Um pólo de cinema no sertão baiano?

Jovens da Bacia do Jacuípe, articulados num Ponto de Cultura, apropriam-se da linguagem cinematográfica para expressar sua realidade, cultura e visões de mundo

Por Lourivânia Soares, no EcoDebate

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Jovens da Bacia do Jacuípe, articulados num Ponto de Cultura, apropriam-se da linguagem cinematográfica para retratar sua realidade, cultura e visões de mundo

Por Lourivânia Soares, no EcoDebate

As manifestações culturais do sertão baiano, suas riquezas e diversidades, são as principais matérias primas para uma animada turma de jovens que têm apostado na sétima arte como forma de expressão. Trata-se dos alunos do Curso de Produção Audiovisual e do Núcleo de Produção Pensar Filmes, Ponto de Cultura localizado no município de Pintadas, Território da Bacia do Jacuípe. Desde 2010, estão sendo desenvolvidas diversas atividades formativas e experimentais na área audiovisual, além da produção de uma série de conteúdos que têm dado visibilidade à região de uma forma plural.

Dirigido pela Rede Pintadas, em parceria com a Companhia de Artes Cênicas Rheluz, o Pensar Filmes foi um dos Pontos de Cultura contemplados em um dos editais da Secretaria de Cultura do Estado da Bahia em 2008. Inicialmente, a proposta era para envolver apenas 40 participantes, jovens e adultos de 14 municípios da Bacia do Jacuípe, numa formação de três anos. Mas o êxito do projeto aumentou a demanda por vagas e fez com que ele fosse ampliado, além de conquistar novas parcerias para garantir a continuidade das ações. Além de aulas teóricas e práticas, os alunos aprendem técnicas de elaboração de vídeo, captação de imagens, roteiro, edição, linguagem cinematográfica, até a produção de vídeos. Em dezembro deste ano, a segunda turma de estudantes conclui os estudos, totalizando a formação de 66 jovens de diversos municípios da Bahia. Para 2013 novos recursos já estão garantidos, através de um novo edital de seleção da SECULT, que vai possibilitar a montagem de uma nova turma, além de um curso de aperfeiçoamento para os alunos egressos.

De acordo com Vandelson Gonçalves, um dos idealizadores do projeto, as ações do Pensar Filmes contribuíram para uma nova perspectiva de vida dos jovens envolvidos e para a construção de um novo olhar sobre si mesmo e sobre a sua história, sua cultura, sua região. “A inserção desses meninos e meninas permitiu a cada um deles a participação num espaço importante de reflexão, de aprendizado, de socialização, que foram ingredientes importantes para o empoderamento social e cultural”.

A ação do Pensar Filmes vem provando que é possível vencer as adversidades de uma região marcada pelos estereótipos da pobreza e do atraso, disseminado durante muitos anos sobre essa região do país. Durante esse período, foram produzidas diversas matérias jornalísticas, curtas metragens e conteúdos que exploram as potencialidades da região, ressaltando aspectos da cultura, da economia e as particularidades do Território, como o Samba de Roda, os festejos juninos, o esporte, o artesanato, as iniciativas de geração de emprego e renda. Ressalta-se ainda que o Pensar Filmes firmou parceria com a TV Educativa da Bahia (TVE), que possibilitou a transmissão de diversos conteúdos do Ponto de Cultura na sua programação. Um dos grandes marcos foi a cobertura dos festejos juninos de 10 municípios em 2010 e 2011. Todos os vídeos e informações sobre o projeto podem ser acessados no site www.pensarfilmes.com.

Pensar Filmes: um polo de cinema no sertão baiano

Jovens trilhando novos caminhos – Jorge Henrique Macedo de Almeida, 20 anos, é morador da comunidade de Campo de São João, no município de Várzea da Roça e participou da primeira turma de produção audiovisual do Pensar Filmes. “Quando tinha 16 anos e cursava o 3° ano de ensino médio, eu imaginava que para trabalhar com comunicação era necessário ir para capital, cursar faculdade e só poderia atuar numa cidade grande. Depois que iniciei o curso de Cinema e audiovisual, percebi que podemos produzir conteúdos de qualidade, aqui na nossa região e o melhor, sobre nós com o nosso olhar”, afirma.

Assim que acabou o curso, em junho de 2011, ele trabalhou na cobertura do São João da Bacia do Jacuípe, uma parceria com o Pensar Filmes e a TVE. De lá pra cá, vem realizando diversos trabalhos. “Atualmente estou montando minha produtora e produzindo material de forma independente. Aos poucos venho ganhando mercado, tendo como clientes prefeituras, ongs e sites, para os quais venho produzindo reportagens, documentários e vídeos institucionais”.

Jorge Henrique também tem contribuído com o debate do GT de Comunicação da Bacia do Jacuípe, coletivo que desde 2010 tem discutido alternativas para o fortalecimento das iniciativas de comunicação na região. Para 2013, ele tem como meta obter o registro profissional (DRT) e lança planos para o futuro como ingressar num curso superior em Comunicação Social. Aliás, o Pensar Filmes vem despertando vários jovens para a área, como as jovens Lanna Kelly dos Santos e Marta Mendes, ex-alunas do Pensar Filmes que após participarem da formação em audiovisual se decidiram pelo Curso de Comunicação e Produção Cultural da Universidade Federal da Bahia no qual já cursam o terceiro semestre.

Antecedentes – O movimento cultural tem como umas das protagonistas a Companhia de Artes Cênicas Rheluz, organização não governamental criada em 1998 por um grupo de jovens ligados à Pastoral da Juventude do Meio Popular, que encontrou nas linguagens artísticas um modo próprio de contestação dos problemas sociais e de intervenção política, oferecendo à comunidade também momentos de descontração e de reflexão sobre seus problemas. A primeira experiência na área audiovisual de Pintadas começou em 2000, com o Cine Móvel Rheluz, a partir de um projeto financiado pelo ProRenda Rural e a entidade alemã DED (Serviço Alemão de Cooperação Técnica). O equipamento foi instalado numa Kombi e percorria as comunidades rurais e área urbana do município, registrando o cotidiano da população, exibindo filmes e promovendo debates sobre os filmes exibidos. Posteriormente, o cinema móvel também começou a circular nos municípios circunvizinhos, a partir do Projeto de Semanas Culturais que a CIA Rheluz realizou nos municípios de Nova Fátima, Rio Real e Ribeira do Amparo, também apoiado pelas entidades mencionadas anteriormente.

Para Vandelson, o Pensar Filmes significa a concretização de um sonho iniciado naquela época e que agora contribui, de fato, para o desenvolvimento cultural da região. “O Pensar Filmes foi elemento essencial de um processo de articulação territorial, através da comunicação e da cultura, que fortalece a nossa identidade territorial, possibilitando que lancemos outro olhar sobre essa região”, destaca.

Em março do ano passado, a Companhia de Arte Cênicas Rheluz representou o Brasil num evento internacional realizado na Alemanha, a Semana Cultural SiebenGiebelhof. Uma comitiva de dez representantes foi ao país apresentar a experiência de Pintadas na área do teatro, dança, música, audiovisual e as manifestações populares do município.

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