Será preciso revacinar os idosos?

Estudo preliminar indica que desempenho cai bastante com a idade, mas ainda não há dados sobre hospitalizações e mortes. Brasil pode precisar rever estratégia para proteger idosos

.

Esta nota faz parte da nossa newsletter do dia 24 de maio. Leia a edição inteira. Para receber a news toda manhã em seu e-mail, de graça, clique aqui.

Um estudo preliminar conduzido em São Paulo aponta que o desempenho da CoronaVac cai com a idade. No geral, a efetividade observada para maiores de 70 anos foi de 42%, mas esse percentual variou bastante: 61,8% em pessoas entre 70 e 74 anos; 48,9% entre 75 a 79 anos; e apenas 28% em maiores de 80 anos. Outra constatação foi a de que o imunizante não conferiu proteção após a primeira dose, sendo necessários 14 dias após o reforço para esses valores serem observados.

Foram analisados os dados de 15,9 mil idosos com mais de 70 anos vacinados no estado de São Paulo entre janeiro e abril, quando já predominava a variante P.1. Os valores encontrados para maiores de 75 anos estão abaixo da eficácia constatada nos ensaios clínicos de fase 3, que foi de 50,7%. No entanto, apenas 5% dos participantes desses ensaios tinham mais de 60 anos. Quando a Anvisa concedeu aprovação emergencial para o uso do imunziante, ressaltou que os dados disponíveis eram insuficientes para “determinar um perfil de eficácia e segurança da vacina” para idosos. 

Segundo os autores, “esse fenômeno [redução da efetividade entre pessoas mais velhas] ocorre na vacina influenza e é esperado que ocorra em outras vacinas”. É importante sublinhar, porém, que os números tratam apenas da proteção contra covid-19 sintomática. Análises para calcular o impacto na redução de hospitalizações e mortes ainda estão em curso, e de fato a proporção de idosos mortos no Brasil por covid-19 caiu desde o começo da vacinação. Recentemente, o Chile divulgou seus dados de “vida real” com a CoronaVac e eles mostraram uma proteção de 80% contra mortes. Porém, os resultados não estavam divididos por faixa etária, e é possível que exista uma distribução desigual.  

O trabalho tem financiamento da Opas (a Organização Pan-Americana da Saúde) e foi realizado pelo grupo Vaccine Effectiveness in Brazil Against Covid-19 (Vebra Covid-19), que envolve pesquisadores da Fiocruz, Incor, UnB e outras instituições nacionais e internacionais. Embora ainda não tenha sido publicado em revista científica nem passado por revisão de pares, a pesquisa chamou a atenção de especialistas sobre a possível necessidade de reforçar em breve a vacinação dos idosos no Brasil. “Teremos que, muito provavelmente, discutir com os dados de hospitalização e óbitos se devemos ou não priorizar esse grupo para revacinação quando isso [queda da efetividade] começar a acontecer”, diz no G1 o infectologista Julio Croda, pesquisador da Fiocruz e um dos autores.

Nesse sentido, é importante começar a testar o que acontece quando se aplica um reforço das vacinas de Pfizer ou de Oxford/AstraZeneca após a CoronaVac. Mas a dificuldade maior não é essa: é que faltam vacinas. Se a necessidade de revacinação desse grupo se confirmar, o país vai estar diante de escolhas difíceis e enormes desafios logísticos, políticos e de comunicação.

A repórter Fabriana Cambricoli, do Estadão, perguntou ao Ministério da Saúde sobre a eventual necessidade de reforço para idosos. A pasta informou que vai manter a estratégia de vacinação até que haja novas evidências.

Vale notar que a China começou a administrar essa e outras vacinas de desenvolvimento próprio a sua população ainda em 2020, mas, até o mês passado, apenas pessoas entre 18 e 59 anos podiam recebê-las. O motivo era que os ensaios das vacinas chinesas praticamente só haviam envolvido pessoas nessa faixa etária, de modo que só nela a eficácia e a segurança relatadas estavam garantidas.

Mas há uma enorme diferença entre a China e o Brasil: o país asiático conseguiu controlar seus casos e mortes, mesmo sem imunizantes. Aqui, a ausência de dados específicos para idosos era confrontada com a realidade de que os óbitos se acumulavam, e uma avaliação de riscos e benefícios apontava para a necessidade de oferecer a CoronaVac aos grupos que morriam mais. Essa vacina salvou muitas vidas. Para que outras mais sejam salvas, talvez seja preciso rever a estratégia, dependendo do que os números mostrarem em relação às hospitalizações e mortes.

Esta nota faz parte da nossa newsletter do dia 24 de maio. Leia a edição inteira. Para receber a news toda manhã em seu e-mail, de graça, clique aqui.

Leia Também: