Proteger as transnacionais, projeto do ministro

Mandetta declarou, em evento da indústria farmacêutica, que Brasil “jamais” deve quebrar patentes — o que favorece, por exemplo, tratamento gratuito contra HIV. Leia também: vacina em falta no RJ; e muito mais

.

MAIS:
Esta é a edição de 5 de julho da nossa newsletter diária: um resumo interpretado das principais notícias sobre saúde do dia. Para recebê-la toda manhã em seu e-mail, é só clicar aqui.

AFINADO COM A INDÚSTRIA

O ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta palestrou ontem na abertura de um seminário da Interfarma, principal entidade da indústria farmacêutica no Brasil. Disse que o país “jamais” deveria quebrar patentes de medicamentos, porque isso prejudica o setor privado. “Sei que cada um de vocês gasta hoje algumas centenas de milhares de dólares para fazer seus sistemas de compliance [para estar em conformidade com leis e regulamentos], e que essa palavra passou a ser obrigatória nas empresas”, disse.

A quebra de patentes é muito incomum. Por aqui, apareceu em 2007, com Lula no governo e Temporão à frente da Saúde. E foi para o Efavirenz, medicamento integrante do coquetel anti-Aids. A medida fez o país economizar um tanto, já que a dose do produto original custava mais de 15 dólares, contra 43 centavos do genérico. 

Segundo a Agência Brasil, Mandetta também “disse ser o setor privado que produz, cabendo ao governo o papel de estimular iniciativas de produção”.  É sempre bom lembrar que o país conta com uma  rede de produção pública de medicamentos voltados para as necessidades do SUS, muitas vezes negligenciadas pelas grandes farmacêuticas. Comentamos aqui, ainda na semana passada, que a Fiocruz foi requisitada pelo Ministério para produzir milhões de unidades de medicamentos que estão em falta. 

PASSOS LARGOS

Durante a madrugada, após mais de 16 horas de deliberação, a comissão especial aprovou o parecer do relator Samuel Moreira (PSDB-SP) sobre a reforma da Previdência (aqui, como votaram os deputados). O texto prevê a aposentadoria apenas a partir dos 65 anos para homens e de 62 para mulheres, com ao menos 20 e 15 anos de contribuição respectivamente. Ou de 25 anos, no caso do serviço público. A matéria deve ir a plenário, em primeiro turno, até o fim da semana que vem. E talvez já tenhamos também o segundo turno, se o governo conseguir uma manobra: aprovar um requerimento para quebrar o intervalo necessário de cinco sessões entre o primeiro e o segundo turnos. É uma corrida para aprovar o texto antes do recesso. 

No último minuto, narra o El País, os ruralistas conseguiram uma vitória: foi retirado do projeto um artigo que suspendia a isenção previdenciária ao exportador rural, ao custo de 8 bilhões de reais em economia para os cofres públicos.

O mesmo não se pode dizer de outros apoiadores de Bolsonaro. Policiais e agentes de segurança protestaram pelo fato de deputados do governo terem mantido as regras para sua aposentadoria. “PSL traiu a polícia do Brasil” e “Bolsonaro traidor“, saíram dizendo. PMs e bombeiros conseguiram manter o direito de se aposentar com integralidade e paridade sem idade mínima e com 30 anos de contribuição, mas isso não foi levado a outras categorias, como policiais federais e rodoviários.

Antes do plenário, um empurrãozinho: como (mais uma) forma de atrair congressistas, o governo federal negociou destravar pelo menos 241 obras do PAC que não ficaram prontas antes do prazo final para sua conclusão, em dezembro do ano passado. Vai ser editada uma portaria estendendo o prazo até junho de 2020 – ano de eleições municipais. 

Paulo Guedes não está plenamente satisfeito, e segue na defesa da capitalização. Mas já volta a falar de seus outros planos: reforma tributária e pacto federativo. E uma das características do “pacto” deve ser o fim da obrigatoriedade de o governo investir valores mínimos em saúde e educação. 

DIREITOS DEMAIS

Ontem, em transmissão ao vivo no Facebook, Jair Bolsonaro não mencionou nada sobre a reforma da Previdência, mas falou sobre trabalho infantil. Disse que trabalhou “duro” na infância em uma fazenda e não foi prejudicado em nada. “Quando um moleque de nove, dez anos vai trabalhar em algum lugar está cheio de gente aí (dizendo) ‘trabalho escravo, não sei o quê, trabalho infantil’. Agora quando está fumando um paralelepípedo de crack, ninguém fala nada”. Ainda completou: “Eu não vou apresentar nenhum projeto aqui para descriminalizar o trabalho infantil porque eu seria massacrado“. Para o presidente, é “tanto direito” que a juventude não vai para “a linha certa”. É claro, ele também contou que aprendeu a dirigir e a usar armas na infância. 

E a ministra Damares Alves disse ontem, em seminário, que “a corrupção é a maior violação de direitos humanos no país”. 

ESCORPIÕES DE BRASÍLIA

No Outra Saúde, Paulo Capel Narvai fala da morte recente de Christian Silva de Jesus, de quatro anos, após uma picada de escorpião em Brasília – mesmo tendo sido atendido prontamente, faltou a ele uma dose do soro antiescorpiônico. Mas Capel vai além de Christian. Fala de um certo… Tityus politicus, o escorpião-político que aparece em várias unidades federativas e que registra várias infestações em na capital do país. “São espécimes de escorpião-político, por exemplo, ministros de Estado que, ao invés de liderarem e defenderem políticas públicas de que estão incumbidos, optam por agredir essas políticas, desmontando-as e se valendo delas para fazer proselitismo partidário-eleitoral. Ao vociferar contra o próprio Estado e as ações de governo, buscando tirar proveito pessoal ou partidário dessas agressões, incorrem em incúria administrativa”, escreve o professor. 

EM FALTA

A vacina pentavalente está em falta em unidades de saúde de São Paulo, Minas, Bahia, Goiás, Rio Grande do Sul e Rio de Janeiro, informa a Rede Brasil Atual. Ela é aplicada em bebês de dois, quatro e seis meses. O Ministério da Saúde confirmou o atraso, mas não há previsão de normalizar as entregas. 

ELE NÃO ACEITA

A guerra pela mudança na rotulagem de alimentos é dura. E também foi duro o tom de um vice-presidente da Nestlé, durante uma importante feira de alimentos e bebidas em São Paulo, o fórum da Fispal Tecnologia: “Não vamos nunca aceitar e vamos até o fim. Vamos fazer o que tivermos que fazer, se o Estado pretender tutelar o consumidor naquilo que ele pode ou não consumir, seja como alimento, seja como bebida. Vamos até o fim”, disse Flávio de Souza sobre o modelo que obriga a adoção de selos de advertência para produtos com muito sal, açúcar e gorduras, que é proposto pela Opas e mostra bons resultados onde foi implantado. Completou: “Nós estamos falando de um alimento, não estamos falando de um medicamento. Tem alguns modelos de rotulagem frontal que são piores do que tarja preta de remédio ou são piores do que símbolo de perigo em um defensivo agrícola”.  Quem conta é Guilherme Zocchio, n’O Joio e o Trigo

FANÁTICO

Andrew Bremberg, candidato de Donald Trump para representar os EUA na ONU, declarou que as vítimas de estupro e violência sexual não deveriam ser autorizadas a interromper a gravidez. Ele prometeu que, se confirmado, vai votar contra qualquer resolução da ONU sobre direitos fundamentais para sobreviventes de violência sexual, caso incluam o aborto.

No Guardian, Bergen Cooper e Beirne Roose-Snyder, diretores no Centro de Saúde e Equidade de Gênero, chamam a atenção para a atuação de Bermberg até aqui – nas palavras dos autores, ele é um “perigoso fanático anti-aborto”. Se orgulha de ter impulsionado a chamada ‘regra global da mordaça’, política que impede que organizações estrangeiras recebam assistência dos EUA caso atuem com informações, serviços e referências de aborto legal ou trabalhem pela legalização em seus países  A política já existe há décadas, sendo abandonada ou retomada conforme o governo. Sob Trump, foi endurecida e ampliada – atinge agora quase todos os fundos de assistência médica global e já cortou o financiamento de programas voltados para questões como HIV / Aids, saúde materno-infantil, malária, tuberculose, planejamento familiar e saúde reprodutiva, nutrição e zika.

MUITO SIMPLES

Falando no governo Trump… O departamento de Segurança Interna dos Estados Unidos alertou a superlotação e a insegurança nos centros de detenção de imigrantes ilegais no Texas, que trariam riscos à saúde e tanto de agentes dos centros como de imigrantes. Segundo o relatório, crianças menores de sete anos chegam a ficar duas semanas desacompanhadas aguardando transferência. Mas o presidente fez pouco caso das informações: “Se os imigrantes não estão contentes, diga a eles que não venham. Problema resolvido!”. 

APROVAÇÃO PREOCUPANTE

Ontem a FDA (agência reguladora dos EUA, como a nossa Anvisa) aprovou um novo medicamento para tratar pacientes com mieloma múltiplo. O problema é que a decisão ignorou os alertas de um painel de especialistas que se preocupam com a toxicidade da droga, argumentando que os benefícios não superariam os riscos. Foi uma aprovação acelerada, baseada em um ensaio clínico não-randomizado (todos os pacientes inscritos receberam o mesmo tratamento, ou seja, não havia um grupo recebendo outro tratamento ou mesmo um placebo, para comparação). O teste mostrou resposta de 25% dos pacientes – mas mostrou também reduções de plaquetas e glóbulos brancos, hemorragias graves e potencialmente fatais, além de infecções. O remédio vai ser vendido pela Karyopharm Therapeytics, sob a marca Xpovio. E as ações da empresa subiram 36% após a liberação. 

NOVA PRESIDÊNCIA

O Conasems, que representa as secretarias municipais de saúde, elegeu seu novo presidente esta semana.Vai ser Willames Freire Bezerra, secretário de Pacatuba, no Ceará,  Mauro Junqueira, deixando o cargo, publicou em vídeo o balanço da gestão.


Leia Também: