Nassif explica déficit externo e provável queda do real

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Falta, porém, debater o mais importante: como se fará a divisão da conta, entre a sociedade brasileira?

Nova pesquisa Datafolha sobre eleições presidenciais, divulgada hoje, revela que Dilma Roussef ampliou um pouquinho mais a dianteira em relação a José Serra (agora, é de 24 pontos percentuais). Parecem confirmar-se opiniões como as de Marcos Coimbra, segundo as quais a velha mídia desgasta apenas a si mesma, quando tenta fabricar escândalos, na esperança de promover o candidato de sua preferência. Faltando pouco mais de duas semanas para as eleições, a tendência é que o debate comece a migrar para o futuro: o que será o país no governo Dilma, com a correlação de forças no Congresso Nacional provavelmente alterada?

No novo cenário, terá grande importância a desvalorização do real, que o futuro governo muito provavalmente precisará promover. Para compreender por que ela será necessária, vale a pena ler a Coluna Econômica que Luís Nassif publica hoje em seu blog. O texto revela, em resumo, que a insistência do Banco Central em manter taxas de juros elevadas provocou ampla entrada de capital especulativo no país, valorizou artificialmente a moeda nacional e afetou a indústria, ao baratear as importações. O movimento é, além de tudo, insustentável. Em algum momento, os investidores externos, já saciados, considerarão que o déficit externo brasileiro faz do país um risco exagerado. Nesse momento, buscarão, para seu dinheiro, portos que consideram mais seguros.

Mas talvez falte à coluna de Nassif atentar para um aspecto decisivo: os desdobramentos da desvalorização. Embora quase inevitável, ela não precisa resultar nem um novo “ajuste fiscal” (já tido como certo, pela mídia), nem numa nova alta das taxas de juros. Aqui está toda a diferença. Veja a seguir por que.

1. O balanço das transações comerciais e financeiras do Brasil com o exterior é, desde 2008, crescentemente negativo. As exportações de mercadorias e serviços não são suficientes para pagar importações, viagens internacionais, fretes, seguros, remessas de lucros e outras despesas. A diferença poderá chegar a cerca de 50 bilhões de dólares, este ano. Tem sido paga por empréstimos — o que apenas adia a correção do problema.

2. Uma desvalorização do real tende a equilibrar as contas. Ela restringirá (ao tornar mais custosa) a importação de produtos e serviços e tornará mais atraente (porque mais barata) a produção nacional.

3. Nas ocasiões anteriores em que ocorreu (1998 e 2002, ambas sob o governo FHC), a desvalorização foi acompanhada por alta expressiva da taxa básica de juros. Para remunerar seus credores, o Estado cortou serviços públicos e elevou impostos, o que atingiu as maiorias e deprimiu a economia. Afirmou-se que isso era necessário para evitar uma alta exagerada da inflação.

4. Esta alegação é oportunista. A desvalorização do real tem, sobre a inflação, um efeito muito menor do que se alardeia. Desde que o país alcançou autosuficiência na produção de petróleo, ela encarece bens e serviços específicos, mas não se difunde no conjunto da economia.

5. Os dois objetivos da alta de juros são outros: a) transferir riqueza do Estado para os setores mais abastados da sociedade, que são credores da dívida pública; b) evitar, pelo mesmo mecanismo, que alguns grupos empresariais, muito endividados no exterior, quebrem, com a desvalorização do reas frente às moedas estrangeiras.

6. Há múltiplas alternativas. Para reduzir o desequilíbrio externo, é possível, por exemplo, limitar ou tributar as remessas de lucros das empresas transnacionais (prevêem-se US$ 32 bilhões em 2010, mais de 60% de todo o déficit). Embora desconfortável, num primeiro momento, a desvalorização do real pode estimular a reativação de setores que definharam devido ao barateamento artificial das importações. O Estado pode monitorar a situação das empresas endividadas em moeda estrangeira, estimulando, por exemplo, fusões ou mudanças de controle acionário que preservem a produção e os empregos.

O cenário político que vai se abrir no Brasil, a partir de 1º de janeiro, será cheio de oportunidades e riscos. Para dar-lhe sentido positivo, é preciso conhecer em profundidade os dilemas à frente.

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