Josué de Castro, 114: fome é decisão política dos ricos

Coletânea de artigos publicada pela Elefante em homenagem ao pernambucano revela: sua obra continua fundamental para o combate à desnutrição no Brasil – e oferece saídas. Quem apoia nosso jornalismo concorre a 2 exemplares

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Outras Palavras e Editora Elefante realizarão o sorteio de dois exemplares de Da fome à fome – diálogos com Josué de Castro, organizado por Tereza Campello e Ana Paula Bortoletto, entre os apoiadores do nosso jornalismo. O formulário será enviado por e-mail e as inscrições serão aceitas até a próxima terça-feira, 13/9, às 14h. Quem é Outros Quinhentos também tem 25% de desconto no site da editora.

Segundo a última pesquisa da Rede PENSSAN, 58,7% da população brasileira, cerca de 125 milhões de pessoas, convive com a insegurança alimentar em 2022. Dessas tantas, 33 milhões não têm nada para comer. Isto é, passam fome. Em meados do século XX, coube a um médico pernambucano, Josué de Castro, desvelar a verdade sobre a situação que se arrasta nessa terra há 500 anos: a fome no Brasil não caiu do céu e nem é consequência determinista de fatores ambientais ou culturais – é opção política de quem manda no país.

Foi o marco de 75 anos da publicação de seu Geografia da fome, comemorado no final do ano passado, que levou a Editora Elefante a firmar parceria com a Cátedra Josué de Castro da Faculdade de Saúde Pública da USP (FSP/USP) para lançar o livro Da fome à fome – diálogos com Josué de Castro.

No dia 5 de setembro, última segunda-feira, Josué de Castro completaria 114 anos. Em seu tempo, dominavam explicações malthusianas para a miséria que assolava o país, em especial a região Nordeste. A terra é ruim e há gente demais nela, dizia-se. Seria impossível solucionar a questão da fome. Sua arrojada obra – coroada pelo premiado Geografia da fome, de 1946 – reúne conhecimentos geográficos, sociológicos, antropológicos, históricos e biológicos para demonstrar que essa é uma mentira construída para beneficiar política e economicamente os ricos e grandes donos de terra.

Organizado por Tereza Campello, titular do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome nos governos Dilma, e Ana Paula Bortoletto, ambas pesquisadoras do Núcleo de Pesquisas Epidemiológicas em Nutrição e Saúde da FSP/USP, Da fome à fome reúne 26 artigos de especialistas de diversas áreas para oferecer um panorama sobre a atualidade da obra do pernambucano no Brasil de 2022, país das 33 milhões de pessoas com fome e dos recordes na exportação de alimentos.    

Mais do que nunca, não falta comida no Brasil. O que acontece, assim como no tempo de Josué, é que ela está mal distribuída. E quem gera essa situação lucra bastante com essa desigualdade. “Temos os dados, temos os recursos financeiros necessários, temos as tecnologias necessárias, temos até a produção de alimentos em quantidades imensas, mas temos o escândalo da fome. Não são mecanismos econômicos, são opções políticas articuladas com interesses corporativos”, explica o economista e professor da PUC-SP Ladislau Dowbor em artigo do livro.

Dowbor, colaborador de Outras Palavras, contribuiu para o livro com o ensaio Fome: uma decisão política e corporativa. Em seu texto, Dowbor explicita que a aliança entre o financismo e o agronegócio é o atual eixo de sustentação do “pacto pela fome” das elites por meio do negócio das commodities, exportadas em peso sem sequer serem taxadas. É preciso, diz o economista, inverter as prioridades do país: oferecer mais crédito e apoio aos pequenos agricultores, implementar uma renda básica e “orientar a economia para o bem-estar da população”.

Algumas soluções também foram propostas pelo próprio Josué em sua carreira política, desde a Câmara dos Deputados até a presidência do Conselho Executivo da FAO. Como aponta o artigo do também ex-diretor-geral da FAO e criador do Fome Zero José Graziano da Silva na coletânea, o pernambucano frisava que o problema da fome não é meramente técnico: é fundamentalmente uma questão política e só pode ser resolvida pela política das massas para as massas. Deputado federal pelo PTB de Pernambuco nos anos 50 e 60, ele defendeu uma reforma agrária construída pelos trabalhadores, que conquistasse o acesso à terra e os emancipasse do jugo dos latifundiários e mercadores da fome.

Confira Sete chaves para pensar o atual cenário da fome no Brasil: a contribuição de Josué de Castro, de Renato Carvalheira do Nascimento, capítulo de Da fome à fome publicado com exclusividade por Outras Palavras.

Josué de Castro pagou caro por sua opção aguerrida pelo desenvolvimento social e pela melhoria da vida da população pobre. Com o golpe militar de 1964, teve os direitos políticos suspensos, foi exilado e nunca mais pôde retornar ao Brasil. Aos 65 anos, faleceu na França, onde lecionava na Universidade de Paris-Vincennes. Mesmo banido do país natal, o pernambucano deu prosseguimento às pesquisas que sustentavam a luta de sua vida, o combate à fome.

O recrudescimento da miséria e da desnutrição demanda uma resposta urgente da sociedade brasileira e dos movimentos sociais. Os artigos de Da fome à fome, informativos e também programáticos, são um bom começo para a compreensão dos desafios de hoje à luz das reflexões históricas de um grande teórico e militante da dignidade do povo. 

Por isso, apoiadores do nosso jornalismo concorrem a 2 exemplares de Da fome à fome – diálogos com Josué de Castro. Realizado em parceria com a Editora Elefante, o sorteio estará aberto a inscrições até a próxima terça-feira, 13/9, às 14h. Os membros da rede Outros Quinhentos receberão o formulário de participação via e-mail no boletim enviado para quem contribui com Outras Palavras

É indispensável conhecer a obra do pernambucano para que o país se prepare para a necessária formulação de um grande programa emergencial de combate à fome e à miséria. Não podemos nos enganar: essa é a grande tarefa política do período que virá. Pesam as palavras de Chico Science: “Tem que se antenar. Tem que se informar. Tem que saber pra onde corre o rio. Tem que saber quem é Josué de Castro, rapaz…”

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