar financiando os EUA.

O risco real de um calote está levando os gestores dos Tesouros, corporações e bancos credores dos EUA a rever, pela primeira vez, esta opção. No momento, é apenas uma consideração teórica, inclusive porque não há alternativas. Mas o que a matéria do New York Times revela é que, mesmo após superado o impasse entre democratas e republicanos, a situação nunca será a mesma. A ficha começou a cair.

Um calote do Tesouro dos EUA seria desastroso para todos. Ele tornaria insolventes outros bancos, empresas e países, com provável efeito-dominó em plano mundial. Lançaria dúvida generalizada sobre algo essencial na economia: a crença que cada parte precisa ter na capacidade de pagamento da outra, em qualquer operação econômica (da fusão entre duas grandes companhias à compra de um computador ou ao depósito em um banco). Por isso, não vale a pena torcer pela quebra. Mas será cada vez mais importante desmistificar o papel financeiro dos Estados Unidos, e buscar alternativas a ele…

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6 comentários para "O declínio do império (financeiro) americano"

  1. Milton Guedes Guimaraes disse:

    O EUA foi beneficiado durante décadas por obra e graças às duas grandes guerras mundiais. Teve uma participação pífia em ambas, mas ganhou prestigio e muito dinheiro comas mesmas. Ganhou bilhões de dólares vendendo de tudo aos beligerantes. Ficou rico e poderoso. No final da II Guerra, possuía 70% da riqueza doo mundo.
    Impôs ao mundo o acordo de Bretton Woods, que colocava o EUA como o big boss do mundo financeiro. Pois o “padrão ouro” já não servia aos seus interesses. Foi o EUA perdendo o seu poderio industrial e com isso o poderia econômico-financeiro. De grande exportador e de bens duráveis, tornou-se importador e aí o déficit começou a rondar suas finanças. Veio às guerras, gastava bilhões sem nenhum retorno, a não ser para grandes corporações de material bélico.
    Por fim, começo a aparecerem as “bolhas” que não era senão o primeiro sinal do desespero do capitalismo inoperante e especulador. Enfim, chega-se a uma situação critica. Creio que o começo do fim de uma era “made USA”.

  2. Joseh Brito disse:

    Era apenas uma questão de tempo, o que vemos hoje acontecer.
    Não é de se esperar que esse modelo se perpetue ad infinitum. Algum dia essa “pirâmide” há que desabar.
    O István Mészáros já vem alertando que essa crise diferentemente de todas as anteriores que foram conjunturais (incluindo a de 1929), e portanto passíveis de ajustes sem perda da identidade do sistema, essa é claramente ESTRUTURAL.
    A discussão de ampliação do limite de dívida americana não é solução, é apenas “empurrar” o problema “com a barriga”.

  3. Favor criticar.
    Abs.
    Paulo Guioto Ribeiro.

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