Oriente Médio: Bahrain expõe as intenções de Washington

bahrein Estados Unidos mantêm silêncio sobre repressão no Bahrein

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Apesar de mortes, tortura e ataques à imprensa, chefe do Pentágono reafirma apoio à monarquia. Postura desacredita discurso em favor dos direitos humanos e pode aprofundar desprestígio dos EUA na região. Por Jim Lobe, na Envolverde-IPS

Se o presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, quer ficar do “lado certo da história” durante a atual Primavera Árabe, sua reação diante da situação no Bahrain não é a mais adequada, afirmam analistas e comentaristas políticos em Washington. Seu governo condenou abertamente a repressão na Síria e no Iêmen – sem mencionar a Líbia, onde Obama pediu diretamente uma mudança de regime –, mas permanece reservada no caso das duras medidas aplicadas pela monarquia sunita do Bahrain contra a maioria xiita e destacadas figuras pró-democracia.

As únicas críticas chegaram após várias semanas pela boca da secretária de Estado, Hillary Clinton, que pediu, no dia 12, um “processo político” que defenda “os direitos e as aspirações de todos os cidadãos do Bahrein”. Hillary também disse que “a segurança por si só não pode resolver os desafios” enfrentados pela monarquia.

Mais de 20 pessoas morreram no Bahrain em mãos das forças de segurança desde que o governo declarou a lei marcial, em 15 de março, enquanto outras 400 foram presas ou estão desaparecidas, segundo grupos internacionais de direitos humanos. Três presos morreram sob custódia, ao menos um aparentemente por “horríveis abusos”, disse, no dia 12, a organização Human Rights Watch (HRW). Nos dias 9 e 10, a HRW acusou o regime de criar um “clima de medo”, particularmente em bairros e aldeias xiitas onde são feitas blitze noturnas, ao que parece visando levar medo aos moradores, em sua maioria pobres.

Médicos, advogados e ativistas pelos direitos humanos não se livraram da repressão. A imprensa crítica ao governo foi silenciada, blogueiros detidos, jornalistas locais levados a julgamento e repórteres estrangeiros deportados. Inclusive astros do futebol foram expulsos da equipe nacional e presos por participarem dos protestos pacíficos.

“As coisas pioraram, tanto em quantidade quanto em qualidade”, segundo Toby Jones, especialista em países do Golfo para a norte-americana Universidade Rutgers. “Parece que em todos os níveis – desde denúncias de torturas até informes de prisões em massa – o regime não só continua com a repressão como a intensificou. Embora a justiça diga que restaura a lei e a ordem, o que parece fazer é cometer vingança. Esta é a única forma de explicar a gravidade da situação”, acrescentou.

Entretanto, na Casa Branca prevalece o silêncio, o que, para muitos observadores, sugere que Obama concorda, ou até mesmo apoia, o que está acontecendo.

Esta impressão se fortaleceu quando o secretário da Defesa, Robert Gates, visitou a Arábia Saudita na semana passada em um aparente esforço para refazer os laços diplomáticos, afetados pelo apoio de Washington à expulsão do presidente egípcio Hosni Mubarak em fevereiro e sua oposição inicial ao envio, no dia 14 de março, de 1.500 soldados sauditas e dos emirados para Bahrein com a intenção de apoiar o regime do rei Hamad bin Isa al-Khalifa.

Após uma reunião com o rei Abdalah, da Arábia Saudita, Gates disse pela primeira vez “ter evidência de que os iranianos tentavam explorar a situação no Bahrain”. Esta declaração contrastou abertamente com sua rejeição, em sua última visita ao Golfo (três dias antes da adoção da lei marcial no Bahrain) às acusações de Riad e Manama de que Teerã estava por trás dos protestos xiitas.

Além disso, quando foi perguntado se conversara com o rei Abdalah sobre a presença de tropas sauditas em território do Bahrein, Gates respondeu com um seco “não”. O chefe do Pentágono também garantiu que Washington não tinha intenções de mudar sua base naval do Bahrain, sede da Quinta Frota dos EUA.

O silêncio de Washington sobre a repressão nesse país parece motivado por duas considerações estratégicas: manter sua base e outras instalações militares no pequeno reino e preservar as boas relações com a Arábia Saudita, que claramente vê os protestos pela democracia ali como parte de uma luta com o Irã pela hegemonia regional.

“O Bahrain é como Cuba para vocês”, disse o membro de uma delegação do Majlis al-Shura, o conselho de assessoria do rei saudita, que se reuniu com funcionários e especialistas norte-americanos em Washington na semana passada para explicar a postura de Riad na situação regional. “O Irã está usando os xiitas como uma ferramenta de política persa. As mais importantes instalações petrolíferas e petroquímicas na Arábia Saudita estão a 60 milhas do Bahrein. Não temos opção”, acrescentou.

Porém, o silêncio de Obama pode acabar sendo um tiro pela culatra em vários níveis, segundo analistas de Washington, que expressaram sua esperança de que a viagem desta semana de seu conselheiro de segurança nacional, Tom Donilon, para a Arábia Saudita e os Emirados Árabes Unidos, envie uma mensagem muito diferente da emitida pelos comentários de Gates na semana passada.

Se a repressão se intensificar, bloqueando qualquer possibilidade de uma significativa reforma política que dê parte do poder à população xiita (entre 60% e 70% dos habitantes do Bahrein), os protestos se radicalizarão, alertou o analista Toby Jones. “Não creio que já tenhamos passado do ponto de não retorno, onde a radicalização passe a ser permanente, mas não estamos longe”, disse à IPS. “A viagem de Donilon pode ser o momento oportuno para a Casa Branca ser mais insistente, mas a mensagem deve ser enviada de forma mais urgente do que agora”.

* O blog de Jim Lobe sobre política externa pode ser lido em www.lobelog.com.

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