Num respirador da USP, sinais de um país livre do sufoco

Universidade entrega 1000º ventilador médico com tecnologia nacional e sem patente; e lança um Centro de Engenharia da Vida. Experiência sugere viabilidade do Complexo Econômico e Industrial da Saúde

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A indústria brasileira pode renascer, se tiver encomendas do vasto complexo da Saúde e de outros serviços públicos indispensáveis? Esta hipótese, formulada há anos por pesquisadores como Carlos Gadelha, pareceu confirmar-se – ainda que em escala muito pequena – a julgar por uma cerimônia realizada na USP, esta semana. A Escola Politécnica (“Póli”) entregou o 1.000º respirador da série Inspire, produzida a partir de agosto de 2020, para enfrentar a pandemia de covid. A Marinha do Brasil, que participa do projeto, festejou também.

A história é reveladora de debilidades e potências a explorar. Quando a pandemia eclodiu, o país viu-se às voltas com a escassez de respiradores – essenciais para oferecer alguma esperança aos pacientes graves da doença. Além de os equipamentos serem caros, a produção nacional é pequena, diante das necessidades. E a importação estava difícil, pois China e Estados Unidos, os principais produtores, recebiam encomendas de todas as partes do mundo.

A necessidade fez surgirem, rapidamente, diversas iniciativas para produzir no Brasil. Uma delas, a da Póli-USP, foi projeto de um grupo de professores da universidade, que optaram por um desenho de baixo custo e livre de patente. Lançado em março de 2020, testado no Hospital das Clínicas e no Incor, o modelo começou a produzir quatro meses depois. As mil unidades fabricadas foram distribuídas para 219 cidades. O mais importante é que o experimento poderá ter vida futura. Na cerimônia de celebração, anunciou-se a criação, na Póli, do Centro de Engenharia da Vida, que se voltará, entre outros objetivos, para a telemedicina.

Num texto publicado pelo projeto Resgate, de Outras Palavras, o economista Carlos Gadelha lembra que em 13 anos – de 2003 a 2019 – o déficit comercial brasileiro na área da Saúde foi de US$ 5 para US$ 15 bilhões (veja gráfico acima). O problema é muito mais que financeiro. O país compra no exterior fármacos e equipamentos que poderiam movimentar uma indústria pujante e gerar postos de trabalho qualificados. O SUS, maior sistema público de Saúde do mundo, garantiria as encomendas – e seria muito melhor abastecido do que hoje.

O experimento da USP é um sinal de que tal sonho é possível.

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