Os 180 mil mortos

Brasil ultrapassa novo marco na pandemia, mas população não liga atuação de Jair Bolsonaro — caracterizada de “criminosa” pela Academia Nacional de Medicina — à tragédia

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Na sexta-feira, o Brasil ultrapassou o marco das 180 mil mortes por covid-19 – concretizando o pior cenário possível da pandemia, projetado internamente pelo Ministério da Saúde em abril. Para cada mais gente, os números já são traduzidos em pessoas queridas que se foram. Todas as circunstâncias sugerem que, por enquanto, a vacina não passa de promessa por aqui – e parece improvável que chegue para impedir o próximo recorde, quando atravessaremos o limite das 200 mil vidas perdidas. Se levarmos em conta a atual média móvel de mortes, que está há uma semana acima de 600, isso deve acontecer em janeiro. 

Já estamos bem perto de retroagir ao pior momento da pandemia por aqui: a média móvel de casos está em 42.659, 20% acima do que há 14 dias, e próximo do pico, registrado em 27 de julho, quando o país atingiu uma média de 46.393 infecções. No começo de novembro, esse patamar estava na casa dos 16,5 mil casos.

A Academia Nacional de Medicina classificou de “criminosa” a política do governo federal em relação ao enfrentamento da pandemia. Na nota divulgada na sexta, a entidade afirmou que grande parte das 180 mil mortes poderia ter sido evitada. “O tempo perdido com a falsidade matou dezenas de milhares e vai seguir matando”. 

Apesar de tudo, aumentou o número de brasileiros que não vê ligação entre as declarações e ações do presidente Jair Bolsonaro e a pilha de cadáveres. Segundo o Datafolha, em agosto 47% diziam que ele não tinha culpa pelo total de mortos. Agora, são 52% dos entrevistados. Outros 38% disseram crer que o presidente é um dos culpados, mas não o principal, e apenas 8% afirmaram que ele é o principal culpado pelas mortes. 

Apesar disso, a maior parte dos entrevistados (53%) disse acreditar que o Brasil não fez o que era preciso para evitar o número estúpido de mortes pela covid-19, enquanto se dividem igualmente o restante que pensa que nada que o país fizesse evitaria esse cenário (22%) e os que pensam que o Brasil tomou as atitudes necessárias para evitá-lo (22%).

Dos entrevistados, 42% avaliam como ruim ou péssima a atuação de Bolsonaro na pandemia. Já 27% veem as ações do presidente como regulares, e 30% avaliam como ótimas ou boas. Mulheres tendem a avaliar esse desempenho pior do que homens (47% delas consideram ruim ou péssimo, contra 35% deles) – e esse cordão engrossa entre os mais escolarizados (57% avaliam mal) e os mais ricos (55%). Quem vive nas grandes cidades tende a avaliá-lo pior do quem vive no interior: 49% contra 36%.

Quem perdeu muito capital político durante a pandemia foi o Ministério da Saúde: em abril, quando Luiz Henrique Mandetta estava no comando da pasta e chegou a antagonizar com Bolsonaro, 76% avaliavam o desempenho da pasta como ótimo ou bom. Agora, esse número refluiu para 35%.

Para completar, a pesquisa captou um crescimento do sentimento antivacinas: em agosto 9% diziam que não pretendiam se vacinar, número que chegou aos 22% agora. O Datafolha aponta que a resistência à vacinação é mais significativa quando se considera a confiança da população no governo atual. Ao todo, 33% dos brasileiros que dizem sempre confiar em Bolsonaro disseram que não vão se vacinar, enquanto esse número cai para 16% entre os que dizem que nunca confiam no chefe do Executivo.

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