Cinedebate: sem floresta, não há civilização

Em SP, encontro examina o que poucos sabem sobre as matas. O retrocesso das leis ambientais, em favor do dinheiro. Como o aquecimento já afeta os territórios indígenas. E o projeto do MST para transformar a Agricultura brasileira

Integrantes da etnia Mehinaku, no Alto Xingu: sob secas e ciclones, eles já sofre consequências das mudanças climáticas
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Por Antonio Martins | Imagem: Fiona Watson

MAIS:
> Cinedebate: “Sem floresta, não há civilização”
Exibição de A Lei da Água — Novo Código Florestal, de André D’Elia
Quarta, 11/9, às 19h, no Teatro Commune — R. da Consolação, 1218 — Metrô Higienópolis-Mackenzie

> Com Angela Pappiani (jornalistaNúcleo de Cultura Indígena), Márcio Automare (Instituto de Estudos Avançados-USP) e Gerson Oliveira (MST, Acampamento Marielle Vive) e Coalizão pelo Clima.
> Moderação: Pablo Mariconda (Associação Scientiae Studia)

> Entrada livre. Contribuição sugerida: R$ 15

Em dez dias, uma nova Greve Climática Global tomará as ruas de centenas de cidades do mundo. Terá, mais uma vez, forte presença dos muito jovens e claro sentido antissistêmico. Desta vez, com uma novidade: participação do Brasil – onde emerge, em resposta à devastação promovida por Bolsonaro, nova consciência ambiental. Em São Paulo, a mobilização espalha-se, articulada por uma Coalizão pelo Clima. As reuniões para organizar o protesto na Avenida Paulista (em 20/9, às 16h) reúnem dezenas; e multiplicam-se as atividades preparatórias (veja ao final).

Mas como compreender a fundo os problemas ambientais, de modo que a mobilização não se esvaia, passada a manifestação de rua? Nesta quarta-feira, em São Paulo, um novo Cinedebate, organizado em parceria pela Associação Filosófica Scientiae Studia e por Outras Palavras, ajudará a responder a esta questão. Estará em pauta o papel crucial das florestas, para manter o equilíbrio dos sistemas naturais e a própria viabilidade dos assentamentos humanos. Um filme e três debatedores abordarão o tema em suas diversas dimensões. O palco será, mais uma vez, o do Teatro Commune — um espaço para a arte e a política transformadoras.

O filme é A Lei da Água, de André D’Elia (trailler.abaixo). Produzido em 2014, quando diversas metrópoles brasileiras viveram escassez e racionamento hídrico, o documentário abordava, já então, algo que se tornou ainda mais claro com o passar dos anos. No Brasil, particularmente, o ataque à Floresta Amazônica repercute, de maneira quase automática, na piora drástica das condições climáticas em boa parte do país – seja em secas prolongadas, e cada vez mais graves, seja nas nuvens negras que convertem o dia em noite às três da tarde. O filme é uma denúncia, mas não um panfleto. Dá voz a agricultores e estudiosos, apresenta técnicas agrícolas sustentáveis bem sucedidas e casos onde a degradação ambiental avançada já impede a continuidade de qualquer tipo de cultivo ou criação de animais.

Após a exibição do filme, as falas de três debatedores. A jornalista Ângela Pappiani, que vive há décadas em contato com populações indígenas e cujo trabalho tem natureza antropológica (veja seus artigos em Outras Palavras), falará sobre a relação entre os povos originários e o clima. Ela relatará como, em suas própria atividades produtivas, estes povos estabelecem com a natureza uma relação em que não a veem como “recurso”. Por isso, respeitam limites há muito ultrapassados nas sociedades em que a ética dominante é a dos mercados. Ângela também narrará algo grave: os diversos casos, vividos por ela, em que as mudanças climáticas já perturbam comunidades indígenas. No Alto Xingu, por exemplo, secas extraordinárias já inviabilizaram a produção de mandioca dos Mehinaku, que têm nesta planta seu alimento essencial. Ventos nunca antes vistos, em forma de ciclone, extirpam o teto de palha das grandes ocas comunitárias.

