Resenha Semanal

20 a 27 de setembro 2019. A necropolítica faz mais uma vítima no Rio de Janeiro, além de revelações incríveis em níveis supremos… Anagramas ajudam desvendar a semana política.

Anagrama: desembaralhe as letras e descubra um agente da morte

A semana foi dominada pelo assassinato da menina Ágatha, de 8 anos, pela polícia do governador Wilson Witzel, do Rio de Janeiro. Ela foi alvejada pelas costas e morreu. A PM alegou que houve tiroteio e que poderia ser uma bala perdida. Mas testemunhas, incluindo o motorista do veículo onde estava a menina, afirmam que os únicos tiros disparados partiram da PM. O presidente, o governador Witzel e o ministro Moro demoraram a soltar notas. Ninguém pediu desculpas.

Li que o número de mortes por suicídio de policiais militares no Brasil é maior do que as mortes em serviço.

Cadernos do nacionalismo coxinha

Já Gabriel Monteiro, que é um PM e integrante da organização liberal-fascista MBL, foi ao velório de Ágatha para provocar e filmar. Ele faz o mesmo que outro membro do MBL, o infame Arthur do Val, que tem o canal de youtube “Mamãe falei”. Ele vai a eventos de esquerda para humilhar e ridicularizar as pessoas na frente da câmera. Aí edita o vídeo e publica. O PM em questão, o Gabriel Monteiro, socou no rosto um moço que discutia com ele, e depois fugiu de carro.

O impacto da notícia foi grande, e chegou a influenciar a votação dos vetos do presidente à Lei do Abuso da autoridade. A maior parte dos vetos foi derrubada pelo Congresso, incluindo o famigerado “excludente de ilicitude”, que permitia ao juiz diminuir ou cancelar uma condenação de policial que tivesse matado em serviço sob “escusável medo, forte emoção ou surpresa”.

Crianças da Favela da Maré prepararam uma cartilha para policiais. Ensinam o que não devem fazer quando agem na comunidade. Será entregue ao governador Witzel na semana que vem.

O Supremo Tribunal Federal formou maioria sobre uma questão procedural que tem consequências para o processo de Lula. A sessão foi suspensa, mas é um forte golpe contra a Lava Jato, que usou e abusou do tal procedimento.

Mas a fofoca da semana ficou por contas de certas animosidades supremas…

Anagrama: desembaralhe as letras para descobrir magnífico armado.
Internacional de extrema-direita: círculos afetivos

O discurso de Bolsonaro na Assembleia Geral da ONU dominou o noticiário por uns dias. Não exatamente surpreendeu: agressivo, isolacionista, racista, faux-nacionalista, negacionista e de confronto – e mentiu afirmando que “fui esfaqueado por um militante de esquerda”.

As reações foram as esperadas: a extrema-direita adorou “as verdades”, a esquerda lançou as mãos ao ar em desespero, citando muito as reações internacionais, todas negativas. Bolsonaro virou o vilão global.

Darling, you make me blush!

O anunciado encontro com Trump se resumiu a um rápido aperto de mão. Parece que o presidente americano teria dito a Jair: “I love you”.

Madalenas da semana. Desta vez as fichas cadentes atingiram o colunista conservador Demétrio Magnolli, que agora pede Lula Livre. Também o economista neoliberal Armínio Fraga afirma agora que é preciso também gastar em áreas públicas como a educação, para equilibrar os efeitos nocivos do neoliberalismo: “e mesmo economistas mais liberais já admitem incorporar a política social na formulação de políticas econômicas”… Santa ficha cadente!

Além disso, Aloysio Nunes, o pessedebista e ex-chanceler de Michel Temer, agora considera que houve uma “manipulação política do impeachment” pela força-tarefa da Lava Jato e pelo ex-juiz Sergio Moro. Foi golpe e todos sabíamos!

Querido diário: tem chovido muito…

Além disso, em entrevista, o ex-procurador-geral da República, Rodrigo Janot, afirmou que não tem “nenhuma dúvida de que Dilma não é corrupta”, ao contrário do que afirmou em processo em 2016.

