Três caminhos diante de Marina Silva

Incendiar as eleições? Enquadrar-se às alianças conservadoras? Adiar aposta para 2018? Próximos dias revelarão muito sobre política contraditória e sistema em crise

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Incendiar as eleições? Enquadrar-se às alianças conservadoras? Adiar aposta para 2018? Próximos dias revelarão muito sobre uma política contraditória e um sistema em crise

Por Antonio Martins | Imagem: Mauro Filho

A morte trágica de Eduardo Campos, a apenas 50 dias das eleições de 5 de outubro, deixa em aberto a disputa pela presidência do Brasil. Volta todas as atenções, num primeiro momento, para Marina Silva, a vice de Eduardo que optou por não concorrer ao Palácio do Planalto há dez meses, quando trocou o posto promissor de segunda colocada nas pesquisas por um projeto de médio prazo – o de construir sua Rede ao abrigo do PSB.

O falecimento de Eduardo frustra este projeto. Obriga a ex-professora secundária a se expor ao eleitorado antes de constituir uma base sólida – e após o desgaste que sofreu perante parte da militância, decepcionada em face de sua escolha pragmática e moderada. Como não há vida para trás, Marina está agora diante de uma oportunidade e uma angústia imensas. Só não disputará a Presidência se não o desejar — porque alijá-la seria desmoralizante para quem o fizesse. Mas que postura assumir, como postulante ao poder? Há três cenários básicos – e uma vasta combinação de possibilidades intermediárias. Vale sondá-los.

Na primeira hipótese, Marina reencarna a condição de candidata anti-establishment, com a qual deixou o ministério do Meio-Ambiente no governo Lula, disputou a presidência em 2010 e angariou uma legião de apoios, em especial entre a juventude desacreditada do sistema político. Ela parte de um patamar importante, caso deseje sustentar esta postura. Nas últimas pesquisas em que foi apresentada aos eleitores, no início de abril, mantinha-se em segundo lugar na corrida ao Planalto, com 27% das preferências – doze pontos acima de Aécio Neves. Além disso, estava em ascensão.

Assumir esta postura radical até outubro reconciliaria a candidata com seus apoiadores históricos. Permitiria-lhe, além disso, eletrizar uma eleição até agora morna, do ponto de vista do debate programático. Ao enfrentar o sistema político tradicional e suas contradições, a acreana seria certamente abandonada e hostilizada – pela mídia, pelos financiadores de campanha, por ao menos alguns de seus atuais correligionários e aliados. Precisaria contar, essencialmente, com sua capacidade de comunicação, carisma e mobilização. Seria obrigada a provocar debate sobre grandes temas nacionais. Em certa medida, obrigaria tanto Dilma quanto Aécio a fazer o mesmo.

Mas se depararia com suas próprias contradições. Como manter tal atitude, por exemplo, diante do governador de São Paulo, Geraldo Alckmin – um aliado que ela não escolheu, mas aceitou? Como conciliá-la com o conservadorismo do eleitorado evangélico e seus “pastores”?

O segundo cenário é oposto ao primeiro e expõe outra face da candidata. Nesta hipótese, Marina opta por um casamento com, digamos, o lado obscuro de sua força. Nele entram não apenas o governador de São Paulo e os bispos intolerantes, mas também os economistas francamente neoliberais de que a ex-ministra se cercou, ainda antes de se aliar a Eduardo Campos. Por este caminho, ela utiliza sua fortíssima base de votos para apresentar-se, para todos os efeitos, como “grande esperança branca” contra Dilma. Atrairá muito apoio financeiro e será querida pela mídia.

Mas enfrentará grandes obstáculos e riscos – embora de outra natureza. Como convencer os antigos “marineiros”? Esperando que não se deem conta da mudança, durante campanha tão curta? Como reagiria o PT? Desafiado, não tenderia ele próprio a politizar a disputa, para manter seu eleitorado tradicional? Que representaria, para Marina, a hipótese de perder as eleições, mesmo concedendo tanto? Seria possível manter o capital político, após tal desconstrução de projeto e imagem?

