O perigoso o isolamento de Dilma

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Projeto de governo da presidente é ambicioso e competente — mas  está se chocando com a falta de articulação política e de diálogo com a sociedade civil

Por Luís Nassif, em seu blog

A política é a arte da irracionalidade. Exige acordos, concessões e um jogo duplo: numa ponta as negociações nem sempre transparentes para garantir a base de apoio político; na outra, a construção do imaginário junto ao eleitor, para garantir os votos e o cacife junto aos aliados políticos. Entre esses dois movimentos, o desafio de abrir espaço para a racionalidade administrativa.

São momentos distintos e estratégias distintas, um desafio muito mais complexo do que o de gestor de uma grande empresa.

É só conferir o caso PV-Marina Silva. A irracionalidade é tão grande que faz um partido inexpressivo – o PV, Partido verde – abrir mão de uma política com a história de Marina Silva, com 20 milhões de votos obtidos nas últimas eleições. Isso porque são momentos distintos.

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Um acurado observador do cenário político observa que, nos seis primeiros meses de seu governo, Dilma Rousseff não conseguiu ainda a embocadura necessária para vencer o desafio político.

No início, diz ele, fez bem em baixar a fervura da guerra com a velha mídia e não pretender se comparar a Lula. Este criou seu próprio espaço midiático, freqüentava diariamente as páginas dos jornais, mesmo daqueles francamente hostis.

Dilma foi prudente em não pretender trilhar o mesmo caminho, dada a diferença de estilo entre ambos. Mas vem cometendo o erro de se isolar totalmente não apenas do contato com o público, mas com interlocutores de diversas áreas da sociedade civil.

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Principal palco do grande pacto nacional, o CDES (Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social) perdeu vigor. Há pouco diálogo com sindicatos e movimentos sociais. A militância da blogosfera está totalmente perdida, com guerras intestinas e radicais até para temas que mereciam um tratamento mais racional, como o PNBL (Programa Nacional da Banda Larga) e o Código Florestal.

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A interlocução política perdeu um grande articulador – Alexandre Padilha -, um macaco velho – Antonio Palocci – em troca de uma senadora séria – Ideli Salvatti – mas sem um pingo de experiência em articulação política.

Não há uniformidade no discurso público. Aliás, o estilo Dilma provocou um encapsulamento na comunicação inclusive de ministérios da área econômica.

Depois de um período de trégua, a velha mídia volta a atacar o governo. E o clima de inação política vem abrindo espaço até mesmo para a radicalização de vozes da oposição – como Aécio Neves – normalmente dotadas de maior comedimento.

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Tem-se, então, um paradoxo. Numa ponta, o mais promissor início administrativo de um governo na moderna história política brasileira. Logo de cara foram apresentados novos modelos de coordenação de ações, mudanças significativas nas formas de gestão pública e objetivos claros: erradicação da miséria absoluta, investimentos em infra-estrutura, ampliação do pacto federativo para as políticas sociais.

Mas a percepção na opinião pública é de um governo perdido nas articulações políticas. Fundamentalmente devido ao isolamento da presidente, seu afastamento do discurso público e da articulação política.

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Há urgência em retomar os canais de diálogo com a sociedade como um todo. Inclusive para enfrentar as mudanças que em breve deverão ocorrer no cenário econômico global.

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