Marighella desbanca Médici e vira escola na Bahia

Comunidade adota decisão que STF evitou, revê homenagem a ditador e celebra um dos ícones da luta contra ditadura

Por Mário Magalhães, em seu blog

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Comunidade adota decisão que STF evitou, revê homenagem a ditador e celebra um dos ícones da luta contra ditadura  

Por Mário Magalhães, em seu blog

Numa eleição histórica encerrada anteontem, a comunidade do Colégio Estadual Presidente Emílio Garrastazu Médici, de Salvador, decidiu que a instituição deve ser rebatizada como Colégio Estadual Carlos Marighella.

Os eleitores, na maioria alunos, deram 406 votos (69%) a Marighella e 128 ao geógrafo Milton Santos. Os nulos foram 25, e os brancos, 27. O resultado será encaminhado à Secretaria da Educação da Bahia, para que o Estado promova uma “reinauguração”, palavra empregada pela diretora do estabelecimento, Aldair Almeida Dantas, em conversa com o blog.

O colégio foi inaugurado em 1972, quando o general gaúcho Médici (1905-85) ocupava a Presidência da República, sem ter recebido um só voto popular. Seu governo (1969-74) marcou o período de maior repressão e falta de liberdades na ditadura imposta em 64.

Do golpe que derrubou o presidente constitucional João Goulart até 1985, nos 21 anos em que ditadores ocuparam o Palácio do Planalto, ao menos 400 oposicionistas foram mortos por agentes públicos. Boa parte havia sido presa com vida, estava sob custódia do Estado e foi torturada até a morte.  Mais de 130 cidadãos tiveram os corpos desaparecidos para sempre, sem que as famílias pudessem lhes oferecer um enterro digno. Nem mesmo a legislação da ditadura autorizava tortura e execução de seres humanos.

O guerrilheiro baiano Carlos Marighella (1911-69) foi declarado pela ditadura, em novembro de 1968, “inimigo público número 1”. Militante comunista na maior parte da vida, ele se incorporou em 67 à luta armada contra o regime. Fundou a maior organização guerrilheira de combate à ditadura, a Ação Libertadora Nacional, ALN.

Foi assassinado em 1969, no governo Médici, por ao menos 29 membros da polícia política armados até os dentes. Desarmado, Marighella não portava nem um canivete. Em decisões de 1996 e 2011, a União reconheceu que o “inimigo” poderia ter sido preso vivo, assumiu a responsabilidade por seu homicídio e pediu perdão à sua família.

O outro candidato da eleição, o geógrafo baiano Milton Santos (1926-2001), foi um dos pensadores brasileiros mais brilhantes do século XX. Perseguido pela ditadura, foi obrigado a passar mais de uma década no exílio, inclusive durante a administração do general Médici.

Milton Santos e Carlos Marighella eram afrodescendentes. Médici era branco.

O pleito foi coordenado pelo colegiado da escola, composto por professores, funcionários, estudantes e pais de alunos _segmentos que tiveram direito a voto. Ninguém propôs manter na cédula o nome atual _insatisfeitos com as opções votaram branco e nulo. O colégio Médici é de ensino médio e profissionalizante.

Continuam a existir no Brasil centenas ou milhares de sítios públicos batizados em homenagem a próceres e símbolos da ditadura. Seria como eternizar na Alemanha reverências do tempo do nazismo ou, na Argentina, da ditadura 1976-83. Mas não existe escola berlinense Adolf Hitler ou praça portenha Jorge Rafael Videla, o ditador que principiou o ciclo genocida. Tiranos e açougueiros do passado não devem servir de exemplo aos jovens.

É esse o caminho apontado no colégio Médici, futuro colégio Marighella.

Como assinalou a diretora Aldair, na origem da escolha pela mudança de nome esteve uma exposição dos alunos, derivada de “um trabalho espetacular da professora Maria Carmen”. Chamaram-na “A vida em preto e branco: Carlos Marighella e a ditadura militar”.

Um vídeo com a socióloga e professora Carmen apresentando a exposição pode ser assistido clicando aqui.

Testemunho pessoal

Sou autor da biografia “Marighella – O guerrilheiro que incendiou o mundo” (Companhia das Letras). Um exemplar aparece no vídeo, entre os objetos expostos no _ainda_ colégio Médici. A professora Carmem disse, comovendo-me: “Seu livro foi uma base e uma inspiração para esse trabalho”.