Márcio Automare, economista e pesquisador associado ao Grupo de Pesquisa Filosofia, História e Sociologia da Ciência e da Tecnologia do Instituto de Estudos Avançados (IEA/USP), reportará sua pesquisa sobre a evolução (?) das leis ambientais brasileiras, desde a chegada dos europeus. Ele afirma, por exemplo: “Nossas milhares de regulações começam 1503, sendo no meu entender a melhor editada o Felipe II (1605), durante período que a Espanha reinou/governou Portugal. Simplesmente Felipe II proibiu a extração e exportação do Pau-brasil. Tal medida durou até 1640, quando os portugueses retomaram o governo das suas colônias e de imediato cassaram tal proibição, voltando a exportar o Pau-brasil. Trazendo para o contexto atual, semelhante ao que você faz hoje a agricultura e pecuária industrial, comandado pelo trágico agronegócio”. Márcio também mostrará as diferença entre o Código Florestal que vigorou até 2012 e o atual, assinado por Dilma Roussef, atropelado permanentemente pelos ruralistas. Ainda há pouco, o senador Flávio Bolsonaro, tentou dispensar a necessidade de se manter áreas de reservas florestais em propriedades rurais.

Gerson Oliveira, que integra a coordenação estadual do MST-SP e é um dos coordenadores do Acampamento Marielle Vive, poderá abordar um assunto que desperta cada vez mais atenção entre o público urbano: a proposta dos sem-terra para uma reorganização completa da Agricultura brasileira. Ela implica, é claro, a desconcentração da propriedade rural, por meio de uma Reforma Agrária. Mas vai muito além do combate ao latifúndio. Sugere o cooperativismo como forma principal de propriedade; a produção orgânica, ao invés do uso maciço de agrotóxicos; impostos sobre a exportação de commodities, para estimular a produção de alimentos. Este projeto já está em prática, em diversas regiões do Brasil. É ele, por exemplo, que converteu o MST no maior produtor de arroz orgânico da América Latina; ou que produziu um evento de enorme repercussão – a Feira Nacional de Reforma Agrária. Proibida este ano, pelo governador de São Paulo, João Dória, ela voltará com ainda mais força, em 2020.

As falas dos debatedores serão densas, porém breves. Além de compartilhar informação relevante, o objetivo do ciclo de cinedebates é articular consciência e ação para a Greve Global pelo Clima, em 20 de Setembro. Por isso, como no primeiro cinedebate da série, realizado há uma semana, a Coalizão pelo Clima estará presente e o público terá amplo espaço para se manifestar e articular.

OUTRAS ATIVIDADES PRÉ-GREVE GLOBAL PELO CLIMA

10/9| 18h00 – Lambe e panfletagem na USP
Biblioteca Florestan Fernandes – Avenida Professor Lineu Prestes, Tv. Doze, nº 350

12/9 | 17h-00 – Para além das queimadas (Debate)
Diretório Acadêmico de Gestão Ambiental – EACH-USP – Av. Arlindo Béttio, 1.000 – Ermelino Matarazzo

12/9 | 18h30 – Cinedebate: O Jabuti e a anta. Questões climáticas no Brasil
Casa Cultural Jaçanã – Av. Maria Amália Lopes Azevedo, 4180, Vila Albertina

13/9 | 11h00 – Ato contra a privatização do Jardim Botânico e do Zoológico
Av. Miguel Estéfano, 3.031 – Parque do Estado (Na frente do Jardim Botânico)

13/09 | 12:00: aula pública
introdução as mudanças climáticas, na saída do metrô República

13/9 | 19h00 – Política Climática no Brasil: Desafios (Debate)
Centro Cultural São Paulo – Rua Vergueiro, 1.000 – Paraíso

14/9 | 14h00 – 17h00 – Reunião da Coalizão pelo Clima São Paulo
Casa do Povo – Rua Três Rios, 252 – Bom Retiro

15/9 | 11h00 – 15h00 – Aula Pública: A Amazônia é logo ali!
Em frente à Secretaria da Presidência da República (Avenida Paulista, 2163 – Bela Vista)

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