Galápagos, os sortilégios da solidão

A partir de encontro casual, em balcão de bar, tragicomédia trata dos labirintos da incomunicabilidade de vidas sem perspectiva, em meio à crise existencial contemporânea

151106_Galápagos

.

A partir de encontro casual, em balcão de bar, tragicomédia em cartaz no Rio trata dos labirintos da incomunicabilidade de vidas sem perspectiva, em meio à crise existencial contemporânea

Por Wagner Correa de Araujo | Imagem: Dalton Valério

___

Galápagos está em cartaz no Rio de Janeiro, no Teatro Gláucio Gil, Copacabana (mapa) – Metrô Cardeal Arcoverde.

Quintas e sextas, às 20h. Até o dia 13 de novembro

Fone: (21) 2332 7904. Duração: 70 minutos

___

Mobilizados pela ideia de penetrar no denso labirinto dos conflitos da solidão e da incomunicabilidade humana, a partir do universo teatral de Edward Albee e Harold Pinter, os atores Paulo Giannini e Kadu Garcia comissionaram-na ao sólido pensar dramatúrgico de Renata Mizrahi.

Galápagos aparece, assim, como um texto singular nas suas incursões autorais, em seu direcionamento de incisiva interiorização e de uma simbologia fronteiriça à crise existencial da contemporaneidade. E que encontra na audaciosa inquietação cênica de Isabel Cavalcanti o comando inventivo ideal à proposta.

Dois homens, de destino e cotidiano absolutamente opostos, se encontram, casualmente a princípio e rotineiramente a seguir, no balcão de um bar. O artista plástico Carlos (Paulo Giannini), separado, quase depressivo em seu isolamento, e um funcionário de uma multinacional, Vander (Kadu Garcia), casado mas escondendo seu lado nostálgico e infeliz, na falsa armadura de sua extroversão.

As incômodas tentativas de aproximação de Vander vão lentamente gerando quebras, que nunca se concretizam plenamente, na monossilábica postura de Carlos. E, aos poucos, vai se descortinando um abstrato clima de seres perdidos numa ilha ancestral (a possível referência subjetiva a Galápagos, território dos confins equatoriais), numa patética atitude autoexplicativa de que, num naufrágio, quem está só é mais fácil de ser ajudado.

A magia do espetáculo está neste incessante ir e vir, físico e psicológico, dos personagens. Na insistência da provocação de encontros e retornos entre dois seres, submersos nas tentativas de fuga da frustração de vidas sem perspectivas.

O domínio técnico e estético da linguagem teatral é alcançado pela direção no dimensionamento interpretativo de uma dupla de atores, de incrível credibilidade e força.

A cenografia (Aurora dos Campos) atende à funcionalidade do que se pretende, aliada ao recato dos figurinos (Bruno Perlatto), em que luzes (Renato Machado), entre sombras, acentuam as nuances sensíveis daqueles confrontos coloquiais.

Incluindo, ainda, a trilha sonora meticulosamente arquitetada pela habitual competência de Felipe Storino. Fluindo das incidentais e misteriosas interferências da voz impecável de Simone Mazzer e criando, na plateia, a sensorial ilusão de sua presença física.

Não por acaso essa tragicomédia foi vencedora da última edição do Prêmio Shell, pois, além de se consolidar como refinado texto, alcança todas as modulações de poético e irônico humor nessa sua elaborada concepção cênica.

Capaz também de reflexionar, em sua risível acidez, a constatação premonitória do romantismo literário de Lord Byron ecoando nas teorizações do teatro do absurdo: “Na solidão é quando estamos menos sós”.

Leia Também:

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *