Para que terminem os “autos de resistência” da PM

Amplia-se mobilização para acabar com instrumento jurídico favorável a policiais que matam. Como ele funciona? Por que é tão letal?

Por Mauro Donato, no DCM

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Amplia-se mobilização para acabar com instrumento jurídico favorável a policiais que matam. Como ele funciona? Por que é tão letal?

Por Mauro Donato, no DCM

A prática genocida da PM nas periferias carrega uma aberração institucional. A classificação “auto de resistência” para definir esses homicídios tornou-se comum. Em 2011, 42% das mortes foram registradas como autos de resistência nos estados do Rio de Janeiro e São Paulo. Grande parte deles contra negros.

Grupos de entidades ligadas aos Direitos Humanos e diversos movimentos sociais como Levante Popular, Juventude e Movimento Negro, organizaram um evento na faculdade de Direito da USP no Largo São Francisco na semana passada, em apoio à aprovação de um projeto de lei de autoria do deputado federal Paulo Teixeira (PT-SP). Ele propõe várias medidas, inclusive a alteração da denominação “autos de resistência” (ou “resistência seguida de morte”) nos registros das ocorrências, para algo como “lesão corporal (ou morte) decorrente de intervenção policial”.

“Isso é um entulho da ditadura e continua existindo. No Rio de Janeiro foram analisados 12 mil autos de resistência e 60% deles foram execução pura e simples, muitas com tiro na nuca. Queremos que essas pessoas respondam por homicídio”, disse Paulo Teixeira.

O projeto é de 2012 e vem sofrendo para ser votado.

A ministra Luiza Bairros, da Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial, colocou o dedo na ferida: “A sociedade brasileira sofreu mudanças absolutamente significativas nos últimos dez anos. Mudanças não apenas materiais, mas de valores. Na medida em que as pessoas negras foram conquistando mais direitos, mais oportunidades, isso provoca outros mandamentos no interior da sociedade. As reações aos rolezinhos são um exemplo. As autoridades estaduais de segurança pública precisam ser chamadas para debates como esse. Porque para nós é mais difícil, a partir do governo federal ou do congresso nacional, produzir os resultados que queremos do ponto de vista da aprovação desse projeto. Fundamentalmente, quem se coloca contra ele são as instituições policiais.”

Uma pesquisa feita pelo Grupo de Estudos sobre Violência e Administração de Conflitos da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), com dados oficiais, aponta que o número de negros mortos em decorrência de ações policiais para cada 100 mil habitantes em São Paulo é três vezes maior que o registrado para a população branca. Os dados revelam que 61% das vítimas da polícia no estado são negras, 97% são homens e 77% têm de 15 a 29 anos. Já os policiais envolvidos são brancos (79%), sendo 96% da Polícia Militar. Ou seja, o racismo institucionalizado.

Vinícius Romão, ator que permaneceu preso durante 16 dias por ter sido “equivocadamente” confundido pela vítima de um assalto, deu seu relato. “O policial apontou a arma para minha cabeça por causa da minha cor de pele. E só não fui mais um ‘auto de resistência’ porque em nenhum momento pensei em correr. Fiquei tranquilo porque sou formado em psicologia e acreditei que em poucos minutos o erro fosse solucionado. Mas fui levado como flagrante e 157 (assalto a mão armada). Eu não fui parado na mesma rua da ocorrência nem estava com arma nenhuma. Fui parado porque tinha o cabelo black power. Só o que chamou a atenção da mídia foi quando anunciaram que um ator de novela havia sido confundido. ‘Ator de novela’ vende mais jornal do que ‘negro’.”

Além da alteração da denominação, o PL 4.471/12 traz outros avanços. Obriga a preservação da cena do crime; obriga a realização de perícia e coleta de provas imediatas; veta o transporte de vítimas em “confronto” com agentes, que devem chamar socorro especializado (isso já é adotado no estado de São Paulo e não coincidentemente diminuiu o número de mortes em 39%); define a abertura de inquérito para apuração do caso.

Há uma conivência de boa parte da sociedade com a política violenta exercida pelas polícias. Isso precisa ser combatido. É um câncer que se alastra.

Não pensemos apenas nas vítimas. Pensemos nos parentes, nos cônjuges, nos filhos das vítimas. Nos que “sobraram”. Quais as consequências emocionais de saber que o assassinato de um ente querido está cínicamente registrado como “auto de resistência”? Dá para suspeitar que a simpatia pela PM não irá se aprofundar, certo? Não é difícil imaginar que o sentimento de ódio e vingança brotem a partir daí. Se uma criança vê seu pai tomar um enquadro e ser humilhado e agredido apenas pela cor de sua pele, qual o trauma futuro tanto para ela (com todas as sequelas ao longo de sua vida), como para a sociedade que arcará com a eternização do problema.

Pode parecer de menor importância exigir a substituição de um procedimento de registro. Mas chegar a ser irônico que se denomine auto de resistência. Se uma das partes morreu, quem resistiu?

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3 comentários para "Para que terminem os “autos de resistência” da PM"

  1. Gilberto Agostinho dos reis disse:

    querem uma cidade sem policia ou com a policia desmoralizada. vai ficar ótimo para quem não quer estar sujeito a leis e normas. a quem interessa isto?estamos sendo manipulados por estes, sem perceber.
    QUEREM DESTRUIR UMA NAÇAO? FAÇAM SEU POVO DESACREDITAR EM SUAS INSTITUIÇÕES, É O CAMINHO MAIS CURTO PARA VIRARMOS UNS CONTRA OS OUTROS E TOMARMOS A LEI COM AS PRÓPRIAS MÃOS (OLHO POR OLHO, DENTE POR DENTE) LEI DE TALIÃO.
    ESTAMOS DESTRUINDO NOSSA NAÇÃO E NÃO ESTAMOS DANDO CONTA DISTO, PRECISAMOS DO CONTRARIO, FORTALECER TODAS NOSSAS INSTITUIÇÕES E NÃO ESFRAQUECE-LAS
    Gilberto A. Reis

  2. Gilberto Agostinho dos reis disse:

    É lamentável que as pessoas divulguem o que não têm conhecimento, auto de resistencia é um instrumento da lei, para aqueles que resistem a ordem legal do agente ou da autoridade policial… mas pesquizem para sabermais, concordo com o antoi de Pádua, e tambem concordo que existe driscriminação racial em nosso país mas não é da Policia e sim da sociedade (o policial tambem é cidadão da nossa sociedade, e não vemos muitos negros nas universidades, nos serviços públicos nos cargos gerenciais ou de Diretorias, ou na política, será qual percentual de negros moram nos bairros nobres ou na zona sul? Isto sim precisa ser mudado… daí nós afrodescendentes em geral ficamos nas periferias, nos bolsões de miséria e mais susceptiveis de estarmos na criminalidade daí mais abordados pela policia. E no caso acima citado a pessoa foi presa não pela cor da pele e sim porque a vítima de um assalto o identificou e o reconheceu confirmando ser ele, depois da reaçao publica e de seus amigos a pessoa voltou atras e disse que tinha enganado (ela sim deveria ser responsabilizada) a policia cumpriu seu papel porque não contam a história como ela é, enfraquecer a policia deveria ser aúltima coisa a se pensar, uma das necessidades básicas do ser humano é a de segurança (também sou psicólogo) está me parecendo que pensar doi, pois vamos absorvendo tudo sem um mínimo de reflexão. Meu afilhado foi assassinado por um bandido com um tiro nas costas (estava de moto) para roubarem a moto dele, felizmente tinha um casal de PMs atras e após perseguição prenderam os dois marginais que estavam em outra moto (ações assim não são divulgadas, será porque)? MEU AFILHADO MORREU… VAMOS PENSAR MAIS?
    GILBERTO A. REIS

  3. Antonio de pádua disse:

    Daqui a pouco vão querer que o Batalhão escolha qual o PM deve morrer, para satisfazer os bandidos e a corja dos DHB-Dreitos Humanos de Bandidos fiquem satisfeitos… Por que não solicitam um Plebiscito a respeito ? não estamos numa Democracia ? que o povo decida então.

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