Como sabe quem leu a biografia, não produzi nem uma hagiografia, promovendo os feitos do protagonista, nem um libelo contra ele. Escrevi uma reportagem, contando o que Marighella fez, disse e, na medida do possível, pensou. Não o julgo ou trato como herói ou bandido _empenho-me em fornecer informações para cada leitor formar seu próprio juízo.

Mas, como dizia João Saldanha, grande amigo de Marighella, eu não sou filho de chocadeira _tenho opinião. A ditadura foi um mal, e seus crimes devem ser narrados, bem como os criminosos, punidos. A história não deve apagar personagens, como a ditadura e suas viúvas tentaram fazer com Marighella, ou como os artistas de Stálin faziam eliminando das fotografias as pessoas caídas em desgraça.

A professora Carmem e seus alunos orgulham o Brasil. Assim como é legítimo haver escolas com o nome de Carlos Lacerda (1914-77), líder de direita de gigantesco talento, é legítimo reverenciar um dirigente de esquerda como Carlos Marighella.

Ilegítimo é bajular em prédio público a memória de ditador, perenizando o elogio das trevas.

Tomara que o governo Jacques Wagner não barre a decisão democrática e soberana da comunidade que decidiu pela civilização, contra a barbárie.

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26 comentários para "Marighella desbanca Médici e vira escola na Bahia"

  1. Bruno disse:

    Imagina daqui a 40 anos, teremos escola Fernando Beira Mar.

  2. Augustus Carlos disse:

    PEDRO MARQUES, tu calado é um ótimo cantor!!! Quem tá defendendo ‘ideologia’. Se não tem o que falar, fica calado, ou vai assistir aula de Historia na Escola CARLOS MARIGUELLApra vê se aprende algo!!!

  3. Augustus Carlos disse:

    Pelo visto, tu sabe muito pouco da história!!! Talvez precise ir à Escola Carlos Mariguella!!!!

  4. Pedro Marques disse:

    É isso mesmo João. É um absurdo que ainda tem brasileiros que vivem numa democracia e defendem ideologias retrógradas que não deram certo nem mesmo na Rússia. Pasmem !

  5. Carlos J. R. Araújo disse:

    A terrinha dói na alma. As classes médias da terrinha de hoje assumem – e com um rompante de fazer dó – o velho e centenário reacionarismo das elites do Brasil Colônia. Pois é. Estamos atrasados uns três séculos.
    E se a discussão diz respeito ao nome da escola que terá o nome de Mandela, lembro que, na época do ACM, a queridérrima Barraia tinha nada menos que umas duzentas e tantas escolas públicas estaduais e municipais com o nome do finado filhinho querido – aquele, que hoje dá o nome ao aeroporto 2 de julho. Vou vomitar…

  6. Preceles disse:

    Não concordo com a troca do nome da Escola. Nada a ver o que aconteceu no governo om o nome de uma obra, no caso em questão uma instituição de ensino. Coisas PeeeeeeeeeeeeeTiiiiiiiiiiiiiistas.

  7. Edu disse:

    Medici foi um ditador. Se fosse o regime que o Marighela queria implantar no Brasil, seria uma ditadura bem pior.

  8. joao disse:

    Se nao fosse a intervençao dos militares brasileiros, seria a dos americanos que sob hipotese alguma deixaria que um pais continental como o Brasil se transformasse em um satélite da Russia ou de Cuba e como consequencia poderíamos ter aqui uma situaçao semelhante ou pior que o Vietnam ou seja , um pais destruido pela guerra ,, possivelmente dividido em varias republiquetas devido a secessão, subdesenvolvido e ocupado pelos americanos ou pela ONU .Sera que estaríamos em melhor situaçao? eu acho que nao. Quanto aos pretensos herois que pegaram em armas nao passavam de marionetes Russas ou Cubanas que pretendiam implantar no Brasil o comunismo { regime que nao deu certo em lugar nenhum , inclusive, rejeitado pelos próprios Russos .Estes pseudos herois nao eram santos , pena e que o povo tem a memória curta e a juventude é manipulada por pessoas sem escrupulos e sem apego de mostrar os dois lados da moeda.

  9. Roberto Fraga disse:

    Prezado Nox Noctis.
    Não. Seria mutio bom se fosse assim, mas quando um povo não conhece sua história, e nomes como “Médici” são inauguradas instituições de ensino, e os Militares não fizeram nenhuma transformação e sim repressão, o crescimento, desenvolvimento e libertação de uma sociedade, tenha certeza estará comprometida por muito tempo. Então sugiro a você através dos meios hoje existentes conhecer um pouco desse passado que foi e tornou nosso presente ridículo. Boa leitura.

  10. Roberto Fraga disse:

    Prezado Edu.
    Não. Se possível leia um pouco da historia de Carlos Marighella. Chegará as suas conclusões. Boa leitura.

  11. Roberto Fraga disse:

    Parabéns por essa iniciativa. Sou um apaixonado pela vida de Carlos Marighella, um ícone da resistência, pensamento universal, o desejo de liberdade para o povo…. Infelizmente essa tal ditadura, ainda nos cerca precisamos transformar através dos pensamentos e atitudes. Quem está no (Poder) sabe que a EDUCAÇÃO é libertadora, abre horizontes, forma cidadãos criticos, responsáveis, éticos, etc. Estão precisamos colocar o pé no freio! e repensar nossa sociedade, que está numa UTI, preste a entrega no colapso total

  12. cremilda souza disse:

    Eu era desse tempo,quem fez a escola?que eu saiba os comunistas agora esta se aproveitando de tudo que encontrou pronto,não faz nada de util,muito papo,e desinformação aos alunos,comunista heroi? faça-me uma garapa.

  13. Pedro Marques disse:

    Graças as ações enérgicas dos militares não foi possível prosperar o plano dos guerrilheiros treinados em Cuba, Pequim e Moscou, de transformar essa bela nação numa ditadura de esquerda similar ao falido regime cubano.

  14. Maurício Gil - Floripa (SC) disse:

    Não diz besteira!
    Que pensamento mais esdrúxulo, mais sem sentido. Vá estudar, vá ler algo de bom e se informar antes de emitir asneiras parecidas.

  15. Maurício Gil - Floripa (SC) disse:

    Vai dormir, vinagre.
    Nem de relance o autor insinuou que branco é sinônimo de bandido.
    Primeiro vá ler, estudar para depois ter argumentos decentes e deixar de dizer besteiras.

  16. Maurício Gil - Floripa (SC) disse:

    Não diz besteira!

  17. Roberto Martins disse:

    Roberto, sou velho, do tempo do Médici, mesmo sendo didator, tinha os defeitos dos atuais tudo ladrão, acompanhei seu governo, tinha desenvolvimento e respeito a propriedade privada urbana ou rural. E agora o que temos: saques urbanos e rurais.

  18. Alexandre F. Valente disse:

    É muito bom ver exemplos – cada vez mais raros, infelizmente – de democracia no âmbito da escola pública. Os alunos e toda a comunidade escolar do futuro Colégio Carlos Marighella estão de parabéns!

  19. Ruy Mauricio de Lima e Silva Neto disse:

    Parabéns aos responsáveis por esta justa troca. Assim como esta, faço votos que aos poucos todos os nomes relacionados (negativamente) com aquele período infame venham a ser trocados por nomes de tanta gente corajosa e até heróica que sofreu na mão daqueles esbirros. E não acho nada justo que Lacerda tenha uma escola com seu nome. Foi um dos maiores canalhas que infestaram nossa vida política e responsável, do lado civil, por mais de 80% de subversão para o país ingressar naquele longo período de trevas, de liberdade e de cidadania.

  20. Dirceu Rodrigues disse:

    Pedro Marques, terrorista sanguinário foi Emílio Garrastazu Médici. Não sei quando anos você tem, mas a época em que ele governou o Brasil foi a mais tenebrosa. Não tínhamos liberdade de expressão e quem queria falar alguma coisa era preso e torturado.

  21. Nox Noctis disse:

    Quer dizer que enquanto a escola chamava-se “Médici”, formou diversas gerações de ditadores de direita?
    A questão é tão estúpida como se mudar o nome de uma escola para “Albert Einstein”, passaria a formar nobeis de física.

  22. Edu disse:

    O medici era um ditador e o Marguela queria o que? Uma outra ditadura. Vai trocar um ditador por outro. Que democracia hem! O pior do texto e colocar que 2 Sao agrides endente e um e branco, como se branco significa bandido.

  23. Guilherme Santiago disse:

    O que adianta trocar um ditador por um terrorista?

  24. Depauster disse:

    Não, rapaz, o terrorista sanguinário era o nome antigo, eles estão mudando o nome pelo de um guerreiro, pronto para pegar em armas, como o foi Mandela.

  25. Justa homenagem a quem foi além de tudo professor,tendo seus direitos políticos cassados em 23/05/67 quando já era caçado pela ditadura!!!

  26. Pedro Marques disse:

    Infeliz ideia em renomear uma instituição de ensino público como nome do terrorista sanguinário Marighella. Ação deplorável !

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