O desmonte da cultura paulista

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Pelo menos para a cultura, o modelo de OS  (Organização Social) está falido. Que o controle social se dê de outra forma. Será a única maneira de poupar a cultura paulista de esbirros autoritários, das suscetibilidades do universo cultural e do amadorismo de sucessivos secretários

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Grupo de empresários paulistas financia programa de aprimoramento do ensino no estado, bancando consultoria da McKinsey.

Esse apoio só foi possível depois da entrada do governo Alckmin e da nomeação do Secretário Herman Voorwald. Na era Serra o governo tornou-ser totalmente impermeável a qualquer interação com a sociedade civil – até com empresários.

Mais que isso, o novo secretário conquistou a confiança dos empresários com ideias claras sobre educação, participação e formação dos alunos.

Faço essa introdução como contraponto ao que está acontecendo na área da Cultura.

O modelo de OS (Organização Social) foi completamente deturpado no setor. E o estilo Serra na prefeitura e no estado – ao contrário do que ocorreu na Saúde – seguiu a mais atrasada herança política brasileira: a terra arrasada sobre as estruturas já existentes.

Sob a inspiração de Cláudia Toni – que conquistou fama de terrível no meio cultural -, o primeiro Secretário de Cultura de Serra, João Sayad, desmontou a parte musical do estado. Não ficou pedra sobre pedra. Aliás, nem na Fundação Padre Anchieta, onde Toni teve a ousadia de demitir Julio Medaglia – uma notável unanimidade. Voltou atrás, depois, por decisão do governo do estado.

Outras pessoas a quem o estado devia enormes conquistas foram remoidas do cargo com humilhação. Foi assim com o maestro John Neschiling, da OSESP, com o maestro Neves, do Conservatório de Tatuí, Clodoaldo Medina, da Escola Livre de Música Tom Jobim.

Não apenas foram demitidos – alguns por carta, como Neves, que havia transformado Tatuí em referência nacional de música -, como, em muitos casos, recorreram-se a ataques sibilinos, insinuações sobre a seriedade das pessoas.

Procedeu-se à substituição das OSs sem nenhum critério. A Escola Livre de Música foi entregue à Universidade Santa Marcelina que, embora reputada, é concorrente. Ambas, a Tom Jobim e a Santa Marceliina, disputam o mesmo universo de alunos.

No início, Cláudia pretendia juntar todas as orquestras de São Paulo – Jazz Sinfônica, Orquestra Jovem – sob uma mesma formação. Embora filha do respeitado e querido maestro Oliver Toni, a ânsia da “refundação” era tamanha que sequer levou em consideração as diferenças de formação, estilo e gosto dos músicos de cada orquestra.

Essa loucura não prosperou, mas entregou-se a Jazz Sinfônica para a Organização Social de Cultura Associação Paulista de Amigos da Arte, que jamais teve experiência prévia na administração de orquestras.

A administração de orquestras exige formação especial e experiência prévia. Envolve egos, logística, viagens, programação. Abriu-se mão do principal gestor de orquestras do país, Clodoaldo, meramente pelo desejo da “refundação”.

Não apenas isso.

Foi encomendado um diagnóstico para quatro universidades, que dividiram a formação musical em inclusão social, formação técnica (do instrumentista) e formação superior (com orquestração, história da música etc). A primeira etapa seria do Projeto Guri (tirando da politização imposta na gestão Mendonça); a segunda, dos conservatórios; a terceira, das universidades.

Na prática, foi um desmonte. Pegou-se o notável Conservatório de Tatuí, que dava formação técnica aos alunos, e lotou-se o currículo com matérias teóricas próprias de curso superior. Nem cuidaram de analisar as expectativas dos alunos.

O resultado foi a redução significativa do número de alunos.

Agora, no seu curto interinato, Andréa Matarazzo planeja uma nova “refundação”. Pretende tirar as orquestras da Associação Paulista de Amigos da Arte e entregá-las ao Instituto Pensarte, que jamais administrou uma orquestra. Todo o tempo perdido no aprendizado da APAA é jogado fora, todos os músicos são despedidos, para serem recontratados por uma nova OS e começa-se tudo de novo.

O governador Alckmin, que conseguiu avançar na Educação, precisa voltar os olhos para a cultura do Estado.

Pelo menos para a cultura, o modelo de OS está falido. Dia desses conversei com um desanimado músico de orquestra paulista. A única coisa que pedem é uma estrutura que não atrapalhe, que dê conta da parte administrativa sem a descontinuidade dos últimos anos, nesse amadorismo da “refundação” permanente”.

Que o controle social se dê de outra forma. Cada orquestra volte a ter sua personalidade jurídica própria, submetida a um conselho de notáveis que representem os olhos da sociedade civil. Será a única maneira de poupar a cultura paulista de esbirros autoritários, das suscetibilidades do universo cultural e do amadorismo de sucessivos secretários.