Pré-Sal, cobiça e poder global

Que interesses escondem-se atrás da “internacionalização” das jazidas brasileiras. Como ela está em andamento e quais os meios para revertê-la

.

Por Paulo Metri*

“O Pré-Sal pertence à humanidade” é a tradução do título do editorial do The New York Times que irá sair em um futuro não muito distante. A pregação diz que o Pré-Sal é da humanidade porque está em área do globo terrestre que não pertence a nenhum país. Logo após esta afirmação, o jornal lança o conceito de que quem chegar primeiro passa a ter a propriedade do petróleo e do gás produzidos. Estas são as teses principais do editorial, representando a opinião de fortes grupos de interesse do capitalismo internacional.

A maioria das áreas do Pré-Sal está realmente em mar internacional. Os Estados Unidos não ratificaram o tratado internacional que aceita a faixa de 12 até 200 milhas da costa como pertencente ao domínio econômico exclusivo do país, apesar de 150 nações, das 190 existentes, já o terem ratificado. Porém, este editorial esconderá o fato de que é muito custoso explorar o Pré-Sal sem utilizar bases logísticas no Brasil. Talvez porque esta seja uma batalha posterior.

Apesar de o editorial ser uma ficção, é bem possível que a tese descrita já esteja sendo germinada. O tema petróleo sofre manipulação da mídia do capital, devido a sua importância estratégica e valor econômico. Tenta-se convencer a pequena parcela da população mundial que está atenta aos acontecimentos sobre a atratividade das posições do capital, que, via de regra, não são benéficas à sociedade.

Usa-se de todos os métodos necessários para tal convencimento, desde o fato de salientar aspectos irrelevantes na análise, para confundir, até mentiras deslavadas. Tem-se liberdade total para criar versões substitutas dos fatos reais. Comunicadores excelentes, capazes de distorcer os fatos, criadores de verdades infundadas, além de analistas hábeis, despojados de compromissos para com a sociedade, estão sempre a serviço do capital petrolífero privado, ofuscando aspectos e valores de maior interesse para o povo brasileiro.

Como a acumulação máxima de riqueza é a única meta do capital, este vê no negócio-petróleo uma imensa oportunidade para tal acumulação; 58% da energia comercial consumida no mundo são oriundos de petróleo e gás natural, o que comprova a grande dependência da economia mundial ao petróleo. A escassez futura do petróleo está próxima, tanto que o barril se mantém acima de US$ 110, apesar do baixo crescimento da economia mundial. Além disso, não há fontes substitutivas ao petróleo, no curto prazo. Obviamente, no médio prazo, outras energias mais caras tornar-se-ão viáveis, elevando o patamar de preços das economias.

Desta forma, quem possui petróleo pode garantir às economias mundiais a fonte de energia ainda barata a que seu aparato produtor está adaptado. Pode garantir à sociedade mundial o aquecimento no inverno, o combustível para o transporte e as indústrias e, em alguns países, o combustível para a geração de eletricidade. Pode garantir também ao capitalismo internacional insumo vital para a acumulação de riqueza.

Para fechar este pano de fundo, todos os países desenvolvidos, nos quais o capital internacional sente-se protegido, não têm reservas de petróleo, com exceção de Canadá e Noruega. Só os Estados Unidos foram responsáveis, em 2010, por 21,1% do petróleo consumido mundialmente. Entretanto, se usassem o próprio petróleo para seu abastecimento, teriam garantidos somente 4,4 anos.

Em compensação, alguns países em desenvolvimento, de baixa industrialização, são detentores de reservas de petróleo que ultrapassam centenas de anos de abastecimento próprio, e têm estruturas democráticas frágeis, com populações fáceis de enganar, mais parecendo gazelas na pradaria com leões à espreita. Em nosso país, infelizmente, uma lei contrária aos interesses da sociedade, que traz benefícios para grupos econômicos, pode ser aprovada sem grandes contestações no Congresso, haja vista a aprovação da lei das concessões de petróleo (no 9.478 de 1997).

