O romance fantástico de Marcos Peres

Vencedor do Prêmio SESC de Literatura comenta seu livro, “O Evangelho segundo Hitler”, revela admiração por obra de Umberto Eco e vê em Maringá-PR possível polo literário no Brasil

Por Rafael Zanatta, em seu blog E-mancipação

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Vencedor do Prêmio SESC de Literatura comenta seu livro, “O Evangelho segundo Hitler”, revela admiração por obra de Umberto Eco e vê em Maringá-PR possível polo literário no Brasil

Por Rafael Zanatta, em seu blog E-mancipação

Em 2010, em um texto sobre a produção literária maringaense publicado no site do projeto Contos Maringaenses, escrevi que Marcos Peres era “um escritor do fantástico em ascensão”. Nos últimos três anos, Peres tem sido responsável por criativas histórias publicadas no Contos. Alguns desses contos foram republicados em sites de cultura independente, como o Nego Dito. Seus textos, porém, têm circulado apenas entre um pequeno círculo intelectual de Maringá e região, formado por escritores e críticos da pacata Space City (utilizando aqui a expressão do Nelson Alexandre, um dos nomes fortes do norte do Paraná). De fato, há toda uma produção literária alternativa circulando por meios virtuais e físicos, afastada dos veículos editoriais tradicionais.

Entretanto, esse perfil underground de Marcos Peres indubitavelmente vai mudar. Nessa semana, ele foi contemplado com o Prêmio Sesc de Literatura, na categoria melhor romance. Dentre os 37 finalistas, a obra O Evangelho Segundo Hitler foi considerada a mais criativa e estimulante, arrebatando a premiação nacional. Como resultado da premiação, o livro será publicado pela Editora Record. Em muito breve, os leitores brasileiros terão o prazer de conhecer o estilo de escrita do jovem Peres.
A notícia do prêmio do Sesc foi divulgada pelo crítico literário José Flauzino Alves, que, além de revisar o manuscrito de O Evangelho Segundo Hitler, também analisou os originais de Nihonjin, de Oskar Nakasato, vencedor do prêmio Jabuti de 2012. Na noite de sábado (16/03), Flauzino – um crítico que tem acompanhado de perto os escritores do Contos Maringaenses – escreveu: “Honradamente, o prêmio é merecido pelo Marcos. Dono de uma imaginação prodigiosa, dá-nos uma trama inteligente. O livro surpreende. E mais: o cara nem 30 anos tem. Está só começando. Sua literatura há de amadurecer”.
Os elogios de Flauzino não são exagerados. A imaginação de Marcos é realmente prodigiosa. Aliás, o título do livro premiado é genial. Quem não ficaria curioso com o conteúdo de um livro com o título O Evangelho Segundo Hitler? A obra de Marcos Peres, entretanto, não possui semelhança com a polêmica publicação de José Saramago. O livro homenageia os escritores que brincam com elementos fantásticos, como Umberto Eco e Jorge Luis Borges, através de uma trama embevecida em teorias conspiratórias que une dois personagens contemporâneos.
Entrevistei o escritor Marcos Peres pela internet nesta noite de sábado. Neste breve bate-papo, ele responde algumas questões sobre suas influências, sobre o livro premiado e sobre a produção literária de Maringá. A conversa mostra a honestidade intelectual de Peres e seu sentimento de gratidão com a criação colaborativa proporcionada pela literatura.
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Rafael Zanatta: Você foi contemplado com o Prêmio Sesc Literatura 2013 pelo romance O Evangelho Segundo Hitler, que será publicado ainda este ano. No que consiste essa obra? De que modo você a descreveria?
Marcos Peres: “Evangelho” e “Hitler” são palavras fortes e de difícil associação. O livro conta a história de dois contemporâneos, Jorge Luis Borges, um dos maiores escritores argentinos de todos os tempos, e Adolf Hitler. Conta a história de um plano miraculoso que acaba ligando os dois, uma teoria da conspiração improvável que possa unir dois personagens tão distintos. Mas ao contrário de tantos livros que se debruçam sobre teorias da conspiração, busquei incitar o leitor a pensar de maneira crítica sobre tal plano. Não tenho interesse em ser um vendedor de teorias absurdas, no melhor estilo Dan Brown. Construí um plano para depois afirmar: “vejam como é absurdo! Por mais que faça sentido, não existe!” Meu livro é, em síntese, um romance do Dan Brown com o vetor em sentido contrário.
Rafael Zanatta: Essa linha crítica à conspiração browniana é presente em outros contos seus. Essa é uma temática predominante na sua escrita? Por quê?
Marcos Peres: Além do Borges, além do Guimarães Rosa, do Machado e de tantos outros, sou um admirador do Umberto Eco. Li seu Pêndulo de Foucault com 15 anos. Desde então, é minha bíblia sobre teorias da conspiração e ocultismos em geral. O Pêndulo de Foucault é uma crítica aos livros sobre teorias conspiratórias que pululam no mercado. O Pêndulo é uma crítica – antecipada – ao Dan Brown. Não por acaso, Eco em determinada entrevista afirmou que Brown parece um personagem inventado por ele. Eco constrói um livro e constrói uma teoria só para derrubá-la após e mostrar a importância do leitor crítico. É um livro que me impressiona há muito tempo. O Evangelho é, portanto, uma pequena e singela homenagem a este mestre. E também ao grande maestro Jorge Luis Borges.
Rafael Zanatta: Em 2010, escrevi que você era um “escritor do fantástico em ascensão”. Você concorda com essa descrição? Qual a importância do fantástico?
Marcos Peres: Lembro desta denominação! Mais ou menos na mesma época em que publicou em seu blog um conto meu – de índole fantástica – que se passava em Curitiba. O elemento “fantástico” pode ser associado com diversas coisas. O metafísico fantástico de Borges, o fantástico aliado à burocracia e a paciência kafkiana. O realismo fantástico de Márquez. Acho importante o elemento fantástico na literatura. Ele nos mostra uma realidade rica e – mesmo que soe como paradoxo – verossímil. Não sei se sou um escritor “do fantástico”. Sou só um jovem grato por ter se perdido e se encontrado em tantos espelhos, em tantas metafísicas, em tantas mitologias. Sou apenas um leitor grato. Só.
Rafael Zanatta: O crítico José Flauzino afirmou que Maringá talvez seja um celeiro de bons escritores. Oscar Nakasato levou o Jabuti em 2012 com Nihonjin. Nelson Alexandre lançou Paridos e Rejeitados. E agora vem você. Qual sua opinião sobre a literatura maringaense? Há, de fato, um momento especial?
Marcos Peres: Há! Maringá está se mostrando um verdadeiro celeiro literário. Além do Oscar, do Nelson, que são meus grandes amigos, ainda há o Laurentino Gomes e o Nailor, que estão no mainstream. E, durante todo o tempo que estive envolvido no projeto Contos Maringaenses, tive a oportunidade e felicidade de ler maringaenses muito talentosos. Maringá tem tudo pra se tornar um centro de referência na literatura brasileira.
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