O “iFood da saúde”

Ao invés de lanches, cirurgias “que cabem no bolso”: Saúde iD mira usuários do SUS para vender procedimentos de milhares de reais

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O Grupo Fleury vislumbrou num importante gargalo do SUS uma oportunidade de negócios. Criou uma empresa, a Saúde iD, para vender cirurgias de baixa complexidade a um público-alvo bem específico: usuários do sistema público, cansados de esperar na fila das centrais de regulação por um procedimento. O objetivo da empreitada? “Queremos ser o iFood da saúde”, resumiu Paula Mateus, diretora comercial da Saúde iD, em uma reveladora entrevista à jornalista Cristiane Segatto. 

Noves fora o fato de o iFood ter um controverso histórico de denúncias envolvendo a ponta mais fraca da corda, os entregadores, há uma distância muito grande entre pedir um lanche e pedir uma cirurgia. 

A começar pelo potencial de endividamento dos consumidores. Outros negócios mirando o mesmo público, como o Dr. Consulta, abriram o caminho das operações bancárias voltadas a clientes sem dinheiro. Em 2018, depois de constatar que 40% dos consumidores não davam sequência aos atendimentos por falta de grana, a financeira do banco Votorantim resolveu apostar no seguinte filão: empréstimos para essas pessoas realizarem exames e procedimentos no Dr. Consulta. 

Apesar de o chamariz do site do Saúde iD ser “Cirurgias que cabem no seu bolso!”, ninguém duvida que um procedimento desses é muito mais caro do que uma consulta. Alguns dos preços:  R$ 11.980 para retirada de pedras fora da vesícula, R$ 9.360 para operar hérnia por videolaparoscopia, R$ 2.820 por vasectomia…

Num país endividado, isso abre outra pergunta: será que o modelo de negócios na verdade é voltado para a compra desses serviços pelo próprio SUS? A inspiração da Saúde iD é o “corujão da saúde”, que no município de São Paulo contratou empresas privadas para tentar zerar as filas de exames de imagem. 

“Há três milhões de cirurgias represadas no SUS. Sabemos que 52% dessas cirurgias se resumem a cinco procedimentos: hérnia, vesícula, catarata, amígdalas e varizes. Ou seja: oferecendo cinco procedimentos, é possível resolver 52% da fila cirúrgica do SUS”, diz Paula Mateus, como quem está de olho em outro público-alvo: os gestores. Ela, no entanto, jura que a ideia é ser um corujão para o setor privado.  

A plataforma é definida por sua criadora como um “marketplace” – como iFood ou Magazine Luiza – com cirurgia “all inclusive”. A promessa é que pré-operatório, internação, pós-operatório, consultas, honorários médicos, medicamentos etc. saem pelo preço anunciado no pacote. 

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