Os jornalistas que trabalham na mídia conservadora eram proibidos de se referir a Bolsonaro como alguém de extrema-direita. Na Folha de S.Paulo chegou a circular uma ordem por escrito com a proibição, durante a campanha eleitoral de 2018. Mas agora a Globo passou a falar do extremismo do presidente…

A imprensa ficou bombando um nome ligado ao empreendedorismo para a presidência. Esperam assim ressucitar os “valores liberais”, poluídos pelas recentes escolhas tóxicas da direita e centro-direita.

Anagrama: desembaralhe as letras para achar esperança liberal.

Tomou posse o novo Procurador Geral da República, Augusto Aras. O apontamento é considerado pela imprensa como derrota de Sérgio Moro.

Anagrama: desembaralhe as letras e descubra uma personagem das guerras culturais,

Roberto Alvim, diretor do Centro de Artes Cênicas da Funarte, usou seu Facebook na noite de ontem para atacar uma prestigiada atriz brasileira, que apareceu numa foto de publicação como uma bruxa a ser queimada. Ele se indignou e escreveu: “Um amigo meu, bem-intencionado, me perguntou hoje se não era hora de mudar de estratégia e chamar a classe artística pra dialogar. Não. Absolutamente não. Trata-se de uma guerra irrevogável (…) Temos, sim, que promover uma renovação completa da classe teatral brasileira. É o único jeito de criarmos um renascimento da Arte no Teatro nacional. Porque a classe teatral que aí está é radicalmente podre e com gente hipócrita“.

Conversava com R e ele disse que aquele pânico que deu na posse de Bolsonaro e meses seguintes meio que passou. Ainda temos medo, mas deu para sacar algumas práticas usuais da gangue e nos defender. Foi a Vaza Jato, disse, que mudou o cenário: o consórcio do golpe, pelo menos em parte, foi contido e a Lava Jato está em plena retirada. Mas a violência do regime contamina todas as relações sociais, e forças de repressão se sentem à vontade para abusar de sua autoridade.

Surpreende que Jair esteja tão empenhado em alienar aliados. A bancada do PSL perdeu deputados e está em pena briga interna. A presidência não está socorrendo nem Moro nem Dallagnol, e tem imposto nomes seus para cargos-chave de várias instituições, para blindar a si e a seus filhos.

Já o dito centro e os tucanos e liberais estão buscando cada vez mais se distanciar do filho que criaram ao abrir o esgoto em 2016. É bom que eles retornem ao campo democrático, mas me ponho a pensar qual é a arma secreta que o clã Bolsonaro acredita ter em mãos, pois eles não precisavam alienar tanto assim a direita e o centro: os liberais e conservadores não têm plano próprio, eles ainda dependem totalmente do governo que lhes rouba e implementa as pautas.

Se a economia estivesse bombando, o “mercado”, “líderes empresariais” e imprensa não estariam incomodados com o autoritarismo de Bolsonaro.

Então creio que ainda está nas cartas um putsch. Olavo de Carvalho postou vídeo onde pedia a formação de milícias bolsonaristas obedientes ao presidente. Ademais, bolsonaristas estão contatando policiais de todo o país para fazer gratuitamente o curso online de filosofia do astrólogo. A República Miliciana está nas cartas…

Uma vez como tragédia…

Mas os problemas da esquerda e sua paralisia institucional continuam.

Anagrama: desembaralhe as letras e descubra o nome de um personagem da política brasileira. Dica: inversão de perspectiva dá dimensão real.

Tenho acompanhado a novela do Brexit na Grã-Bretanha e dá para ver padrões comuns a Trump, Bolsonaro e Boris Johnson. Também na Inglaterra a extrema-direita está queimando a centro-direita, atacando a esquerda e usando as instituições para golpes constitucionais. Apesar de acuado pelo parlamento e por uma oposição decidida, Johnson joga pesado na narrativa do “povo contra o parlamento”, apresentando-se como “anti-establishment”, incitando a violência política.

Como aqui e nos EUA, Johnson afirma uma coisa na imprensa de manhã, e de tarde o oposto nas redes, o que cria uma colisão de versões onde no fim nada importa. Ele nunca assume que mentiu, nunca pede desculpas.

Já vimos esse filme…

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