Resenha Semanal

28 de junho a 5 de julho 2019. Atos em todo o Brasil sinalizam guinada à direita e fusão Moro-Bolsonaro. Os vazamentos da Vaza Jato continuam, mas não parecem romper a blindagem do ministro.

A semana vê a temperatura política aumentada, mas nada parece ter mudado muito. Os factóides até abundam (vaia ao presidente no Mineirão, depoimento de Moro na Câmara, novas revelações do Intercept, Olavo de Carvalho pregando o fechamento e cassação do registro do PT), mas o ministro da Justiça Moro não cai e nem é investigado. A operação abafa parece estar funcionando por ora. Mas a híper-polarização está em curso, e agressões dentro da direita parecem indicar uma guinada à direita no bolsonarismo. O morismo agora se fundiu ao bolsonarismo, e agora ambos têm interesse no ataque às instituições.

Saíram na sexta novos diálogos entre Moro e Dallagnol, para embaraço destes, pois seu relacionamento é muito íntimo. O ministro da Justiça mentiu ao ex-ministro do Supremo Tribunal Federal Teori Zavascki para manter um dos casos em Curitiba, onde ele (Moro) julgava os processos da Operação Lava Jato em primeira instância quando era juiz.

Pode ser que Moro se fortaleça com as revelações e não se enfraqueça como deseja muito a esquerda. Para esta, a vaia no estádio, a desmoralização de Moro, a baixa adesão ao ato pró-Lava Jato indica aberturas à frente. Até no boteco onde escrevo e que tem uma mesa bolsonarista os garçons ontem faziam abertamente piadas com “ Bolsonaro, Malsonaro e Abandonaro!”

Mas, como ter certeza?

30 de junho

Bolsonaro esteve no Japão para o encontro do G20. A imprensa de esquerda frisou muito o isolamento do presidente: há um vídeo que rola nas redes onde Bolsonaro está num canto da foto grupal, meio perdido. A Memesfera congestionou com imagens de Putin e Bolsonaro.

O Intercept publicou mais diálogos da Lava Jato, com procuradores falando mal da estratégias de Moro. Veja deu que uma testemunha citada nos diálogos foi procurada realmente por procuradores a mando do então juiz. O depoimento de Léo Pinheiro foi objeto de conversas no Telegram, e revelam que não havia “caixa de propina” separada, o que costa do processo e foi peça importante para a condenação de Lula.

Nos diálogos publicados, havia erros de edição, que, mesmo depois corrigidos, deram margem para que a Lava Jato e imprensa amiga, incluindo a Globo, lançassem sombra sobre a autenticidade do vazamento. Eles tentaram muito.

Teve o ato pró-Lava Jato no domingo. Fui e escrevi um relato separado:

No geral, o número de pessoas presentes na manifestação por Moro nem foi tão grande, visivelmente menor que da última manifestação semelhante em São Paulo. Mas de outra forma sinalizou claramente que o morismo agora é igual ao bolsonarismo, e que só resta a Lava Jato sair do armário e fazer política abertamente. Na Paulista, um confronto entre o MBL (ligado ao DEM de Rodrigo Maia) e o Direita Sâo Paulo (ligado ao PSL de Bolsonaro), indica que o governo está guinando à direita – e agora com Moro.

Li uma interessante análise de Bruno Torturra, que também foi à manifestação. Dentre outras coisa, ele aponta como o ethos da política está agora evangélico, isso de existir um estado do Bem, um lugar da virtude a partir de onde a pessoa se defende contra o Mal, que quer tirá-lo de lá. Assim, vale qualquer coisa para a pessoa de bem se defender do Mal, mesmo praticar atos criminosos. Juiz evangélico, policial cristão… Lula já foi colocado como o demônio corrupto que quer destruir a Lava Jato. A esquerda é, sob este ponto de vista, por definição corrupta, assim como a política institucional representativa, a negociação e o diferente. Parece que apenas vai ter aprofundamento do ódio bolsonarista, a reiteração. Torturra apontou como a direita ainda não conseguiu criar novos inimigos, eles não tinham palavra de ordem contra Glenn ou o Intercept. Ainda cantam a canção do petista bolivariano (a roubalheira do PT está acabano).

1 de julho

Ainda repercute a viagem de Bolsonaro ao Japão: teria convidado Angela Merkel para vir explorar a Amazõnia, convidou Macron ao Brasil para ver que não é tudo isso o desmatamento, falou da psicose ambiental, que quer tratar índios bem, e que os europeus já destruíram sua mata nativa e agora querem impedir-nos de fazer o mesmo.

2 de julho

Repercute nota do Exército homenageando um militar alemão, morto no Brasil por engano (o alvo era o assassino boliviano de Che Guevara) pela guerrilha de esquerda nos anos 1960. Mas ele tinha sido militar durante a guerra, isto é, ele foi oficial nazista que combateu as tropas aliadas. Saiu no site do Exército.

O general Heleno falou em comício de domingo, discursando duramente contra a esquerda, de boné. Mesmo assim, Carlos Bolsonaro atacou-o pelas redes, indicando que Heleno estaria em processo de fritura e pode ser o próximo militar degolado pela “ala ideológica” do governo. Carlos escreveu confusa mensagem, mas disse claramente que não confiava no general e que recusara a proteção que poderia pleitear de uma equipe de segurança sob responsabilidade de Heleno.

O Estadão escreveu que “é muito arriscada a estratégia do governo de atiçar manifestações”, mas fica quieto quando o assunto são as transgressões do ministro Moro.

Bolsonaro foi vaiado no estádio onde iam jogar Brasil e Argentina. Se foi a maioria ou não, difícil dizer. Pode ser significativo, pode ser trivial…

3 de julho

O ministro Moro vai à Câmara dos Deputados em Brasília para falar sobre os vazamentos e desvios de conduta. Vi pouco, e nada de muito novo: ele tergiversou e se ateve à sua defesa escalonada (não é autêntico, se for não importa, e se importar é contra a corrupção). Tudo terminou em bafon depois de umas 9 horas de trabalhos. O tititi que ganhou as manchetes foi o deputado do PSOL Glauber Braga, que chamou o ministro de “Ladrão”. De resto, quem apoia Moro achou que ele foi bem, e quem não apoia achou que ele se afundou ainda mais.

Mas o fato alarmante saiu no site de extrema-direita o Antagonista: a PF de Moro teria pedido à COAF relatórios das movimentações financeiras de Glenn Greenwald. Questionado sobre isso na Câmara, o ministro da Justiça desconversou.

Se isso for verdade, é altamente perigoso e inédito, podendo sinalizar o fechamento geral do regime, ficando aberto e escancarado que a Lava Jato faz mesmo lawfare e o bolsonarismo vai propiciar a perseguição. A imprensona não repercutiu muito, o que é ainda mais assustador. A Lava Jato existia no abismo entre o Direito e o Jornalismo, e muitos veículos agora tem achado difícil admitir a cumplicidade. É o mais grave atentado à liberdade da imprensa desde a redemocratização, porque se valendo do poder de Estado, do comando da Polícia Federal, para interromper a divulgação de notícias de interesse público.

Ao invés de investigar as alegações sobre as atividades da Lava Jato, a Polícia Federal investiga o jornalista. Nem ele nem Dallagnol entregou seu celular para perícia, e já admitiram que apagaram todas as provas contidas no Telegram. Alguns jornalistas lembram de outras arbitrariedades de Moro, como a condução coercitiva do blogueiro Eduardo Guimarães.

A reputação de Moro desmoronou, mas sua blindagem ainda não caiu. Pode ser que tudo caia de repente. Pode ser que feche tudo antes.

Do lado da esquerda e da legalidade, a situação e comportamento do ministro e dos procuradores é insustentável, alarmante e se agrava a cada dia, podendo arrastar todo o país para o inferno. Do lado da direita, se a Lava Jato cair e a reputação de Moro for invertida, nada mais restará do ódio moralista que sustentou e sustenta Bolsonaro. Lula solto é o símbolo da derrota histórica e fracasso do projeto de poder de toda a direita.

Alarma que nenhum ministro do Supremo Tribunal Federal tenha se pronunciado de ofício. E a Operação abafa parece estar dando certo: as revelações escabrosas não parecem surtir muito efeito…

4 de julho

Alberto Fernandez, candidato à presidência na Argentina, visitou Lula na cadeia. O Papa lançou vídeo sobre a imparcialidade de juízes!! Vi um vídeo da mensagem, nem sei se é o original. Mas tem uma encenação de um tribunal onde aparece um apartamento muito parecido com o triplex do Guarujá! Gente, todo mundo no exterior sabe (incluindo o Chomsky!), só no Brasil ninguém admite que Moro deve renunciar!

Já Jair Bolsonaro foi aos EUA participar das celebrações da independência americana.

Léo Pinheiro soltou carta dizendo que não foi coagido pela Lava Jato.

Novas revelações da Vaza Jato prometidas para esta sexta, na Veja (é só tapar o nariz! E depois, a Abril mudou de dono, enfim…).

Olavo de Carvalho pregou o fechamento e cassação do registro do PT e do PSOL, por pertencerem ao Foro de São Paulo.

Um estudante da PUC de São Paulo morreu depois de ser esfaqueado em briga com segurança.

A Reforma da Previdência vai avançando e recebendo mudanças e emendas conforme caminha. A celeuma acerca de regimes especiais para policiais e bombeiros continua acesa. Os PMs e bombeiros terão regime igual aos militares, que têm projeto separado. Mas as outras categorias de policiais, como policiais e delegados federais, policiais rodoviários federais, policiais civis, guardas municipais, agentes da Abin (Agência Brasileira de Inteligência) e agentes de trânsito não serão poupados.

Na madrugada de ontem os deputados bolsonaristas aprovaram isenção de R84 bilhões para os ruralistas. O dinheiro sairá da Previdência.

Canalhas.

Quero muito ver PM garantido bater em manifestante que protesta contra a Reforma da Previdência ou contra a carestia… vai ser muito cruel. Se a reforma fosse boa, eles estariam dentro.

Saíram mais vazamentos do Intercept, pela Veja. Vai ter que ter uma hora em que vai ficar embaraçoso demais, não é possível. Nem o Moro vai aguentar seis meses assim…

Até o Faustão deu conselho a Dallagnol, recomendando que os procuradores falassem em linguagem mais simples, para que o povão entendesse…

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