O terceiro cenário é o mais imobilista. Nele, Marina assume a candidatura para ganhar tempo e “guardar lugar” – focada não em 3 de outubro, mas em 2018. Mantém-se nos próximos 50 dias como uma espécie de vice. Renuncia ao papel de protagonista. Acalenta o projeto de priorizar a construção da Rede, após as eleições. Ao invés de incendiá-las, contribuiu para o banho-maria.

Porém até esta hipótese conservadora guarda riscos. Como os seguidores da candidata, de um e de outro lado do espectro político, o interpretarão? Como esforço válido para ganhar tempo? Ou hesitação e recuo, diante de oportunidade histórica?

* * *

Os dilemas de Marina serão decisivos para sua trajetória pessoal. Mas lançam luz sobre algo muito mais importante: o declínio dos sistemas políticos atuais, da democracia de “baixa intensidade” que ainda não fomos capazes de superar.

Como aceitar que o debate permaneça tão pobre, limitado e dependente de escolhas individuais, numa época em que se abrem tantas oportunidades de diálogo direto entre os cidadãos? Por que assistimos, em todo o mundo, ao igualamento progressivo dos partidos, à captura da política pelo poder econômico – e não somos capazes, ainda, de apresentar alternativas?

Será ótimo se pudermos, além de assistir à luta de Marina ante seus impasses, caminhar alguns passos para superar os nossos.

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15 comentários para "Três caminhos diante de Marina Silva"

  1. VERA LIMA disse:

    A questão não é se Marina tem cacife ou não para ser Presidente, a questão importante (não a única e nem a mais) é que ela não tem sustentação política. Seu partido e coligação não tem sustentação política. Aí eu pergunto a vocês: se ela passar para o segundo turno, com quem ela comporá para vice no segundo turno? com a Dilma/PT ou com o Aécio/PSDB? E se ela for eleita, quem ditará as normas, PT ou PSDB? Esta é a realidade, façam suas escolhas.

  2. GERALDO MOTA disse:

    Eu não confio em SOCIALISTAS, principalmente quando se escondem por detrás de credos, bíblicas e igrejas, sejam elas católica ou evangélicas. O socialismo adotado pelos partidos brasileiros é inconsequente e improvável, pois a ideologia é vaga e insustentável sob o ponto de vista lógico da história, da tradição e da realidade política de nosso país. MARINA, para mim, é tão-somente uma caricatura eleitoral de curta duração.

  3. Esperamos que prevaleca o bom senso e a acreana deixe de trapalhar o Brasil .Ela é uma pessima administradora (vejam o atraso que ela provocou na política de meio ambiente) , Não cacife para ser presidente .Deus há de nos librar desta política mediocre ,,

  4. José Galvão disse:

    a análise vale desde antes, quando optou pelo PSB. Ela é a única alternativa do PSB e associados, ou então o suicídio político delas, Marina e coligação. O dilema é o mesmo de antes, não há como ganhar essa eleição do PT e o “investimento” na próxima será rateado entre Marina e PSB após o pleito. Não vejo como possam seguir juntos.

  5. Fabiana disse:

    Desculpa falar isso, mas pense como uma crítica construtiva, porque gosto muito do portal e de quem escreve aqui. O texto é tendencioso e vê uma Marina que aparentemente foi criada no inconsciente do autor. Faltou mais imparcialidade. Por exemplo:
    “Precisaria contar, essencialmente, com sua capacidade de comunicação, carisma e mobilização. Seria obrigada a provocar debate sobre grandes temas nacionais. Em certa medida, obrigaria tanto Dilma quanto Aécio a fazer o mesmo.” – Marina, como alguns poucos outros candidatos, defendem ótimos temas, mas não são apenas grandes debates. Marina é, por exemplo, contra o aborto até em caso de anencefalia. Além de deixar a desejar quando se trata de falar em economia.
    “mas também os economistas francamente neoliberais de que a ex-ministra se cercou, ainda antes de se aliar a Eduardo Campos.” Só para ressaltar o ponto de que o forte dela não é economia – não que precise ser, já que ela tem assessor e ministros para isso.
    A Marina entrou no PSB pelo Eduardo, e há muitas pessoas que não gostam dela ali dentro. Ela seria enfraquecida como cabeça de chapa e, se governasse, teria que aprender a fazer aliados, caso contrário não se sustentaria.
    E o final é pouco conclusivo. Não são partidos que são guiados pela economia, é o mundo. O capitalismo não é apenas uma forma econômica, infelizmente. Escolhas individuais, todas as fazem dentro do coletivo. Quanto ao enfraquecimento do debate, aí o problema é a fraca educação no Brasil. O governo não deixa de ser reflexo de uma sociedade rasa.

