Brasil: por outra política de drogas

Chega de guerra: queremos saúde, informação, direito ao próprio corpo, autonomia e liberdade, diz manifesto articulado pela Marcha da Maconha

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Imagem: Henri Matisse, Cabeça de Laurette com xícara de café (detalhe)

Sobre o tema: 

> Para assinar o manifesto, individualmente ou em nome de grupos, movimentos e entidades, escreva para [email protected]

> Para acompanhar e participar da construção da marcha, este ano (37 cidades já inscritas), visite www.marchadamaconha.org

O debate está em jornais, revistas, redes de televisão. Tomou  ruas,  internet, livros, personalidades, políticos e campanhas eleitorais. Ganhou espaço e consistência que mostram cada vez mais a falência da política proibicionista em termos humanos, de segurança, de direitos, liberdades e saúde pública. O Brasil se tornou um dos mais sangrentos campos de batalha da guerra às drogas, um sistema racista, antigo e ineficiente para lidar como uma questão complexa e urgente. Uma lei que redunda em morte e gastos públicos elevados e de nenhuma forma ataca o consumo entre jovens e adultos, muito menos o abuso: apenas desloca-o para uma esfera ainda mais intocável.

O consumo de substâncias alteradoras de consciência é milenar, está imbricado com a própria evolução da humanidade. A tentativa recente de coerção a este hábito, às vezes nocivo à saúde  às vezes não, não só é comprovademente um fracasso como traz em si uma série de efeitos nefastos e que devem preocupar a qualquer um que deseja um mundo menos injusto.

Da mesma forma que uma caneta pode escrever lindos poemas ou perfurar uma jugular, os efeitos das diferentes drogas, com suas diferentes culturas de uso, dependem de seu uso. Assim, ao mesmo tempo em que não cabe demonizá-las a priori, como se fossem dotadas de propriedades metafísicas, tampouco é sensato endeusá-las, acreditar que elas por si sejam transformadoras, revolucionárias ou coisa que o valha. Não defendemos que o uso de drogas traga um mundo melhor, mas não deixamos de ver o evidente: a proibição do consumo de algumas delas torna o mundo muito pior.

Você se importa com o encarceramento em massa? O Brasil já é o terceiro país que mais prende seus cidadãos no mundo, atrás apenas de EUA e China, e dos cerca de 500 mil detidos no país praticamente um quarto deles está nesta situação desumana por conta de crimes relacionados a drogas.

Você se importa com o racismo e a criminalização da pobreza?  A origem da proibição da maconha, e de outras drogas, está altamente conectada com discursos e práticas racistas e xenófobas, em todo o mundo. No Brasil, a primeira lei que criminalizou a maconha tinha como alvo a população negra do Rio de Janeiro, e hoje a maior parte dos afetados pela guerra às drogas tem pele escura e baixas condições econômicas. Enquanto ricos e classe média são identificados como usuários, o pobre é sempre o traficante, com a guerra às drogas servindo como instrumento estatal de segregação e controle social de populações desfavorecidas.

Você se importa com o sofrimento humano e com o avanço da ciência? A proibição das drogas não só impede tratamento efetivo, de qualidade e público aos que fazem uso abusivo como freia também o desenvolvimento da ciência, que pode ter muitos ganhos com as pesquisas sobre psicotrópicos em geral. Já foi provado cientificamente o valor medicinal da cannabis – e de outras drogas transformadas em “tabu” – no tratamento de diversas enfermidades que sofremos, aliviando seus sintomas e preparando a cura: câncer, AIDS, Mal de Parkinson, depressão, ansiedade, enxaqueca e a lista não para de crescer.

Você se importa com informação de qualidade e prevenção ao uso abusivo? Você se importa com direitos civis e liberdades individuais? Você se importa com a situação da mulher e o encarceramento feminino no Brasil?  Você se importa com a corrupção? Você se importa com guerras e conflitos armados ao redor do mundo? Você se importa com a colonização da política e da vida empreendida pelas indústrias armamentista e farmacêutica?