A Petrobras descobriu para o Brasil, na área do Pré-Sal, em torno de 90 bilhões de barris de petróleo. O petróleo já medido é bem menor, em torno de 14 bilhões, entretanto, a reserva total da área do Pré-Sal certamente não ficará neste número. A reserva estimada do Pré-Sal vem a ser um acréscimo de 6,5% nas reservas mundiais de 2010. Partindo de um lucro conservador por barril, em torno de US$ 50, em valores de 2010, esta reserva representa um lucro total de US$ 4,5 trilhões.

Além deste lucro, a economia mundial viciada em petróleo terá uma sobrevida, se hipoteticamente o Pré-Sal abastecesse sozinho o mundo, de três anos. O Iraque foi invadido por causa de uma reserva não muito diferente, de 115 bilhões de barris. Hoje, 28% das áreas do Pré-Sal já foram leiloadas, com o pior dos modelos, o da lei das concessões. Se existe algum interesse público nos congressistas atuais, esta lei deve ser substituída, rapidamente, pelo menos por uma análoga à lei dos contratos de partilha (no 12.351, de 2010).

Este é o quadro de enorme pressão reinante sobre o governo. Entenda-se por pressão os recados de chefes de governos estrangeiros, as chantagens de representantes de governos e órgãos multilaterais, a reativação da Quarta Frota Naval dos EUA, os artigos recriminatórios de jornais e revistas de países-sede do capital internacional, os discursos de políticos nacionais prepostos das empresas petrolíferas estrangeiras e os artigos e entrevistas na mídia nacional entreguista, dos ditos “especialistas” (regiamente remunerados pelo capital petroleiro).

Todos os brasileiros compromissados com nossa sociedade, preocupados com o setor do petróleo, deviam concentrar esforços na seguinte agenda de reivindicações ao governo:

  1. Nenhuma nova área deve ser concedida ou contratada através de leilão.
  2. Se existir a necessidade de serem aumentadas as reservas nacionais, áreas do Pré-Sal seriam entregues diretamente à Petrobras, sem leilão, para exploração e produção de petróleo, utilizando-se o artigo 12 da lei no 12.351.
  3. Os contratos de concessão de áreas do Pré-Sal, já assinados pela lei no 9.478, 28% do total da área, devem ser reformulados para não existir a possibilidade de ser explorado petróleo abaixo da camada de sal. Originalmente, as empresas em seus planos de exploração não mencionaram para a ANP a ida abaixo desta camada.
  4. A Petrobras seria proibida de formar consórcios para atuação em todas as áreas recebidas sem leilão.
  5. Abrir comissão de averiguação para identificar a razão de dez blocos da chamada “franja do Pré-Sal” terem sido recolocados na nona rodada, depois de retirados. Nenhuma outra área do Pré-Sal foi leiloada nesta rodada.

O Secretário da Defesa dos Estados Unidos, Leon Panetta, disse, em palestra na Escola Superior de Guerra, no Rio de Janeiro, que “os Estados Unidos estão retomando os acordos de segurança com seus parceiros e construindo novas alianças ao redor do mundo”. E, mais à frente, disse que “além disso, estamos convidando a Marinha do Brasil para participar de exercícios desde a costa do Rio até a da África”. Neste espaço, encontra-se o Pré-Sal.

*Paulo Metri é conselheiro da Federação Brasileira de Associações de Engenheiros e do Clube de Engenharia 

 

 

 

Leia Também:

10 comentários para "Pré-Sal, cobiça e poder global"

  1. Matto disse:

    Obrigado Paulo

  2. Paulo Metri disse:

    Sou o autor do artigo. Procuro responder à pergunta “Aonde você leu que as reservas do PreSal sao de 90bi de barris?” Na véspera da nona rodada de leilões, houve uma reunião do CNPE e a descoberta do Pré-Sal foi anunciada. A coletiva depois da reunião foi televisionada e estavam na Mesa: Dilma Roussef (então Ministra Chefe do Gabinete Civil), Sergio Gabriele, Guilherme Estrella e outros. A atual Presidente deixou transparecer esta estimativa de 90 bi de barris. Disse que, com o Pré-Sal, as reservas do Brasil iriam ser comparáveis às do Iraque, cujas reservas eram de 115 bi, à época. Já se tinha no Brasil 14 bi no Pós-Sal e, por diferença, chega-se a 90 bi no Pré-Sal.
    Paulo Metri

  3. Matto disse:

    Bom Dia e obrigado pelo artigo.
    Aonde você leu que as reservas do PreSal sao de 90bi de barris ?