  6. Tião disse:

    ótima analise..só a data da eleição que não condiz….neste ano acontece no dia 5 de outubro..mas tá valendo..kkk

  7. Dinio disse:

    Com TRAÍRA… só temos duas alternativas:
    – Ser mordido por ela e, no máximo perder um dedinho, o que no caso do LULA não seria inédito, ele sabe muito bem lidar com este tipo de situação;
    – Comê-la frita em postas, enrolada na farinha de mandioca, com bastante limão, para não ficar indigesta, é uma delícia!

  8. Gilda Maranhão disse:

    Aliás, ela não aceitou aliança com o Alckmin. A Rede se recusou a apoiar o tucano, a história do material de campanha deixa claro isso. Esse blogueiro é mal intencionado.

  9. Gilda Maranhão disse:

    Erro 1: Marina não optou por não se candidatar, o registro do seu partido foi negado pelo TSE. Aliás, ela já se candidatou em 2010, com uma estrutura muito ruim, e deu em 20 milhões de votos.
    Erro 2: Ser candidata não depende só dela, depende do PSB, que não é o partido dela. Ela poderia até forçar a candidatura, mas a que preço? Não é uma decisão simples.
    Análise fraca, fraca.

  10. Evilasio Salvador disse:

    Parabéns Antônio pela lúcida análise das alternativas e da democracia brasileira diante de um morno cenário eleitoral.

  11. Nevitton Souza disse:

    Agora falta olhar para o partido (PSB). Seria prudente entregar uma campanha na mão de outro partido que se formará assim que Marina reunir os requisitos? Poderia Marina reunir a agenda de Campos à sua, negociando e apoiando com velhos rivais, ou, ao fazer o contrário, desestabilizaria o PSB? Talvez ainda haja espaço para outro candidato genuinamente do PSB protagonizar a chapa, mas quem?

  12. Boa análise, e acredito que a opção da Marina vai ser conservadora. Vai manter alianças pragmáticas e fingir que são programáticas e vai querer que os entusiastas da antiga Marina, aquela que supostamente enfrentou o status quo, engulam a balela. Quando os idealistas defensores de sua candidatura se derem conta as eleições já estarão acabadas.

  13. Jonatas Siva Meira disse:

    3 questões de ordem nacional em suas mãos e os dilemas a serem encarados no meio do caminho eleitoral. O q fazer? Seguir o curso das coisas feito um rio ou dialogar com os pares impares da “oposição”. Como seu eleitor, espero q sua decisão respeite os princípios ideológicos q a nortearam em sua campanha para presidente do meu país. Boas novas Marina Silva, em vossa decisão.

  14. Sonia disse:

    Mudança significativa do sistema político brasileiro é urgentíssimo! Saída única, plebiscito está aí pra gente convocar uma Constituinte exclusiva. Marina vai querer ocupar a vaga de candidata a presidência, com certeza, basta saber se o PSB deixará, o que eu acho pouco provável, já que a vice é uma filiada de fachada … pode ? Só Freud para explicar.

  15. Tudo é uma questão de se conhecer o caráter da candidata. Dilema ético em última instância. Ser fiel aos seus princípios seria o mais correto. O eleitor que compartilha desta mesma premissa certamente a escolherá.

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