Chegou a hora de ver que isso não interessa só a meia dúzia de maconheiros, chegou a hora de parar de estigmatizar este debate. Chegou a hora de encarar os fatos, olhar nos olhos da realidade e ver que como está não pode ficar. A luta contra o proibicionismo quer colocar seus ombros ao lado de todos que lutam por outro mundo, assim como convidar aqueles e aquelas que dizem um basta à injustiça e à opressão a participar de nossa caminhada. Afinal, quando uma luta avança, nenhuma outra retrocede.

Basta de racismo, moralismo, violência, corrupção e proibição. Queremos o direito à saúde, à informação, ao próprio corpo, à autonomia, à liberdade: é tempo de uma nova política de drogas para o Brasil.

Assinam (até 12/5/2012):

Marcha da Maconha São Paulo

ABESUP – Associação Brasileira de Estudos Sobre Psicoativos

Amparar – Associação de Amigos e Familiares de Presos

ANEL – Assembleia Nacional dos Estudantes Livre

Autônomos & Autônomas Futebol Clube

Bando o texto perdeu-se e o bacalhau também – Grupo de teatro

Bloco Planta na Mente – Rio de Janeiro

Brasil Pelas Florestas

Casa Mafalda

CEDECA Interlagos

Centro de Mídia Independente – CMI/SP

CFP – Conselho Federal de Psicologia

Centro Acadêmico Benevides Paixão – PUC-SP

Centro Acadêmico Ruy Barbosa – EEFE-USP

Cineclube Bordel Sem Paredes

Coletivo Acorda – Diadema

Coletivo Antiproibicionista Cultura Verde

Coletivo CannaCerrado

Coletivo Cultivando uma Ideia – Viçosa (MG)

Coletivo DAR – Desentorpecendo a Razão

Coletivo Feminista Três Rosas

Coletivo Feminista Yabá

Coletivo Plantando Consciência

Coletivo Plantando Informação

Coletivo Revolução Verde

Coletivo Semeando

Coletivo Sem Paredes

Coletivo Tomando o Céu de Assalto

Comitê Nacional pela Legalização do Cânhamo – Plantando a Paz – Curitiba

Construção Coletiva

Enecos – Executiva Nacional dos Estudantes de Comunicação Social

Fened – Federação Nacional dos Estudantes de Direito

Fora do Eixo

Fórum Mineiro de Saúde Mental

Frente Estadual Antimanicomial/ SP

FUMA – Frente Uspiana de Mobilização Antiproibicionista

Growroom

Hempadão – Laricas de informação

Instituto da Cannabis

Instituto Práxis de Direitos Humanos

Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social

Matilha Cultural

Marcha da Maconha ABC

Marcha da Maconha Blumenau

Marcha da Maconha Fortaleza

Marcha da Maconha Florianópolis

Marcha da Maconha João Pessoa

Marcha da Maconha Juiz de Fora

Marcha da Maconha Niterói

Marcha da Maconha Rio Grande do Norte – Coletivo Potiguar

Marcha da Maconha Viçosa

Movimento Nacional da População de Rua

Movimento Passe Livre – MPL-SP

Movimento Para Todos

MTST – Movimento dos Trabalhadores Sem Teto

NEIP – Núcleo de Estudos Interdisciplinares sobre Psicoativos

ONG Centro de Convivência É de Lei

ONG Plantando Consciência

Outras Palavras

PSTU – Partido Socialista dos Trabalhadores Unificado

Princípio Ativo – Coletivo Antiproibicionista de Porto Alegre

Projeto Vozes Insurgentes Ressignificando Universos Sofistas (VIRUS) – RN

Psicotropicus-Centro Brasileiro de Politica de Drogas

Rede Nacional Internúcleos da Luta Antimanicomial

Rede Pernambucana de Redução de Danos

Tribunal Popular – O Estado brasileiro no banco dos réus

União de Mulheres de São Paulo

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2 comentários para "Brasil: por outra política de drogas"

  1. contra o discurso proibicionista dentro dos CAPS!

  2. Zenia Chaves disse:

    Muito lucido, concordo plenamente. Até a ONU já tem relatório que condena o proibicionismo e propõe novas formas de lidar com as drogas.

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