Quem a facada atingiu?

Atentado contra Bolsonaro fere Alckmin, abençoa a união dos conservadores em torno da ultra-direita e sugere à esquerda que está em jogo, em outubro, algo maior

Atentado contra Bolsonaro fere Alckmin, abençoa a união dos conservadores em torno da ultra-direita e sugere à esquerda que está em jogo, em outubro, algo muito maior que uma disputa partidária

Por Antonio Martins | Vídeo: Gabriela Leite | Imagem: Francisco Goya, Duelo com porretes (1820-23)

As atitudes de quem deseja reumanizar e reencantar o mundo não podem ser simétricas às dos que agem em favor da barbárie. Jair Bolsonaro defendeu a tortura e o estupro, mas é exatamente por nos opormos à brutalidade que repudiamos o atentado a ele. Felizmente, tudo indica que o ex-capitão, afastado do Exército por planejar atentados terroristas, sobreviverá ao atentado. Mas as eleições já não serão as mesmas. Três novas tendências e questões emergirão.

Primeira: Bolsonaro unificará a direita. Havia, até agora, uma disputa acirrada entre ele e Alckmin – nos programas de campanha e na Justiça eleitoral. Nas pesquisas, o ex-capitão tinha treze pontos percentuais de vantagem, mas era atacado maciçamente na TV por seu adversário, que buscava explorar suas posições violentas e anti-humanitárias. Agora, Bolsonaro poderá se apresentar como vítima (real) desta mesma violência que defende. O ex-governador conseguirá reverter, em um mês e sob comoção, a disância que o separa?

Os mercados financeiros deram uma primeira resposta na própria tarde da sexta-feira. Houve uma reviravolta após o atentado. A Bovespa subiu; o dólar, que havia atingido RR 4,16, recuou. Já havia forte tendência, entra a elite financeira e o grande empresariado, de opção pela extrema-direita. Este movimento pode ter se consolidado. Portanto, a primeira vítima da facada pode ter sido Alckmin.

Segunda: está novamente aberta a disputa pelo papel de candidato anti-establishment. Em eleições com o país mergulhado em crise econômica, e em profundo desgaste do sistema político, aparecer como alternativa pode ser decisivo. Bolsonaro tentou ocupar o papel. Não havia conseguido até agora. As pesquisas o mostram, há meses, estancado em 22% das preferências dos eleitores – e provavelmente batido tanto por Marina da Silva quanto por Ciro Gomes, num eventual segundo turno. Para os eleitores, o candidato anti-sistema é, por enquanto, Lula, preso político com 40% das intenções e enorme poder de transferência de votos. Agora, muito provavelmente, o atentado permitirá que Bolsonaro volte a aparecer, para parte importante da população como alguém incômodo aos poderosos, e portanto merecedor de apoio.

Terceira questão: É necessário, aliás, investigar em profundidade as circunstâncias em que o ataque ao candidato se deu. As imagens mostram que o homem que investiu com a faca estava a três corpos de distância doe Bolsonaro. Minutos depois da facada, o filho do ex-capitão afirmou, nas redes sociais, que o ferimento havia sido “superficial”. Surgiram, em seguida, informações desencontradas sobre uma cirurgia [que agora parece confirmada]. A História está repleta de atentados forjados. Ocorreu na Alemanha, no incêndio do Reichstag. Ou no Brasil de 2010, quando José Serra, então candidato à Presidência, foi atingido por uma bolinha de papel, simulou tratar-se de um objeto metálico e chegou a se submeter a tomografia de crânio. Qual é, de fato, a natureza do ferimento? Quem é o autor do atentado? Que o levou a cometer tal ato? Ao país, interessa o esclarecimento cabal destas questões.

Quarto ponto: O atentado mostra para a esquerda que não estamos diante de uma disputa eleitoral qualquer, regida pelas velhas táticas da luta partidária pelo governo. Está em jogo o futuro do país. Os que desejam manter a agenda de retrocessos imposta há dois anos – e, se possível, aprofundá-la – farão de tudo para isso. As relações entre Haddad/Lula, Ciro Gomes e Boulos precisam ser revistas.

Há, na sociedade, um grande campo antigolpe, muito provavelmente majoritário. Este campo correrá o risco de continuar a se dividir entre três candidaturas? Os fatos de hoje não mostram que acima das disputas partidárias é necessária uma unidade de quem deseja reverter os retrocessos pós-golpe? Não é possível voltar a pensar num “Geringonça Brasileira”, que se traduza desde já numa articulação clara entre o PT, o PDT, o PCdoB e o PSOL? Significaria estabelecer desde já um programa comum de resgate do país e dos direitos; politizar a disputa pelos Legislativos, trabalhando em conjunto pela eleição de uma vasta bancada pela revogação dos retrocessos; estabelecer planos compartilhados para um governo de reconstrução nacional. Isso tudo não daria às eleições um caráter muito mais denso que a mera disputa partidária?

Os tempos aceleram-se. Teremos, apóso feriado, a divulgação de uma nova pesquisa do Datafolha (em 10/9). É difícil prever os fatos que virão. Mas é claro que os acontecimentos da sexta-feira projetam as eleições num novo cenário, que exige respostas não convencionais. Saberemos compreender este desafio? É uma pergunta a ser respondida nos próximos dias.

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6 comentários para "Quem a facada atingiu?"

  1. Aída Paiva disse:

    Antonio Martins, eu sonho com a uniao de todos os partidos inclusive o PSDB. Sonho com o fim das brigas entre os partidos e o comeco de uma politica de resolucao de problemas e quem souber resolver bem os problemas ganha um cargo de politico. O politico que estivesse bem financeiramente poderia servir a nacao brasileira. O bom politico que estivesse mal financeiramente teria seu salario. Eu gostaria que o Brasil e todos os partidos existentes se unissem pra resolver os nossos problemas. Chega de briga, chega de confronto, chega de trocas de odio. Brasileiro unido jamais sera vencido!

  2. Valéria Barbalho disse:

    “Não é possível voltar a pensar num “Geringonça Brasileira”, que se traduza desde já numa articulação clara entre o PT, o PDT, o PCdoB e o PSOL?”
    Concordo integralmente com a análise, porém a liderança que tem legitimidade e capacidade para fazer essa articulação está impedida de até mesmo falar com as lideranças dessas correntes, sequestrada que está pelas instituições golpistas que pretendem substituir a soberania popular pelas suas vontades.

  3. Sonia Diemer disse:

    Olá.
    Primeiramente, gostaria de acordar, que não há “futuro” para um país como o Brasil atualmente, pois enquanto o povo não olhar para sua História e a partir dela começar uma mudança, não há “futuro”, a demais futuro é uma palavra, pois o que precisamos é sempre do Presente, só existe presente com análise do passado, e isso, o povo já mostrou, que não consegue ou não quer fazer, já que permanece no que chamam de cultura “carnaval”, “futebol”, que inclusive hoje de estádio passou para arena, o que lembra o antigo Império Romano (incitação de violência). Porque o “povo em sua grande maioria, iria querer sair do sistema paternalista? Não né? Aí vem a responsabilidade, não terão alguém para lhes dar bolsa isso, aquilo e sei lá o que mais, aí terão que assumir seu papel de cidadãos e isso, requer consciência, requer sair da zona de conforto, de vítimas, esse é o espaço que deixam para que seja ocupado, pelos todos políticos que hoje enchem esse cenário Brasil, de vergonha. Imagina, que vergonha um país, onde a maioria de um “povo” quer na presidência, um presidiário, que está preso por lavagem de dinheiro, corrupção, com provas físicas,; imagina um povo, que permite que alguém ocupe a presidência sem ter sido eleito para tal e faça os estragos que está fazendo, imagina um “povo” que aceita, que as mesmas criaturas que já estiveram lá e não fizeram nada, quando tiveram a oportunidade, continuem candidatos, nossa isso é que é filme de terror, uma juventude alienada a um celular, marcados e tatuados por uma mídia adoecida e uma barbárie instalada, recolhendo tudo que aparece para dentro do país, ainda com o nome de “solidariedade”, é o CAOS da ignorância e do berço esplêndido. Infelizmente a maioria desse “povo”, quer “balada”, olha só o nome da dita diversão, isso justificado é claro, com o nome de “moderno”, ah, tem até uma propaganda, que diz “isso é coisa de jovem”, discriminação do que é adulto ou idoso, ou criança, propaganda de muito mau gosto, nada criativa, onde as pessoas deveriam não adquirir esse produto, mas isso, é para quem analisa, pensa sobre. Os jornalismos, que dão ênfase ao que rende muito, blá blá blá, as intelectualidades, palavras vãs, onde precisamos de ação, precisamos de um Bento Gonçalves, de uma Anita Garibaldi, no entanto temos pessoas sem ideais maiores do que seu próprio umbigo, quase todos siliconados, pirciados, tatuados, caminhando as tontas, enquanto um bando de oportunistas destroem o que ainda resta, se resta, de HUMANISMO, em alguns…. Essa facada, não foi em Alckmin, não foi em Haddad (que representa o presidiário Lula), não foi em tal e qual, mas sim, foi diretamente na Ignorância de um “POVO” , que não pensa, portanto entrega o poder nas mãos de qualquer um, e volta para seu sono profundo, de queixas e lamentos…. Lamento por aqueles que ainda estão acordados, que pensam, logo não se deixaram engolir por um sistema doente e falido, são esses Heróis Brasileiros, que questionam: porque o dolar sempre tem que estar a mais que os outros? Porque no Brasil se pode deixar venezuelanos, bolivianos, sei lá mais quem, entrar quando e onde querem, sendo que, nosso país mal tem empregos para seu povo? Porque o estupro está em alta? Porque o crime é naturalizado? porque, porque, nós sabemos… Um país, que não respeita seus idosos, não protege suas crianças e não educa seus jovens, não tem FUTURO….

  4. Paulo Cezar de Mello disse:

    Se o atentado vai unir a direita, o recado está bem dado: ou a esquerda se toca de uma vez por todas que a união é essencial, ou dia 7 de outubro o país estará elegendo a barbárie.

  5. Aída Paiva disse:

    Antonio Martins, como eh que voce esta financeiramente? Conseguiu sair do vermelho? Espero que voce esteja bem economicamente e esteja recebendo muito apoio pela sua midia bem feita, responsavel e alternativa a midia do sistema.

  6. Rita Lamar disse:

    Excelente analise, Antonio! Parabens. Concordo com tudo! Abs.

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