  4. Sandra Porto disse:

    Vide a Amazônia, que já foi loteada..

  5. O Brasil não pratica a geo-política, nem dá a devida importânica para o fortalecimeto de nosso poderio militar. Isso vai nos custar caro.

  6. Um tanto ficcional. A Inglaterra explora petroleo a milhares de quilometros de sua costa mas tem de mantem as Malvinas do contrario fica economicamente inviavel. Para um pais se aventurar na area de pre-sal do atlantico vai ter de criar uma ilha?

  7. Paulo Timm disse:

    Daí a importância de acompanharmos mais de perto a questão da SEGURANÇA OCEÂNICA, a partir dos Acordos Internacionais já existentes. Ver , a propósito: http://www.paulotimm.com.br/site/pags/noticias3.php?id=139

  8. CELSO disse:

    A VISITA MR. PANETA (OU COISA QUE O VALHA) FICOU COBERTA DE SUSPEITAS, TANTO MAIS QUE A PALESTRA QUE FEZ FOI PARA UM CÍRCULO RESTRITO, A ESCOLA SUPERIOR DE GUERRA. OS EUA NÃO ACEITAM UM MUNDO MULTIPOLAR E QUEREM NO MOMENTO RESGATAR SEU DOMÍNIO MUNDIAL COMO DISSE EMINETE POLÍTICO DE LÁ: OS EUA UNIDOS NÃO TÊM AMIGOS, MAS INETRESSES. QUE O BRASIL, COM SEU IMENSO POTENCIAL, QUE SE CUIDE!

  9. Ruy Silva disse:

    Isso é muito sério, pessoal.É certamente nossa última oportunidade histórica de cobrirmos este pais, de norte a sul, de leste a oeste, com uma tremenda rede de hospitais e ambulatórios para prestar bons serviços de Saúde Pública à nossa população desvalida.E, além disso, implantar, nesta mesma área, uma ampla rede escolar de alto nível, nos moldes dos modernos CIEPs, por exemplo, com salários finalmente condignos para todo o corpo docente, onde eles possam colocar em prática os valiosos ensinamentos de um Paulo Freire, de um Anísio Teixeira e de um Darcy Ribeiro.E ainda sobrar abundantes recursos para a criação de uma rede nacional de delegacias, amplos e bem equipados presídios e viaturas para também finalmente infundir segurança a milhões de cidadãos que hoje só podem se apavorar com o que lhes mostra diariamente esta acumpliciada e igualmente criminosa televisão comercial brasileira.Tudo isso poderia se tornar verdade e real em questão de poucos anos se esta visão técnica do articulista fosse encampada pelos nossos atuais dirigentes.Mas aí vem um gringo gorila qualquer nos convidando para fazer exercícios navais com eles justamente na nossa área? Muito desinteressadamente, com toda certeza. Será possível que vamos cair nessa e aos poucos alienar mais este precioso tesouro? Como é trágico e terrível ser brasileiro hoje em dia..

  10. Qual é o fundamento que o autor tem para afirmar a existência de uma suposta notícia do New York Times ainda não veiculada?
    Não que eu não duvide da hipótese em si, mas por enquanto, trata-se apenas de hipótese (para todos os efeitos, a menos que nos provem o contrário, é apenas uma hipótese)
    De resto, o artigo todo está excelente.
    Mas é aquela estória: podemos falar de forma bonita sobre qualquer coisa.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *