A política como arte do impossível

Em sua última prisão, o revolucionário Louis Blanqui manteve as esperanças de novas formas de sociedade — mas remeteu-as ao infinito. Há uma estranha relação entre o fracasso diante do destino e a liberdade humana

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Por Nuno Ramos de Almeida | Imagem: William Etty, “Prometeu” (1820)

Blanqui esteve preso 37 anos. Na sua última prisão, nas vésperas da Comuna de Paris, escreveu um enigmático texto chamado “A Eternidade Conforme os Astros”. Páginas esquecidas que o malogrado pensador Walter Benjamin comparava a Baudelaire. Nelas, o homem das muitas conspirações dos iguais remetia para um universo frio e infinito as possibilidades de novas formas de vida e sociedade que triunfassem onde a humanidade tinha tropeçado. “Saberão por certo que o céu obedece às leis da igualdade, e encontra em si mesmo os recursos para escapar à morte. Mas saberão que esse combate da vida contra a morte é um drama que não tem nem começo nem fim, que obriga os que o tomam como modelo a travar um combate indefinidamente repetido, e certo apenas quanto a uma coisa: que nenhum final feliz se encontra no fim do caminho”.

Vendem-nos muitas vezes que a política é a arte do possível. E que qualquer acordo medíocre é melhor que uma divergência de princípios. É desta massa que é feita a atual Europa, em que se promete aos eleitores votarem nos candidatos a presidente da Comissão Europeia, mas no fim, o Conselho Europeu resolve mandar fechar esse circo de ilusões e vender os lugares de poder à melhor licitação negocial.

Num livro de Slavoj Zizek, A Europa à Deriva, encontram-se duas citações da obra de Oscar Wilde, “A Alma do Homem e o Socialismo”: “É muito mais fácil ter-se simpatia para com o sofrimento do que ter-se simpatia para com o pensamento”, acrescentando-lhe uma outra passagem de Wilde em que este defende que o simples horror ao sofrimento e a caridade em relação à pobreza não fazem mais que prolongar as suas causas e aliviar a consciência dos responsáveis por essa situação. “Tentam, por exemplo, resolver o problema da pobreza mantendo os pobres vivos; ou, no caso de uma escola muito avançada, divertindo-os. Mas isso não é uma solução: é um agravamento da dificuldade. O objetivo adequado é tentar reconstruir a sociedade sobre uma base em que tal pobreza venha a ser impossível. E as virtudes altruístas têm, sem dúvida, impedido a realização de tal desígnio”, conclui o autor de “A Importância de ser Ernesto”.

O drama é que populismos e fundamentalismos têm existido por bom motivos mas com más respostas. Como escrevia William Butler Yeats no “Segundo Advento”, “Aos melhores falta convicção, e aos piores / sobeja apaixonada intensidade”. Na sua célebre “Décima Carta”, o filósofo alemão Schelling dizia que a tragédia grega “honra a liberdade humana porquanto consente que os seus heróis combatam contra o poder desmedidamente superior do destino”, e concluía dizendo que “as impossibilidades e limites da arte” exigem a derrota do homem nesse combate. Mas essa derrota afirmaria em si a liberdade humana e as razões de uma revolta. 

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